Mulheres se orgulham de seus cabelos grisalhos e rugas

A tirania da juventude tem sido motivada pelas mulheres, mas cada vez mais elas abalam esse fardo. Três delas, que alcançaram notoriedade na esfera pública, explicam isso. Aliás, o preconceito por idade é um dos últimos preconceitos de nossa cultura e está intimamente ligado ao sexismo que caminha para sua extinção.

Solange Vázquez (*)


O castelhano quer que a palavra velhice seja do gênero feminino. Também rugas, invisibilidade … Mas também aceitação, dignidade, beleza e luta. De que trata esta reportagem? De três mulheres que deixaram a juventude há muito tempo e que foram bem-sucedidas na esfera pública. Elas contam como a maturidade e a velhice não devem ser algo a ser ocultado ou camuflado. A modelo Pino María Montesdeoca, a atriz Benedicta Sánchez e a escritora Toti Martínez de Lezea afirmam que sem seios eretos, sem curvas de virar a cabeça de qualquer um, sem pele perfeita – e mesmo sem dentes, que ‘merda!’ – você pode ser uma estrela, uma pessoa ‘visível’ e reconhecida por seu talento. Respeitada e aplaudida.

E há mais e mais estudos (e realidades) que confirmam isso. Susan Douglas, professora de Ciências da Comunicação da Universidade de Michigan, escreveu um livro sobre o poder das mulheres mais velhas, onde ela diz que esse grupo “está gritando ‘ainda temos força e muito a oferecer, não seremos relegados à invisibilidade’”. A estudiosa acredita que elas estão reinventando “o significado de ser uma mulher mais velha” e lutando contra a ideia de que o “valor” dos homens aumenta com a idade enquanto os delas estão desmoronando. É também a tese que a estudiosa Deborah Rhode apresenta em seu livro ‘The Beauty Bias’, onde explica que, embora cabelos brancos e linhas de expressão tenham sido tradicionalmente interpretados como sinais de “distinção” em homens; as mulheres de certa idade, pressionadas, tentam escondê-los para não se sentirem marginalizadas. Assim, segundo as estudiosas, o preconceito por idade é um dos últimos preconceitos de nossa cultura e está intimamente ligado ao sexismo. Embora ele tenha começado a ficar antiquado – caduco – e já esteja caminhando, pouco a pouco, em direção à sua extinção.

Pino María Montesdeoca, 57 anos, modelo

“Você precisa fazer com que as próximas gerações entendam que ter 50 anos é legal … e 60 também!”

Pino María aparece nas fotos publicitárias ou na passarela como uma rainha, segura, serena. Nenhuma garota de 20 anos seria capaz de olhar por cima do ombro como ela. Ela emana força. E isso é apaixonante, porque não há nada mais ‘anti-sexy’ do que os complexos. A modelo, muito desejada por marcas como L’Oréal, por grandes empresas como Pedro del Hierro e Suma Cruz e designers como Duyos, mostra sua maturidade e a reivindica. “Você precisa fazer com que as próximas gerações entendam que ter 50 anos é legal … e 60 também! Se estou colocando um grão de areia para que isso aconteça, me considero satisfeita”, diz com uma voz doce e descontraída.

Ela ainda não completou 58 anos. ‘Não é tão velha assim!’, Você dirá com razão. E não é em termos gerais, mas no mundo da moda e da publicidade onde ela se move, em que a tirania da juventude levou muitos profissionais a ‘se aposentar’ em idades muito precoces, Pino María é uma ‘superveterana’. Embora exista mais mulheres como ela, porque as empresas já entenderam – finalmente! – que mulheres com mais de 40 anos têm vida, aspirações e, é claro, maior poder de compra, que é o que de fato importa.

“Há pessoas mais velhas que exprimem beleza, dignidade, verdade …”, defende Pino María, que diz que não se cuida «muito» nem recorre a retoques estéticos «porque me custa menos dinheiro e tempo aceitar a velhice que me está habitando». As mulheres bonitas não sofrem com o envelhecimento? Pelo menos, esse é o mito. “Vamos ver, você entra em pânico pelo menos uma vez por dia!”. Ela diz dando risada. “Você se olha no espelho e diz: ‘Com licença, isso não estava aí’. Mas isso acontece com você com 50 e com 30 anos. Você precisa acabar com essa pressão”. Para ela, o segredo para seduzir é “amar-se e se divertir, porque isso aparece em teu rosto. Um rosto amargo afasta as pessoas como se você tivesse algo contagioso”.

Benedicta Sánchez 84 anos, atriz, vencedora de um Goya

“Cada ruga é um diploma para mim. A experiência me diz para aceitar e não lutar comigo mesma”

“Não me importo se me chamam de velha … se é feito com carinho”, diz Benedicta Sánchez (San Fiz, Lugo, 1935). A atriz de 84 anos, que ganhou um Goya por O que Arde, onde interpreta a mãe de um piromaníaco, faz essa afirmação com um sotaque galego, lânguido e doce, que muda repentinamente quando começa a cantarolar uma canção argentina: «’Velho, meu querido velho, agora você anda devagar’. Então a palavra ‘velho’ é preciosa, não é?

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Estenda a pergunta e essas palavras permanecem no ar (por muito tempo elas flutuaram acima de todas as mulheres de uma certa idade como uma nuvem negra). Mas Benedicta nunca foi afetada por seu aniversário. “Cada ruga é um diploma para mim. Vamos ver, eu tenho 84 anos, não posso fingir que é 50 ”, diz ela rindo. Além disso, eu me considero um espírito, não carne. Ela, que nunca sonhou em ser atriz – em sua vida foi fotógrafa, livreira e morou no Brasil e em um kibutz israelense -, está feliz por seu sucesso recente e que isso sirva para que as mulheres mais velhas “sejam vistas”. “Nós realmente existimos!”, diz. “Lembre aos diretores que, com mais de 80 anos, você também pode se apaixonar pela câmera, e o público também”, como fez na entrega de Goya, aparecendo sem dentes e com seus cabelos brancos ao vento. Ela rompeu modelos. Ela estava cercada pela beleza de jovens mulheres que cuidaram dos mínimos detalhes de sua aparência e que poderiam ser suas netas, mas ela brilhava, sem se importar com nada. “E por que eu me importaria? É assim que eu sou, embora me veja nas gravações e só precise da vassoura entre minhas pernas para parecer uma bruxa”, fala dando risada. E continua, “ia sim sem próteses na boca, porque estou esperando para colocá-las. Chegamos a uma idade em que isso não importa. Não. Mas a experiência me diz para me aceitar. Quando se é jovem, se luta constantemente consigo mesma”.

Toti Martínez de Lezea, 71 anos, escritora

“As mulheres mais velhas apenas anunciam gel para dentaduras ou cremes de que não precisam”

“As mulheres mais velhas são cada vez menos ‘invisíveis’, sim. Elas estão recuperando o lugar que sempre deveriam ter na vida pública. Também. Mas você não precisa tocar os sinos, o processo está em andamento, mas ainda há muito a ser feito. É verdade que as mulheres agora aparecem em altas posições políticas, algo impensável até recentemente, embora raramente ultrapassem os 70 anos. No cinema, por exemplo, você pode contar nos dedos de uma só mão as principais atrizes nos papéis principais. Nos anúncios, as mais velhas aparecem apenas anunciando gel para dentaduras, compressas ou sopas. Às vezes, elas também anunciam cremes para rugas, mas, geralmente, são mulheres que não precisam mais deles. E em questões de moda, eu nem vou te contar!”. É assim que a escritora vitoriana Toti Martínez de Lezea resume os ‘avanços’ a esse respeito.

Em nível pessoal ela afirma que nunca se sentiu invisível por ser uma mulher madura, “talvez porque eu também não tenha me importado”. Muito ‘fã’ de Meryl Streep e Helen Mirren, “que são magníficas aos 70 anos e também da rainha Elizabeth II da Inglaterra, que não tira a coroa apesar de já ter 93”, Toti tem os efeitos colaterais do envelhecer naturalmente. Seus cabelos grisalhos, por exemplo, são uma das suas marcas e não constituem uma reivindicação: “Eu os tenho desde que eu era muito jovem. Pintei-os por algum tempo, mas aos 50 anos parei de fazê-lo, entre outras coisas, porque era muito chato. Minha mãe nunca pintou e foi ótima. Eu ignoro os motivos de outras mulheres para deixar seus cabelos naturais, mas cada vez mais observo que elas estão deixando. Outro efeito colateral dos anos … é possível continuar se sentindo sexy? “Ha ha ha, pessoalmente acho que a partir de certa idade, em vez de ser sexy, uma mulher se cuida para se sentir bem. Aventuras eróticas estão em segundo plano!”.

(*) Solange Vázquez – Bacharel em Ciência da Informação. É redatora de EL CORREO desde 1998 e trabalha nas seções Reportagens, Política, Internacional, Vida e Cidadãos. Ela também foi editora da edição Margen Izquierda e trabalhou na edição digital do jornal. Esta reportagem foi publicada no jornal El Diario Vasco (Espanha). Tradução livre de Sofia Lucena.


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