O luto profissional não é tão discutido no campo da saúde, mas é tão relevante…
Aqueles que passam por nós não vão sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós. (Antoine de Saint-Exupéry)
Chego, como profissional, no mesmo horário, como sempre fiz… Olho ao redor e a cadeira está vazia… existe um ar de tristeza, mas sobretudo de saudade. Aquele (a) paciente querido (a) já não está mais entre nós… cumpriu sua missão e agora descansa… vivendo somente em nossa memória… em nosso coração… lugar esse onde vamos revisitar tudo o que ficou dessa história.
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Relutamos em iniciar a mesma rotina, pois ela traz lembranças dos bons momentos compartilhados, das risadas, dos choros, do toque na pele fina e macia, na troca de olhares repletos de confiança, das histórias contadas e recontadas, da experiência única que é cuidar do amor da vida de alguém…
– Qual era sua profissão? Eu era agricultor… plantava batata, batatinha, repolho, cenoura e outras coisas mais.
Cria-se uma relação de afeto…de cuidado… de muito carinho e proximidade, afinal, o trabalho com idosos é único… não existe nada igual ou parecido.
– Você me conhece? Claro… nós somos amigos há muito tempo.
Então, somos surpreendidos com essa saída de cena sem despedidas… e muitas ainda estarão por vir… encerrar um prontuário… ah como dói! Nunca é somente um número ou um nome… é muito além do que se pode imaginar.
– Que dia é hoje? Hoje é o dia que você vem.
Outrora, mencionei que trabalhar com idosos vem me curando de várias coisas, mas quando eles se vão, me permito entristecer, chorar, rever fotografias de momentos felizes, e também conversar com outros colegas sobre este momento, sem culpas ou sentimentos de falha, vou construindo, reconstruindo e espalhando lembranças.
– Fico pensando, será que ainda está plantando suas batatinhas; será que ainda costuram ou estão fazendo bolinhos de chuva?
O luto profissional não é tão discutido, quanto outras temáticas no campo da saúde, mas é tão relevante quanto, pois impacta diretamente no emocional dos profissionais, que, tomados de sentimentos diversos, podem acabar desenvolvendo quadros de estresse e ansiedade, além de potencializar sintomas já existentes, como o esgotamento emocional e alterações comportamentais, dificultando a execução do próprio trabalho, e em muitas vezes esse sentimento é levado também para os entes queridos.
Encarar o processo de luto, é estar frente a própria finitude, e é fundamental que cada profissional consiga reconhecer suas próprias limitações.
É importante aprender a lidar com os sentimentos advindos dessas perdas, através de estratégias adaptativas e de autocuidado como: conversar com colegas de trabalho sobre os sentimentos que estão aflorando; meditar; buscar compreender o próprio papel neste processo; buscar ajuda psicológica para compreender esse momento.
Essas estratégias ajudam a lidar de forma mais assertiva com a dor, a tristeza, a desenvolver empatia pelas pessoas, permitindo que o profissional consiga vivenciar esse processo… não esquecendo que antes de ser profissional, existe um ser humano.
A morte não é fracasso… assim como a vida, é processo… é aprendizado… é encontro e reencontro… é cura…
A morte muda nossa visão sobre as coisas, nossos sentimentos, nossos medos e a forma como vamos lidar com outras pessoas logo adiante. Não é sobre aceitar… é sobre compreender que temos um tempo limitado, que vivemos o necessário… que o mais importante é poder fazer a diferença na vida de alguém.
Todo meu amor e respeito a todos aqueles que passaram pela minha vida, levando um pouco de mim, deixando muito de si, me ajudando a ser alguém melhor… ainda estou no processo de aprendizagem… Gratidão!
Foto: Pixabay