Esse papo de aranha, então, é para convidar para a construção de nossa grande teia. Precisamos reforçar as teias existentes, juntar nossos teares…
Paulo Cezar S. Ventura (*)
Uma aranha tece uma teia no jardim, ou à beira de uma trilha que conduz a qualquer lugar. Prende o fio em um galho de árvore e se lança no espaço. Sem medo, sem volta. A teia começa a aparecer quando ela encontra outro galho, a metros de distância. Logo depois a teia se forma. Com aquele brilho à luz da manhã, ainda com um pouco de neblina no ar. Cena fotografável.
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E ela coloca folhas em sua teia e bota ovos. Folhas para avisar aos pássaros distraídos que o voo por ali está proibido. Ovos para aumentar a sua prole.
Logo outra aranha da mesma família aparece, aproveita a teia já funcional, e a estende até outros galhos, de outras árvores. Antes era uma aranha, agora são duas. Uma vizinhança se formando. Já é possível uma conversa de aranha. Mas conversa de aranha não tece teias. Trabalhar na tecelagem é preciso. E o tear é interno, está dentro delas, exigindo uma energia imensurável para tecer.
Então vem outra aranha, que também tem como ponto de partida a teia já iniciada e aumenta a comunidade a partir das teias existentes. Também coloca folhas, espantalhos de pássaros, e bota seus ovos. Agora são três vizinhas, o papo de aranha aumenta, o trabalho continua, no entanto. Novas aranhas surgem, os filhotes crescem, a comunidade se forma.
E por que eu, pessoa humana idosa, estou com esse papo de aranha? Na verdade, toda essa conversa metafórica é para nos lembrar que nós, as pessoas idosas, podemos viver longamente. O que nos falta, então, para que essa tal longevidade, com grandes probabilidades de nos pegar de jeito, seja a mais agradável possível, menos dolorosa e mais proveitosa?
Precisamos tecer nossa teia. Reforçar as teias existentes, juntar nossos teares, espantar os “pássaros” distraídos, ou mesmo maldosos. A maldade humana pode até ser grande, mas a bondade é maior (pode ser uma crença, mas precisamos dela para a sobrevivência de nossa espécie).
Assim como a comunidade de aranhas tem seus defensores, nós também temos. O comitê de defesa das teias de aranha não é fruto apenas da tal bondade humana, é fruto de luta, e a luta é política, claro. O comitê se forma porque já somos muitos e nosso número só cresce. Por isso, caros aracnídeos humanos e idosos, ninguém se lembra dos calados, precisamos gritar, desde nossas teias.
Esse papo de aranha, então, é para convidar para a construção de nossa grande teia. E o que é nossa teia? É nossa amizade, união, alegria, vontade de viver, nossos exemplos, nossas histórias, nossas vozes.
Sabem como se mata aranhas? Simples. Nenhuma pancada é necessária. Basta lhes destruir a teia. As aranhas consomem muita energia a construindo e dificilmente a refazem. Morrem antes disso. Precisamos, então, proteger nossa teia. Com muito papo de aranha. Regado a música, dança, caminhadas, namoros (sim, namoros) e muita vontade de viver.
(*) Paulo Cezar S. Ventura – escritor e professor, Licenciado e Mestre em Física, e Doutor em Ciências da Comunicação e Informação pela Université de Bourgogne, França. Membro do movimento Vidas Idosas Importam. E-mail: [email protected]. Instagram: @paulocezarsventura
Foto destaque de Yuting Gao/pexels.