Simone em entrevista: A melodia do tempo em uma mulher

Simone em entrevista: A melodia do tempo em uma mulher

As canções de Simone – conhecida por interpretar canções que celebram a mulher –  ressoam com a jornada da mulher em seu envelhecer.


Nascida em Salvador, Simone estreou como cantora profissional em 1973. Desde então, construiu uma carreira sólida com 31 álbuns de estúdio e sete ao vivo. Sua voz embalou quase 50 trilhas de novelas e incontáveis sucessos nas paradas brasileiras, conquistando também reconhecimento internacional, celebrado com o Prêmio à Excelência Musical no Latin Grammy 2023, em seus mais de 52 anos de trajetória…

Carl Gustav Jung afirmava que o artista é um educador do espírito de sua época, e a cantora Simone personifica essa máxima. Conhecida por interpretar canções que celebram a mulher, o renascimento e a resistência, Simone convida à renovação e a novos começos em sua obra.

Assim como a premissa de Jung de que a vida precisa ser conquistada diariamente, as canções de Simone ressoam com a jornada da mulher em nossa sociedade. Historicamente confinada à submissão e ao universo doméstico, a mulher tem trilhado um árduo caminho de redefinição de seu papel.

Contudo, persiste no imaginário social a idealização de uma mulher forte, guerreira, cuidadora e onipresente, capaz de gerir todos os desafios. Mas como essa idealização se aplica à velhice? E ao considerarmos as intersecções de gênero, raça e classe social? É fundamental reconstruir o script desse papel, reconhecendo a necessidade de cuidado em todas as fases da vida.


Silmara: ‘’Começar de novo e contar comigo / Vai valer a pena ter amanhecido / Ter me rebelado, ter me debatido / Ter me machucado, ter sobrevivido”. Imagine que estás mais velha. Qual aspecto da vida se dedicaria a começar de novo?
Simone: Aproveitaria a sabedoria dos anos e começaria de novo o cuidado comigo mesma, com o corpo, com a alma e com o silêncio. Mas isso é o que todos gostaríamos, penso. Sinto-me bem com meus erros e acertos.

Demograficamente, a expectativa de vida é maior para as mulheres. No entanto, em uma sociedade enraizada no patriarcado e no machismo, a mulher já carrega opressão. Diante desse cenário, como é, para você, de fato, o envelhecer sendo uma mulher?
É um ato de resistência. Envelhecer e/ou crescer sendo mulher é enfrentar todo dia um desafio e escolher seguir. Tenho uma vida diferente de minha mãe, da minha avó, e vejo que caminhamos muito, mas há muito o que fazer. A idade me trouxe mais clareza sobre minhas prioridades e estou muito bem com minhas decisões. “Eu sou mulher, eu sou feliz” é uma música que gravei e é isso: eu sigo feliz, eu tenho música, sempre cantei o amor, a paz, a justiça, e, onde vejo espaço, eu luto.

Vinda de uma geração onde as normas de gênero muitas vezes limitavam a mulher desde o lar, onde os homens podiam tudo, e as mulheres não: como você navegou nessa realidade? Nesse percurso, o que foi fundamental para sua autonomia e liberdade?
Quando criança ganhei um campeonato de velocípedes, e adivinha o prêmio? Um fogão e panelinhas. Eu queria uma bola! Gosto de falar isso porque ilustra bem o que se espera da mulher. Eu sempre briguei e lutei por meus espaços e assim continuo. A gente não pode ter medo. O esporte e a arte me deram oportunidades de exercer minha liberdade. Jogar, cantar e ser artista foi o meu grito, minha escolha, minha forma de romper com o que era esperado para algumas mulheres.

Que venha de dentro de mim ou de onde vier
Com toda malícia e segredos que eu não souber
Que tenha o cio das corças
E lute com todas as forças
Conquiste o direito de ser
Uma nova mulher
(Canção: Uma nova mulher)

Você diz que a canção Jura Secreta sempre te pega de surpresa, nunca sabes como a receberá ao cantá-la. Com o envelhecer, como você equilibra a sabedoria adquirida com o que ainda permanece no território inexplorado? Quais os impactos do “não vivido” em suas aspirações futuras?
A sabedoria dá chão, mas é o mistério que nos move. Continuar curioso e aberto é um jeito de manter a cabeça sã.

Sua voz é uma marca inconfundível. Junto com o processo de envelhecimento vêm as transformações, tanto das vozes do corpo quanto da alma. Como você percebe essa relação entre o envelhecimento e a sua voz interior? Ela se tornou mais clara, mais suave, ou mais potente com o passar do tempo?
Minha voz hoje traz a experiência de mais de 50 anos fazendo isso. Tem traços da minha história, dos meus acertos, dos meus erros e de tudo que aprendi. Eu aceito bem todo o meu processo, são 75 anos de vida.

Não perca nenhuma notícia!

Receba cada matéria diretamente no seu e-mail assinando a newsletter diária!

mulher de cabelos grisalhos olha para a camera, vestindo branco

Foto: Felipe Rufino

A sociedade muitas vezes impõe pressão sobre o envelhecimento, especialmente sobre mulheres e artistas. Para você, como é o envelhecer sobre os holofotes?
É um desafio. É desafiar expectativas todos os dias. E não podemos nos render às pressões e ilusões de imagem. Tudo tem seu tempo e tudo se transforma. Como mudar isso? Eu me cuido diariamente, faço tudo o que posso, tenho muita disciplina com o corpo e mente.

Em diversos momentos você está acompanhada pela Lola e cita que os cachorros vieram para ensinar os humanos. O que de mais forte aprendeu nessa relação com ela?
Os animais nos ensinam o amor incondicional, com gestos e atitudes. É uma mistura de cuidado, companhia, devoção e carinho, tudo isso junto da pureza que esses bichinhos lindos carregam consigo. A resiliência e doçura desta bichinha eu nunca vi na vida. Ela topa qualquer coisa, quer estar junto e não dá o mínimo de trabalho. Ela anda de avião, helicóptero, adora caiaque e ama a bolsa onde viaja. Eu amo a Lola, mas também todos os bichinhos.

Serviço
Instagram: @simoneoficial

Foto destaque: LeoAversa

Atualizado às 9h51


Banner anunciando congresso redip
Mulher branca, de óculos
Silmara Simmelink

Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: [email protected]

Compartilhe:

Avatar do Autor

Silmara Simmelink

Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: [email protected]

Silmara Simmelink escreveu 29 posts

Veja todos os posts de Silmara Simmelink
Comentários

Os comentários dos leitores não refletem a opinião do Portal do Envelhecimento e Longeviver.

LinkedIn
Share
WhatsApp
Follow by Email
RSS