Entrevista – Márcia Ramos, cuidando de si!

Entrevista – Márcia Ramos, cuidando de si!

Márcia não tem filhos e mora só há 26 anos, desde o falecimento de sua mãe, e está cuidando de si.


Tivemos, em São Paulo, a 6a. edição da Longevidade Expo+Fórum, que contou com mais de 250 palestras e atividades durante três dias. O cuidado de si esteve presente em várias falas.

Escolhi iniciar pelo Congresso do Envelhecimento Ativo. A palestra magna, com o Dr. Alexandre Kalache e Mona Rikumbi, estabeleceu o tom do evento. A conversa sobre longevidade e qualidade de vida, marcada por um olhar crítico para as desigualdades sociais, como o racismo estrutural e discriminações, demonstrou a relevância de abordar o envelhecimento de forma interseccional e inclusiva.

Ao ouvir cada palestrante fui acessando meus sentimentos e percebi que a plateia estava envolvida. Não poderia ser diferente, uma vez que os dramas sociais dizem sobre cada um de nós, afetando de formas diferentes, de perto ou longe, sobre o preconceito, o racismo, a pobreza, a desigualdade, o abandono e o sofrimento. Qual resposta daremos a tudo isso para termos um futuro diferente?

Algo sobre isso já sabemos: temos a necessidade de políticas públicas adequadas e mudanças culturais em prol de uma sociedade mais justa.

O Fórum não se limitou a apresentar dados e estatísticas. Ele foi um espaço de transformação pessoal. Foi nesse contexto que conheci Márcia Ramos. Nossa conversa, iniciada com um simples sorriso, me mostrou o quanto o evento havia impactado a vida de outras pessoas.

Ao longo deste reencontro, acompanhamos a jornada de Márcia e sua descoberta de um olhar sobre o envelhecimento. Agora, você poderá conhecer de perto como ela está transformando essa nova fase da vida em uma oportunidade de crescimento e realização, tornando-se a protagonista de sua história.

Silmara: Você participa do fórum da longevidade desde 2019. O que lhe motiva a participar desse evento?
Márcia: Sou interessada em diversos assuntos. Estou com 66 anos, mas desde os meus 60 anos fiquei focada no envelhecer. Me encanto em achar um lugar para aprender. Sou fã do Portal do Envelhecimento e por isso passei a divulgá-lo aos meus amigos. Contudo, nem todos querem pensar sobre esse tema. Percebo uma certa resistência em relação a se abrir para o aprendizado. Sou solteira, moro sozinha há 26 anos, desde o falecimento de minha mãe. Não tenho filhos, mas entendo quem os têm e questiono: Seu neto vai crescer e é gostoso ficar com ele. Mas e você? Se cuida?

Estou na Universidade aberta da Unifesp e gosto de estudar sobre o envelhecer, pois acompanhei o que minha mãe passou. Ela não soube lidar bem com as limitações. Então, isso provocou mudanças nas atitudes dela. Passou a ficar retraída e a não sair de casa. Eu não quero seguir por esse caminho por entender que a vida está aí para ser vivida e aproveitada.

E por falar em morar sozinha, assistimos a palestra da professora Yeda Aparecida de Oliveira Duarte com o tema “Viver sozinho: conquista ou problema?”. O que ressoou em você?
Pois é, um dos motivos de assistir a palestra foi justamente esse. Sempre tive uma preocupação muito grande em morar sozinha, pensando na possibilidade de passar mal ou ter algum percalço. A minha família mora em outra cidade. Tenho uma irmã que mora relativamente perto, mas ela não me visita muito. Chegou um momento em que parei de me preocupar, porque se acontecer alguma coisa comigo e eu não puder fazer nada, vou depender de ajuda. Terei que contar com o porteiro. Como foi citado na palestra: os porteiros dos prédios são os amigos dos idosos. E no meu caso, eles me conhecem. Até aviso quando vou viajar. Isso me dá um certo  alívio!

Na pandemia eu assisti uma live sobre testamento vital. Um tempo depois fiz o meu e avisei à minha família que quero ser cremada. Isso me deu certa tranquilidade. Por outro lado, sei que vai chegar uma hora que não vou conseguir cuidar de mim. Não tenho problemas em depender do outro, mas achei um projeto que será lançado em breve: um residencial para aqueles que moram sozinhos. Nele haverá apoio do condomínio, chegando até a oferecer atendimento médico. Sendo assim, vi ali uma alternativa que me deixou contente, uma ideia bastante interessante. Estou esperando ficar pronto.

De todos os assuntos discutidos no congresso, tem algum que mais lhe chamou a atenção? Por quê?
Me inscrevi principalmente por saber da palestra sobre morar sozinho. Tive outras descobertas durante o evento, como a palestra da Mona Rikumbi e do Dr. Alexandre Kalache. Foi sensacional! Foi um prazer ao final, conversei com eles e declarei quanto fiquei mobilizada com as falas. Acho que isso tudo acrescenta às nossas vidas. Por exemplo, tem um casal aqui na baixada santista, de 70 anos, que são surfistas. Vê-los é fantástico. Eu não sou surfista, mas eles abrem a inspiração pra gente buscar fazer algo dentro daquilo que gostamos.

Também ouvir sobre o Alzheimer foi muito bom, outro tema que me interessa, por ter tido uma experiência em casa. Certo dia minha irmã mais velha falou comigo ao telefone e, de repente, depois de duas semanas, já não sabia quem eu era. Foi tudo tão rápido que abalou a todos da família. Busco aprender sobre o assunto e prevenir o quanto possível. O livro O Alemão Veio nos Visitar: acolhendo o visitante indesejado é de uma série maravilhosa que trata sobre esse assunto, tornou-se o meu preferido e acabei de comprar no Portal do Envelhecimento, este, que é o exemplar que ainda me faltava.

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Aproveitando a temática do congresso, como você se vê envelhecendo em sua cidade?
Envelhecer em Santos não é difícil,  a cidade favorece ir a pé a muitos lugares, além do prazer de estar na praia. Aqui tem muitas atividades para os idosos, tudo gratuito. Há 20 anos tive depressão e tenho poliartrose. O médico me recomendou atividade física. Graças a isso, hoje não estou travada. Participo desses projetos há quase dez anos, vou ao médico regularmente, não tenho problemas em me locomover e viajo muito à São Paulo. Ontem mesmo fui a uma roda de conversa sobre a utilização medicinal do canabidiol, que utilizo para tratar minhas dores.

E como a Márcia circula nos papéis sociais?
Fui funcionária pública federal e me aposentei há 12 anos. Fui contadora de história no hospital e agora só cuido de mim. Sempre gostei de dançar e hoje pratico dança flamenca, hidroginástica e Yoga. Fiz balé desde os 62 anos, pausei por causa de dores, mas agora retomarei. Já fiz o caminho de Santiago. Vou a shows e outros eventos. Temos uma agência que faz toda a logística. Como o meu convênio é do servidor público, tenho a oportunidade de participar do programa de promoção à saúde. De início, nem sabia mexer no aplicativo, aprendi e agora faço tudo que posso, procurando não faltar.

Exercer todos esses papéis lhe causa…
Prazer! Me sinto bem em me exercitar. Não consigo ficar parada. Fico antenada com a atualidade.

Como esses fóruns e convenções afetam o seu olhar sobre sua velhice?
Trazem muitas surpresas, como saber mais sobre moradia, nutrição e a importância sobre o aprender, ponto chave na vida. Também me trazem novos amigos, como uma pessoa que recentemente virou uma amiga, a Fátima. Ela tem a mãe com Alzheimer, é voluntária num centro onde consegue, ao mesmo tempo, interagir com a mãe e demais idosos. Vejo ali uma relação em que ela cuida e também se cuida.

Quando estou nos ônibus gosto de ouvir histórias de outros idosos, que parecem se sentir sozinhos. Moro sozinha, mas não sou solitária. Nessa fase da vida, não faço o que não gosto. Observo outros idosos com o celular o tempo inteiro. Temos que analisar se o que vem pelas mensagens é verdade. Precisamos estar atentos a tudo e ver que a vida não está no celular, está aqui fora!

Como foi para você estar aqui nessa conversa?
Me senti bem e contente por você ter me encontrado em meio a tantas pessoas. Gosto de transmitir a minha experiência. A sociedade vive muitos preconceitos. Lembro que quando falei para uma amiga que eu estava fazendo balé, ela deu risada e disse:
– É da terceira idade?
Respondi: – É balé! Ele considera as condições de cada um e não deixa de ser balé!

Busco incentivar as pessoas a fazer educação física. Uma hora diária faz toda diferença para a saúde. É um ganho muito grande!

Serviço
Contato: [email protected]

Fotos: arquivo pessoal de Márcia Ramos


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Mulher branca, de óculos
Silmara Simmelink

Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: [email protected]

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Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: [email protected]

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