O interesse das pessoas da terceira idade pelo digital tem crescido bastante, pois, além de integração, trata-se de uma questão de necessidade real, segurança e saúde emocional
Naiane Loureiro dos Santos (*)
Cada vez mais as tecnologias digitais têm permitido ao indivíduo se integrar na sociedade e nas comunidades virtuais. Por meio delas, conseguimos ter mais contato com parentes e amigos, trocar informações com as pessoas em geral, solicitar e utilizar serviços, realizar transações bancárias etc. No caso do público 60 anos ou mais, o interesse pelo mundo virtual tem crescido bastante e consiste, além de uma possibilidade de integração, uma questão de necessidade real, segurança e saúde emocional. Por isso, a procura por esse tipo de conhecimento tem crescido em ritmo acelerado.
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Conforme uma pesquisa realizada em 2016 pelo Instituto Locomotiva, o número de brasileiros conectados na internet cresceu mais de 100% nos últimos oito anos, o aumento para os internautas da terceira idade foi de quase 1.000%. Com a Pandemia do novo coronavírus estima-se que o crescimento nos últimos 2 anos foi ainda maior, devido às recomendações de isolamento social que promoveram o distanciamento físico obrigatório entre as pessoas, principalmente os idosos, estimulando ainda mais o acesso ao mundo digital, como uma forma possível para promover encontros virtuais, manutenção dos vínculos e soluções de problemas.
Quando observamos o fato de que nas últimas décadas o envelhecimento populacional vem se tornando um dos temas prioritários nas agendas públicas do país e do mundo, devido à mudança na pirâmide etária que aponta um rápido crescimento da população acima de 60 anos, entendemos a necessidade de criação de políticas públicas e projetos sociais que acompanhe esse processo, impulsionado iniciativas de formação e capacitação com objetivo de promover a inclusão digital.
De acordo com informações divulgadas pelo IBGE em 2018 referentes à Projeção da População, o Brasil tem mais de 28,7 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, esse público representa 13% da população do nosso país, com projeções de aumento para, aproximadamente, 32 milhões, em 2025. Estima-se que até 2060, o percentual de pessoas com mais de 65 anos passará dos atuais 9,2% para 25,5%, ou seja, 1 em cada 4 brasileiros será idoso (IBGE, 2018). Esses dados apontam claramente para uma demanda, cada vez maior, por uma atenção especial ao público sênior e suas necessidades.
A acessibilidade é um direito universal e deve ser considerada em todos os setores da sociedade. No caso do público 60+, ela contribui para o desenvolvimento inclusivo e promove um processo de envelhecimento ativo. Com base nessa premissa, o Instituto Ânima criou a Universidade Aberta à Pessoa Idosa (UAPI), em parceria com o as Instituições de Ensino Superior do Ecossistema Ânima de Educação, os Conselhos de Direitos da Pessoa Idosa, e, com apoio de diversas empresas que destinaram recursos via renúncia fiscal para o Programa(1), visando oferecer ações gratuitas de educação para pessoas com idade igual ou superior a 60 anos. Um dos cursos/oficinas mais procurados pelo público 60 mais é o de inclusão digital, que tem como objetivo principal possibilitar a utilização de plataformas e mecanismos virtuais de modo seguro, as oficinas ofertas são: Internet Banking, Recursos do Celular, Whatsapp e Fake News, Compras Online, Facebook, Youtube, Google/E-mail e Jogos On-line.
Concordamos com Paulo Freire (2005, p. 83-84), que o ser humano, ao contrário dos animais, tem consciência do seu inacabamento e possui uma vocação ontológica do vir a ser mais. Essa característica é intrínseca, ou seja, faz parte da natureza humana. Somos seres sociais e aprendemos uns com os outros. O objetivo de iniciativas como a UAPI do Instituto Ânima é desenvolver ações que contribuam para o envelhecimento saudável e ativo da população idosa, mediante a oferta de atividades transdisciplinares, de cunho educativo que contemplem e desenvolvam aspectos físicos, intelectuais, cognitivos, sociais e que integre esse público à dinâmica social atual.
Outro ponto interessante que contribui muito para a inclusão digital é a relação intergeracional. A UAPI promove e auxilia na ampliação da comunicação entre indivíduos de diferentes faixas etárias, por meio dos alunos bolsistas participantes do Programa e de ações com foco nos familiares da pessoa idosa, que visam o apoio e a contribuição dos mesmos no processo de aprendizagem do participante do Programa. Acreditamos que o vínculo social permite aos envolvidos enriquecer seus conhecimentos e adquirir novos. Essa relação entre diferentes gerações contribui para desconstruir mitos no âmbito do mundo digital, sanar dúvidas diversas e minimizar os desafios relacionados à idade.
Na visão de Paulo Freire (2011), a educação deve promover a libertação dos indivíduos e os auxiliar na luta pelos seus direitos enquanto cidadãos. Essa é a educação libertadora. Na UAPI, os idosos são convidados a expor suas dificuldades, compartilhar casos ou experiências, e esse é ponto de partida para o desenrolar dos conteúdos. Com isso, o aprendizado se dá de forma autônoma e interativa. Em pesquisas realizadas com idosos beneficiários da UAPI, os resultados encontrados mostram satisfação em adquirir novos conhecimentos úteis ao cotidiano, além de fazer novas amizades, se socializar com pessoas da mesma faixa etária, compartilhar interesses comuns e encontrar um grupo de apoio. A UAPI pode contribuir no desenvolvimento da sensação de vitalidade e empoderamento da pessoa idosa, mostrando que ele é capaz.
Assim, percebemos que o conhecimento digital está cada vez mais ao alcance da terceira idade. O aprendizado tecnológico após os 60 anos possibilita mais autonomia para a vida e novas descobertas. Os idosos devem ser incentivados a utilizar as tecnologias digitais como canais de diálogo com amigos e familiares, inserção social, busca por serviços e informações diversas que os mantém atualizados sobre os acontecimentos do mundo.
Nota
(1) Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC). Lei nº 13.019, sancionada em 2014, que regulamenta as parcerias entre organizações do terceiro setor e poder público.
Referências
FREIRE, Paulo (2011). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra.
FREIRE, Paulo (2005). Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
(*) Naiane Loureiro dos Santos – Gerente de Projetos Sociais do Instituto Ânima.
Foto destaque de Rodnae Productions/pexels.