Ao interpretar o Papai Noel, Jaime Roman se coloca no papel de um catalisador das fantasias, proporcionando alegria e encantamento.
A chegada de dezembro (e do Papai Noel) nos convida a fazer um balanço do ano que passou e a traçar novos planos para o futuro. Enquanto nos dedicamos a metas de curto prazo, é fundamental lembrar que a vida é um projeto de longo prazo. Assim como planejamos nossos próximos passos a cada ano, é fundamental pensarmos a longo prazo e prepararmos o terreno para uma velhice plena e satisfatória.
Afinal, essa é a fase mais longa da vida e merece toda a nossa atenção. Além do aumento da expectativa de vida, o envelhecimento também traz consigo novos desafios, como a manutenção da saúde física e mental, a adaptação a novas realidades e a busca por significado e propósito. Neste contexto, a Organização das Nações Unidas declarou a década de 2021 a 2030 como a “Década do Envelhecimento Saudável”, um chamado para que sociedade e indivíduos se engajem na construção de um futuro mais justo e inclusivo para todas as idades.
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Freud nos lembrava que a fantasia é um refúgio necessário para o ser humano, um mecanismo de defesa contra a angústia da realidade. O Papai Noel, nesse sentido, representa mais do que um simples personagem natalino: ele simboliza a esperança, a bondade e a magia que todos nós, em algum momento da vida, ansiamos encontrar.

Ao interpretar o Papai Noel, Jaime Roman, nosso entrevistado, se coloca no papel de um catalisador dessas fantasias, proporcionando momentos de alegria e encantamento a todas as idades. Seu relato gentil traz a interpretação desse personagem aliada ao seu processo de envelhecimento.
Silmara: Faz 11 anos que você atua como Papai Noel. Como tudo começou? O que lhe despertou para assumir esse personagem?
Jaime: Foram as circunstâncias da vida, por conta de uma situação financeira. Essa ideia de Noel surgiu a partir de comentários sobre minha aparência, desde minha juventude. Trabalhei como educador por muitos anos, então tive contato com a infância e a experiência em brincar com esse personagem. A partir daí, fui atrás. Num primeiro momento sentia timidez, sem saber como lidar com esse personagem. Foi com o tempo que percebi que gosto do que faço, e essa porta se abriu.
Quando começou a atuar como Noel ainda não se enquadrava na fase da velhice. No que, ou em quem, você se espelhou para viver o bom velhinho?
Esse personagem está na história, na nossa cultura, nos filmes e nas famílias. Não foi difícil entender suas características e como ele é construído. Foi tranquilo pegar a ideia do bom velhinho.
Todo personagem exige uma caracterização externa (corpo, voz e postura). Como você foi construindo e sentindo esse novo corpo?
Eu já tinha essas características físicas do que é esperado para um Papai Noel que é o socialmente desenhado, como a pele rosada e os olhos claros. Completei o figurino deixando a barba e cabelo crescerem. Por fim, colocando a roupa, tudo fica mais fácil. A experiência como Noel foi na prática, em especial com as crianças, pois fui desenvolvendo formas de atender com carinho.
Essa construção também passa pela caracterização interna de emoções e sentimentos. Quais valores atribui a esse personagem?
A empatia, a tranquilidade e o bom senso. Sempre falo que estou de portas abertas quando sento na cadeira do Noel. Quando pergunto qual presente a pessoa quer, ali já iniciamos uma conversa. As respostas são as mais variadas. Algumas pessoas acessam o passado buscando lembranças antigas, já outras trazem situações que remetem a política, ou até pedidos absurdos. Entram pessoas que trazem sorrisos e outras que trazem reclamações. Em contrapartida, a minha resposta é a de ser empático com ambas as visões de mundo.
O Papai Noel é um dos encantos de Natal que atrai os olhares de todas as gerações, seja pela esperança de um presente ou até por uma foto. Como é essa interação?
Essa é uma interação que vejo como especial. Todas as gerações param, acenam ou trocam um gesto de carinho com o Papai Noel, desde um bebê até uma senhora de 95 anos. É fascinante! Abre possibilidades de expressão, como fazer a voz suave e meiga para uma criança e até entender que essa senhora já viveu mais do que eu, tem mais experiências. É aí que busco identificar os sentimentos dos adultos, chamando-os para brincar. Às vezes, percebo sentimentos de gratidão e de confraternização pela vida que espelham o verdadeiro espírito natalino, no qual as pessoas envolvem àqueles de sua convivência, desde os colegas do escritório aos membros da família. Surge um sentimento maior do que o de estar com o Noel, uma conexão com o universo ou com um Deus, é bonito de se ver! Todos expressam esse espírito, alguns mais empáticos, quando os pedidos não são só para si, mas para o outro e, muitas vezes, para o mundo, como a paz mundial.
Quando você está dentro do personagem, sendo o Papai Noel, o que percebe que ele te possibilita fazer e que como Jaime não faria?
É, ninguém falaria para o Jaime que precisa de um marido, namorado ou que os pais estão doentes. O contato com o Noel é de uma intimidade que não está presente na relação com o Jaime. Me coloco na figura com afeto, dou conselhos que façam com que a pessoa se sinta feliz, viva e plena. Com o passar dos anos está cada vez mais fácil incorporar o Noel, pois tenho como retorno a emoção das pessoas. Eu também fico emocionado! É muito bom, um carinho recíproco.
Ao lhe convidar para esta entrevista, quando falei de uma conversa sobre o processo do envelhecer, você me disse que não estava “tão velhinho assim”. Hoje você está com 63 anos, como se vê nessa fase?
Na verdade, em alguns momentos me esqueço da idade, não me sentindo idoso. Na juventude eu via que os idosos daquela época tinham certas limitações de locomoção. Me vendo agora, não tenho aquelas limitações e me sinto ativo. O corpo não responde igual há 20 anos atrás, é claro! Quando olho no espelho vejo que envelheci e também me vejo com postura, com maturidade e pensamentos bem diferentes de quando estava na fase da juventude. Hoje enxergo o mundo muito diferente, tendo outras ideias da realidade à minha volta.
No imaginário social, o Papai Noel mora no Polo Norte, em uma cidade encantada, tem meio de transporte confortável, tem ajudantes, visto como bonzinho, respeitado e com toda magia do Natal. E na nossa realidade, como o Jaime se planeja para um envelhecimento saudável?
O planejamento com a idade é recente, acho que eu e muitas pessoas passaram pela juventude sem se preocupar como iríamos chegar na velhice de uma forma saudável. Hoje essa preocupação vem com mais força, pensando no exercício físico e mental para manter a qualidade de vida. Caminho todos os dias durante 30 minutos, moro em uma chácara em meio à natureza, cuido da grama e tenho contato com os bichinhos que aparecem por lá. Para a mente, sou um leitor ávido. Moro há 30 anos em Atibaia-SP. A cidade cresceu, mas ainda é interior. Minha residência fica afastada do centro urbano, isso me dá muita tranquilidade.
E por último, Jaime, como você observa o papel do velho que não possui esse personagem, mas vive a velhice na realidade? O que falta para nos relacionar de forma saudável com o futuro certo de todos, que é a velhice?
A opção de não envelhecer é morrer, o que a maioria de nós não quer. Envelhecer é um privilégio. Acho que agora essa discussão vem se ampliando, sendo que o próprio velho está questionando a posição. Estamos plenos e integrados na sociedade. Voltando a estudar, tendo seus negócios e atuando socialmente. Cabe à sociedade em si enxergar àqueles que não têm condições de atuar ativamente e entender que eles também têm anseios e não são descartáveis. A experiência tem seu valor, cabe a gente integrar e afastar a ideia do descarte.
Agora, vamos chamar o Papai Noel para um recado aos leitores.
Deixo aqui o recado de amor, carinho e empatia. Desejo um natal de paz! Que vivam felizes e olhem para si e para o outro com esse amor. O espírito do natal é mais importante que o presente!
Fotos: arquivo pessoal