O envelhecimento populacional deve ser acolhido e não temido

O envelhecimento populacional deve ser acolhido e não temido

O envelhecimento não deveria ser percebido como uma ameaça, mas sim como um novo estágio de vida, oportunidade para produtividade, aprendizado e envolvimento social.


Um fantasma ronda o globo. O fantasma do “Apocalipse demográfico” provocado pelo declínio da taxa de fecundidade, que gera o envelhecimento populacional e que leva ao decrescimento da população (espalhando o mito do despovoamento). O aumento da expectativa de vida aumenta os custos com aposentadorias, pensões e cuidados com idosos.

Assim, relativamente menos trabalhadores terão que pagar por tudo isso, jogando o mundo na estagnação econômica, no declínio secular da renda per capita e na perda de bem-estar individual e coletivo.

Mas será esse um destino inexorável?

Para o economista Andrew Scott, da London Business School, a queda das taxas de fecundidade e a elevação da expectativa de vida não devem ser encaradas como problemas, mas como oportunidades para transformarmos a sociedade, criando o que ele chama de “sociedade da longevidade” em vez de uma “sociedade envelhecida”.

Scott é um dos principais especialistas no estudo do envelhecimento populacional, longevidade e seus impactos econômicos e sociais. Ele é autor do livro “The Longevity Imperative: how to build a healthier and more productive society to support our longer lives” (2024) onde defende que o envelhecimento não deveria ser percebido como uma ameaça, mas sim como um novo estágio de vida, oportunidade para produtividade, aprendizado e envolvimento social.

Em junho de 2025, Andrew Scott, em coautoria com Peter Piot, publicou o artigo “The Longevity Dividend” na revista Finance & Development (F&D), do Fundo Monetário Internacional (FMI). No texto, os autores destacam que uma em cada dez pessoas no mundo já tem mais de 65 anos e que essa proporção deve dobrar nos próximos 50 anos (ver Gráfico). O declínio populacional já é uma realidade em países como Japão, China e diversas nações europeias, que também enfrentam um aumento significativo da idade mediana de suas populações.

Porém, o pessimismo em torno do envelhecimento populacional é muito unilateral. Na verdade, a combinação de idosos se tornando mais numerosos e mais propensos a trabalhar os torna essenciais para o dinamismo econômico.

Na Europa, 90% do aumento de trabalhadores na última década — 17 milhões de pessoas a mais empregadas — adveio de um aumento no número de trabalhadores com mais de 50 anos, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No Japão, a proporção é ainda maior. Em ambos os lugares, os trabalhadores mais velhos já são o principal impulsionador do crescimento do PIB.

Este é apenas um dos componentes do chamado “dividendo da longevidade”, que as sociedades podem colher se repensarem sua abordagem ao envelhecimento. Esse processo começa com a reformulação do debate político em duas dimensões centrais.

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A primeira é parar de ver uma sociedade em envelhecimento apenas como um problema. Esta é uma maneira notavelmente negativa de enquadrar uma das maiores conquistas do século XX: a maior parte da humanidade está vivendo vidas mais longas e saudáveis. Essa é uma oportunidade.

A segunda é superar o foco excessivo e pouco realista na mudança de comportamento individual como solução para preservar sistemas atuais. Em vez disso, é necessário criar condições para que cada pessoa se adapte a uma vida mais longa, oferecendo o suporte adequado para que possam viver plenamente essa longevidade.

De fato, a maneira como envelhecemos pode ser influenciada por uma série de ações individuais e políticas governamentais. Ao tornar a adaptação e o ajuste a vidas mais longas uma prioridade urgente, podemos gerar um dividendo tridimensional de longevidade, com vidas mais longas, saudáveis ​​e produtivas. Nosso futuro exige que aproveitemos esta oportunidade.

O envelhecimento populacional não é o prenúncio de um colapso, mas a expressão de uma vitória civilizatória. Viver mais é um privilégio que deve ser acompanhado por políticas públicas inovadoras, adaptações institucionais e uma mudança de mentalidade coletiva. Em vez de temer o “Apocalipse demográfico”, é hora de abraçar a construção de uma sociedade da longevidade, capaz de transformar anos extras em saúde, aprendizado, produtividade e bem-estar.

O Dia Internacional das Pessoas Idosas e o Dia Nacional do Idoso, celebrados em 1º de outubro, nos convidam justamente a isso: substituir o lamento do “ônus do envelhecimento” pela celebração do verdadeiro “dividendo da longevidade”. Transformar o envelhecimento em fonte de vitalidade e progresso é não apenas possível, mas necessário e será este o verdadeiro legado para as sociedades que souberem acolher, e não temer, o seu futuro mais longevo.

Referências
Scott, A. J. 2024. The Longevity Imperative: How to Build a Healthier and More Productive Society to Support Our Longer Lives. New York: Basic Books.
SCOTT, Andrew. PIOT, Peter. The Longevity Dividend, F&D, IMF, June 2025. https://www.imf.org/en/Publications/fandd/issues/2025/06/the-longevity-dividend-andrew-scott

Foto de Kampus Production/pexels.


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José Eustáquio Diniz Alves

Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br. Link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

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Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br. Link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

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