A IA está redefinindo o trabalho dos profissionais da saúde e a relação deles com pacientes, aponta estudo da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB).
A adoção da inteligência artificial na área da saúde traz incertezas para profissionais e pacientes. Pesquisadores tentaram entender quais são as questões éticas mais recorrentes em pesquisas que abordem a intersecção IA, saúde e bioética. Entre elas, destacam-se o distanciamento que a ferramenta pode trazer para a relação profissional-paciente, a redução do pensamento crítico do profissional ao usá-la passivamente e as dúvidas sobre quem será responsabilizado se a tecnologia causar efeitos negativos ao paciente.
O levantamento, assinado por Sérgio Yarid, Ranna Gabriele e outros autores da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) foi publicado recentemente na revista Bioética.
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Eles fizeram uma revisão de literatura com base nos últimos cinco anos de edições dos bancos de dados da Scientific Electronic Library Online (SciELO), da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS) e do National Center for Biotechnology Information da National Library of Medicine (PubMed). Os autores selecionaram 188 artigos, dos quais 13 entraram para a revisão final.
O objetivo era traçar um panorama dos estudos na intersecção inteligência artificial, bioética e saúde, visto que é uma área de pesquisa que deve crescer nos próximos anos na medida em que essa tecnologia se torna mais usada. Sérgio Yarid, um dos autores da pesquisa, diz que a questão central é quem assina e atesta o uso da ferramenta: “Quem será o responsável por um diagnóstico, exame ou situação em que o paciente, com problema de saúde, enfrenta? Quem se responsabiliza pelo diagnóstico ou pela forma como a IA interpreta o exame?”
Essa questão se conecta a uma possível mudança para o profissional da saúde, que, em muitas especialidades, pode se tornar validador do que a inteligência artificial entrega, de exames a diagnósticos. Trata-se de uma alteração da relação profissional-paciente, sendo que este precisa ser informado pelo primeiro que foi usada IA em algum momento do processo. “Isso é uma questão ética e moral”, diz Yarid.

Para ele, o próximo passo é entender melhor quem são os profissionais que usam a IA, quais são usadas, como e para que fim. “O que me preocupa ao extremo é que os profissionais de saúde não têm conhecimento da responsabilidade moral e ética do uso da IA”.
Além disso, o estudo ressalta a preocupação com o chamado “paternalismo de máquina” — quando decisões automatizadas sobrepõem-se à autonomia e ao julgamento de médicos e pacientes. Embora a IA possa servir de apoio, os autores afirmam que ela não substitui a relação humana, a empatia e a análise crítica insubstituíveis no cuidado em saúde.
A ausência de legislação específica e diretrizes claras para o uso de IA em saúde foi apontada como um dos principais gargalos. Em países como os Estados Unidos, há normativas para proteger dados de saúde, mas, no Brasil e em grande parte do mundo, o debate ainda é incipiente. Segundo a revisão, cabe ao Estado regulamentar normas e garantir a integridade e privacidade dos pacientes.
Outro destaque do estudo é a necessidade de incorporar o debate sobre IA e bioética já na formação dos profissionais da saúde, promovendo capacitação para lidar com os novos desafios trazidos pela tecnologia. Ferramentas como o ChatGPT, por exemplo, podem ser úteis para a educação ética, esclarecendo conceitos e promovendo o debate.
Embora a IA represente um avanço inegável, seu uso seguro e ético depende de uma abordagem multidisciplinar, transparência, supervisão contínua e participação ativa de profissionais, pacientes e gestores, dizem os autores. “O uso da inteligência artificial como ferramenta tecnológica que contribui para diagnósticos e tratamentos tem benefícios indiscutíveis, mas ainda faltam informações no que tange à proteção dos dados coletados e aos aspectos bioéticos”, sintetiza o artigo.
Fonte: Agência Bori
Foto de Ivan Samkov/Pexels.
