Envelhecimento populacional, intergeneridade e intergeracionalidade

Envelhecimento populacional, intergeneridade e intergeracionalidade

Sem dúvida, a intergeneridade se opõe ao sexismo e à discriminação de gênero.


O Brasil está passando por uma grande transformação na sua estrutura etária. A distribuição por sexo e idade da população brasileira (também conhecida como pirâmide etária ou pirâmide populacional) ficou mais ou menos estável durante 470 anos da história do Brasil. Mas tudo começou a mudar a partir de 1970, quando as taxas de fecundidade começaram a diminuir, progressivamente, reduzindo a base da estrutura piramidal da população brasileira.

Em 1970, a proporção de crianças e jovens de 0 a 14 anos, no conjunto da população, era de 42% e a proporção de idosos de 60 anos e mais de idade era de somente 5%. Segundo o censo demográfico de 2022, o grupo etário de 0-14 anos diminuiu para menos da metade, ficando em 19.8% da população total e a proporção de idosos mais que triplicou, ficando em 15,8%. Para 2100, a Divisão de População da ONU estima 13% de jovens e 40% de idosos. É quase uma inversão da pirâmide entre 1970 e 2100. Sem dúvida, a população brasileira envelheceu entre 1970 e 2022 e continuará envelhecendo ao longo do século XXI.

Além de uma estrutura etária mais envelhecida, o Brasil está tendo uma maior proporção de mulheres. Na população brasileira, em 1900, havia 51% de homens e 49% de mulheres. Em 1940, houve empate com 50% para cada sexo. Em 1970, havia 50,3% de mulheres e 49,7% de homens. Em 2022, a proporção de mulheres subiu para 51,5% e a proporção de homens caiu para 48,5%. Portanto, o Brasil está ficando mais feminino e a percentagem de mulheres certamente continuará aumentando pari passu ao envelhecimento populacional, pois as mulheres possuem expectativa de vida mais elevada.

A pirâmide populacional é a casa de todos os habitantes de um país. A pirâmide brasileira já mudou bastante entre 1970 e 2022 e vai continuar mudando entre 2022 e 2100. Todavia, ela continuará abarcando o conjunto da população brasileira, independentemente do sexo e da idade. Não existe a melhor idade ou o melhor sexo. Todas as idades e todos os sexos importam. A pirâmide é a unidade da diversidade e da diversa-idade. Ninguém deve ser privilegiado e pessoa alguma deve ficar para trás. Os direitos são iguais para todas as pessoas. Políticas específicas são válidas, mas não podem se contrapor ao interesse geral e coletivo.

Dada a limitação atual de dados, a pirâmide populacional atual é composta por duas categorias de sexo biológico: homem e mulher. Mas no futuro, com o aperfeiçoamento dos instrumentos de coleta de informações individuais, a pirâmide será composta por idade e gênero. Sendo o gênero entendido muito além de duas categorias. Isto inclui uma gama mais ou menos ampla de identidades não binárias (Agênero, Andrógino, Gênero fluído, Pessoas trans, Homem não binário, Mulher não binária, etc.). Sem dúvida, a intergeneridade se opõe ao sexismo e à discriminação de gênero.

Em termos de idade, a pirâmide pode ser construída por grupos quinquenais ou por idade simples. O  termo geração diz respeito ao grupo de pessoas que nasceram e viveram mais ou menos na mesma época, sendo que a definição de uma geração depende dos critérios de interesse a serem utilizados de forma adequadamente seletiva.

Alguns definem as crianças como os indivíduos de 0 a 12 anos, os adolescentes de 12 a 18 anos, os adultos de 19 a 59 anos, os idosos de 60 anos e mais. Outros definem as criança de 0 até 10 anos, os adolescentes de 10 a 19 anos, o grupo em idade ativa de 15 a 64 anos, os idosos de 65 anos e mais de idade, dentre outras alternativas.

Dado ao avanço do “tsunami prateado”, surgiram subgrupos de idosos. Por diferentes métricas, já é comum se classificar o grupo de “idoso jovem” e o de “idoso sênior”, com destaque para 70 anos e +, 80 anos e + e 100 anos e + de idade. A realidade vai ficando mais complexa. As definições variam, dependendo da época, dos países, do objeto de estudo, da atenção da política pública ou do foco dos investimentos da iniciativa privada.

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Tradicionalmente, as populações são divididas em três faixas etárias: Jovens (foco principal das políticas educacionais), adultos (foco principal das políticas de emprego) e idosos (foco principal das políticas previdenciárias). Mas, estes grupos não são opostos, estanques, estáticos e inflexíveis, sendo que a convivência e as políticas públicas devem considerar a dinâmica intergeracional. Ao invés de possíveis conflitos entre os polos “inocência versus experiência”, há sempre a possibilidade de colaboração, compartilhamento e complementaridade.

Por exemplo, o envelhecimento saudável começa na 1ª infância e prossegue na idade de trabalho e nas conquistas das demais gerações. Embora a idade cronológica seja determinística (não se muda o registro de nascimento), as relações multigeracionais são transversais e ocorrem de baixo para cima e de cima para baixo. Menoridade e maturidade não se definem pela data de nascimento, mas pela autonomia e pela capacidade de aprendizagem e entendimento. Em geral, o potencial de inovação é atemporal.

Ao fim e ao cabo, as idades são independentes e, ao mesmo tempo, interdependentes. As idades são os tijolos e as gerações são as colunas da edificação populacional. Todas as idades contam e toda contribuição importa, pois a pirâmide precisa de integração e não de segregação. Por conseguinte, a intergeracionalidade se opõe ao etarismo, isto é, ao preconceito e à discriminação com base na idade.

A intergeneridade e a intergeracionalidade são dois conceitos fundamentais para a interação dos indivíduos e grupos de pessoas de diferentes gêneros e de diferentes gerações. As pessoas nascem, crescem e morrem. E o ciclo se renova, de preferência, com a desejável horizontalidade e empatia entre os sexos e as diferentes faixas etárias. Não importa onde os indivíduos possam estar na pirâmide populacional, mas sim que haja uma integral sociabilidade e comprometimentos mútuos.

O envelhecimento populacional é inexorável. O peso relativo dos grupos mudam no tempo e nos espaços da arquitetura da pirâmide. Sem embargo, é indispensável criar e estabelecer uma sinergia entre os gêneros e entre as gerações, sem discriminações, visando os direitos intrínsecos de todas as cidadãs e cidadãos e o bem-estar de todas as pessoas, com respeito aos princípios fundamentais de tolerância, harmonia, gentileza, justiça, sustentabilidade, paz, prosperidade e busca da felicidade.

Referências
ALVES, JED. As ondas do envelhecimento populacional no Brasil, Portal do Envelhecimento, 18/05/2022. Disponível em: https://portaldoenvelhecimento.com.br/as-ondas-do-envelhecimento-populacional-no-brasil/
ALVES, JED. O envelhecimento do envelhecimento no Brasil e no mundo, Portal do Envelhecimento, 30/08/2022  https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/o-envelhecimento-do-envelhecimento-no-brasil-e-no-mundo/
ALVES, JED. A feminilização do envelhecimento populacional no Brasil e no mundo, Portal do Envelhecimento, 07/10/2022 . Disponível em: https://portaldoenvelhecimento.com.br/a-feminilizacao-do-envelhecimento-populacional-no-brasil-e-no-mundo/
ALVES, JED. O 3o bônus demográfico e o direito ao trabalho da população idosa, Portal do Envelhecimento, 25/07/2023 https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/o-3o-bonus-demografico-e-o-direito-ao-trabalho-da-populacao-idosa/
ALVES, JED. Como os países podem enriquecer e envelhecer ao mesmo tempo, Portal do Envelhecimento, 18/10/2023 https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/como-os-paises-podem-enriquecer-e-envelhecer-ao-mesmo-tempo/
ALVES, JED. O rápido envelhecimento populacional do Brasil, Portal do Envelhecimento, 28/10/2023. Disponível em: https://portaldoenvelhecimento.com.br/o-rapido-envelhecimento-populacional-do-brasil/
ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século XXI (com a colaboração de GALIZA, F), ENS, maio de 2022
https://ens.edu.br:81/arquivos/Livro%20Demografia%20e%20Economia_digital_2.pdf

Foto destaque de Mehmet Turgut Kirkgoz/pexels


José Eustáquio Diniz Alves

Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: [email protected]. Link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382E-mail: [email protected]

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