Perda auditiva e sua relação com a demência

Perda auditiva e sua relação com a demência

A perda auditiva é uma barreira para o envelhecer ativo, responsável pelos agravos à saúde e por aumentar o risco de desencadeamento de demência em 60%.

Em colaboração com Tawane Carneiro e Millene Abrantes (*)


A comunicação é necessidade de todo ser humano, pois possibilita as diversas relações sociais e a vivência plena de experiências. Através da comunicação, compartilham-se ideias, afetos, sentimentos, pensamentos, desejos, insatisfações, dentre outros, expressos mediante a linguagem, verbal e não verbal. A linguagem falada é importante meio de comunicação, sendo que, para que esta última se efetive, é necessária a preservação da audição.

Com o envelhecer, e decorrente do processo fisiológico denominado senescência, há um aumento progressivo da perda auditiva, denominada de presbiacusia, que é diretamente proporcional ao avançar da idade. Esta perda interfere negativamente nas relações sociais, o que propicia isolamento, tristeza, ansiedade, depressão, incompreensão, déficit cognitivo, entre outros, afetando sobremaneira a qualidade de vida da pessoa idosa. A perda auditiva é considerada, por afetar o desempenho do papel social da pessoa idosa, um dos distúrbios da comunicação mais incapacitantes.

Esta perda ocorre por comprometimento das estruturas sensoriais da orelha interna, bem como das estruturas neurais, o que leva à inteligibilidade da palavra, em maior ou menor grau. É comum na população idosa a dificuldade de compreensão da fala, principalmente em situações de comunicação desfavoráveis como em ambientes ruidosos.

A prevalência de deficiência auditiva em idosos varia de 30 a 90%, sendo que a presbiacusia é a terceira patologia mais prevalente nesta faixa etária, após artrite e hipertensão arterial. Suas causas são multifatoriais, incluindo além da senescência, (a) desordens genéticas, (b) presença de hipertensão, diabetes ou outras doenças metabólicas, (c) excesso de exposição ao ruído; (d) dieta de má qualidade ao longo dos anos e (e) uso de alguns medicamentos. Todos estes fatores potencializam as perdas fisiológicas e podem estar presentes em conjunto ou separadamente.

O diagnóstico da perda auditiva é feito por meio de um exame chamado audiometria tonal liminar, que permite estabelecer o tipo e o grau da perda auditiva. É possível complementar o diagnóstico com a audiometria de fala, que classifica o prejuízo para a comunicação decorrente do déficit auditivo. Estes são considerados exames “padrão ouro”, porém, nem sempre estão acessíveis à pessoa idosa.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) identifica a capacidade de contribuir para a sociedade e o desenvolvimento de relações como uma das habilidades funcionais que contribuem com a promoção de um envelhecimento saudável, sendo a perda auditiva considerada uma barreira para o envelhecer ativo, não só responsável pelos agravos à saúde já mencionados, como, também, por aumentar o risco de desencadeamento de demência em 60%. Isto significa que a perda auditiva é um fator importante a ser trabalhado como prevenção à demência.

Assim, apesar de uma em cada quatro pessoas acreditarem que nada pode ser feito para prevenir a demência, há fatores de risco potencialmente modificáveis que podem prevenir ou retardar os casos em 40% dos indivíduos.

O principal fator de risco modificável para a demência é a perda auditiva durante a meia idade, que é responsável por cerca de 8% de todos os casos. Isso ocorre porque a diminuição da audição reduz a atividade em regiões do cérebro que são responsáveis pelo pensamento, aumentando a neurodegeneração. Sabe-se que a capacidade de ouvir possui um efeito aprimorador no cérebro, tanto por ser essencial para exercer a comunicação quanto por proporcionar contato com diversas emoções através de sons ambientais, fala e música.

Um estudo recente concluiu que quem vive com perda auditiva não tratada experimenta uma aceleração de 30 a 40% de declínio cognitivo comparado àqueles com audição normal. Assim, é essencial a intervenção com o uso de aparelhos auditivos, que podem proteger a pessoa idosa que já possui uma deficiência cognitiva leve de um declínio ainda maior, além de prevenir ou retardar o aparecimento da demência naqueles que ainda não a possuem.

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O uso de aparelhos auditivos deve ser incentivado não só por diminuir o risco de desenvolver demência, mas por reduzir o isolamento social. Ao utilizá-lo, há uma redução na carga cognitiva juntamente com um aumento na estimulação cerebral, que permite novamente a comunicação verbal e a socialização. Há também a melhora da qualidade de vida e a diminuição da depressão, o que contribui mais ainda para a diminuição da incidência da demência.

Deve-se, por fim, ressaltar que a perda auditiva é associada também à presença de violência contra a pessoa idosa, daí a importância de seu correto diagnóstico e manejo com aparelhos auditivos.

Referências

COSTA-GUARISCO, L.P. et al. Percepção da perda auditiva: utilização da escala subjetiva de faces para triagem auditiva em idosos. Ciência & Saúde Coletiva [online]. 2017, v. 22, n. 11, p. 3579-3588. Disponível em <https://www.scielosp.org/pdf/csc/2017.v22n11/3579-3588/pt>

GARCIA, A.C.O.; SANTOS, T.M.M.; MANSO, M.E.G. Capacidade funcional e perda sensorial em um grupo de idosos usuários de um plano de saúde. Research, Society and Development, 2021, v. 10, n. 2, e16410212287.

SOUZA, M.G.C.; RUSSO, I.C.P. Audição e percepção da perda auditiva em idosos. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009, v.14, n. 2, p.:241-6

(*) Tawane Carneiro e Millene Abrantes são graduandas do Centro Universitário São Camilo, e estagiárias do Programa Bolsa Talento.

Foto destaque de Kindel Media/Pexels


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Maria Elisa Gonzalez Manso

Médica e bacharel em Direito, pós-graduada em Gestão de Negócios e Serviços de Saúde e em Docência em Saúde, Mestre em Gerontologia Social e Doutora em Ciências Sociais pela PUC SP. Orientadora docente da LEPE- Liga de Estudos do Processo de Envelhecimento e professora titular do Centro Universitários São Camilo. Pesquisadora do grupo CNPq-PUC SP Saúde, Cultura e Envelhecimento. Gestora de serviços de saúde, atua como consultora nas áreas de envelhecimento, promoção da saúde e prevenção de doenças, com várias publicações nestas áreas.

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Médica e bacharel em Direito, pós-graduada em Gestão de Negócios e Serviços de Saúde e em Docência em Saúde, Mestre em Gerontologia Social e Doutora em Ciências Sociais pela PUC SP. Orientadora docente da LEPE- Liga de Estudos do Processo de Envelhecimento e professora titular do Centro Universitários São Camilo. Pesquisadora do grupo CNPq-PUC SP Saúde, Cultura e Envelhecimento. Gestora de serviços de saúde, atua como consultora nas áreas de envelhecimento, promoção da saúde e prevenção de doenças, com várias publicações nestas áreas.

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