“PEC das domésticas” ignora o impacto nas famílias que necessitam de cuidadores de idosos

Pacientes que dependem de cuidados 24 horas por dia serão prejudicados com a “PEC das domésticas” caso não haja uma readequação para a categoria de cuidadores de idosos. Apenas as famílias mais abastadas terão condições financeiras e administrativas para arcar e fazer a gestão de quatro cuidadores dentro da residência. Dessa forma, a administração de uma residência com um idoso ficou mais complexa e onerosa que de uma pequena empresa. Com custos mensais de cerca de R$8 mil apenas para mão-de-obra (sem levar em conta as despesas do plano de saúde, medicamento, alimentação), será preciso ganhar mais que o salário da Presidenta Dilma Roussef (R$26.700,00) para que seja possível sustentar os pais dentro da residência, além da sua própria família.

Rose Souza Lima *

 

pec-das-domesticas-ignora-o-impacto-nas-familias-que-necessitam-de-cuidadores-de-idososDe acordo com pesquisas de mercado, a base mínima salarial para plantões alternados de 24 horas é de R$1.500 mais os impostos e despesas oriundos do registro na carteira de trabalho. Estes salários já atingiam patamares elevados (considerando a média do poder aquisitivo das famílias brasileiras) pois já contemplavam compensações de horas extras, turnos noturnos e descanso remunerado. Para atender um idoso que depende de 24 horas de cuidado era necessário contratação de pelo menos dois profissionais, o que totalizava R$ 4 mil mensais. Com as novas regras, as famílias serão obrigadas a demitir a atual dupla de cuidadoras para substituir por quatro profissionais com um salário menor. Mesmo assim, os custos chegarão em cerca de R$8 mil.

Além das dificuldades na adaptação financeira e administrativa, em muitos casos os pacientes também não conseguem se adaptar com a troca de cuidadores. Os pacientes com Alzheimer ou com outro tipo de demência senil precisam criar vínculo com uma pessoa e as trocas constantes causam estresse e inquietação, podendo agravar seus distúrbios de comportamento e consequente piora do quadro clínico e emocional. Há muitos casos ainda em que o paciente não pode ficar desassistido “nem por um minuto”. Nestas residências em que há apenas paciente e o cuidador, o cuidador fará uma hora de almoço fora do ambiente de trabalho e deixará o idoso sozinho?

De acordo com especialistas na área de geriatria e gerontologia, sem levar em consideração os aspectos financeiros, a permanência do idoso na própria casa ainda é a melhor opção em relação às alternativas como as Casas de Repouso, uma vez que está em ambiente conhecido, se sente mais seguro e pode preservar a própria identidade. A nova lei, sem nenhuma alteração, impossibilitará que um grande número de famílias brasileiras possa acompanhar e tratar do seu parente dentro da sua residência.

Assim como é necessário os avanços e aprimoramentos das relações trabalhistas, as leis também precisam acompanhar as mudanças do perfil etário da sociedade com o crescente número de idosos. A dinâmica da família brasileira também mudou tornando raro a existência de um familiar que não precise trabalhar e ainda se disponha a cuidar do parente idoso. É necessário pensar amplamente na adaptação de uma lei que difere os profissionais que cuidam dos objetos e da limpeza de uma casa daqueles que cuidam de um bem-estar de um paciente que, devido ao processo de senilidade, está numa fase crescente de fragilidade, vulnerabilidade e dependência.

* Rose Souza Lima é gerontóloga, especialista em Alzheimer e demências similares, coordenadora de grupo de apoio da Associação Brasileira de Alzheimer. E-mail: [email protected]

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