Muitos dos programas de preparação para a aposentadoria reservam um momento para se falar da ocupação do tempo livre e o voluntariado é um grande tema, mas vejo que não existe uma reflexão sobre o mesmo no contexto neoliberal.
Cláudia Soares de Oliveira (*)
O século XX nos trouxe a conquista da longevidade, passamos a viver mais. Na modernidade é que nasce a paixão pelo futuro, viver preparando a vida do futuro. Assim o século XXI nos coloca o desafio de como viver estes anos que ganhamos. Em uma de suas reflexões a professora Guita Debert nos diz que se nos anos 70 Simone de Beauvoir publica o livro “A velhice, realidade incômoda” com a finalidade de denunciar a conspiração do silêncio em relação à velhice, hoje temos muito “barulho” e ruído em torno da velhice. Existem os conselhos (municipal, estadual e federal) do idoso, o Estatuto do Idoso, políticas públicas e tanto o terceiro setor quanto o setor privado estão pensando o que é envelhecer com qualidade de vida, bem estar, enfim, todos pensando o que seria “uma boa velhice”.
Como as questões do engajamento social e do voluntariado entram nessa discussão? Na nossa sociedade, a idade cronológica é fundamental no modo como pensamos o mundo e organizamos nossas vidas. A partir da articulação entre a velhice e o tempo cronológico, aqui no Brasil a velhice começa aos 60 anos. Já nas categorias estabelecidas pela ONU (1982): os pré-idosos entre 55 e 64 anos; os idosos jovens entre 65 e 79 anos (60-69 anos para quem vive na Ásia e na região do Pacífico); idosos avançados + de 80 anos (+ 70 anos para quem vive na Ásia e na região do Pacífico).
O que percebemos facilmente é que os pré-idosos (também período chamado de terceira idade) e os idosos jovens, passam a ser alvo de diversos programas, uma vez que estão se preparando para a aposentadoria, outros já estão aposentados e os filhos muitas vezes já saíram de casa ou não necessitam de tanta atenção. São pessoas mais disponíveis para novas experiências; para repensar a vida; experimentar novas identidades; redefinir seus projetos numa visão mais positiva.
Estas novas concepções da velhice se estendem ao corpo e à saúde e são concepções auto preservacionistas, ou seja, hoje é quase uma obrigação cuidar do corpo e manter-se jovem. É uma demanda social: envelhecer sem se tornar velho. Assim, a ordem é: você tem que estar bem (corpo, saúde, humor, educação, cultura, financeiro) o tempo todo.
Hoje as pessoas que estão nesse momento da vida – mesmo que não estejam participando de nenhum programa -, são levadas a pensar em um novo projeto de vida e a se questionar: Quem sou eu? O que eu vou fazer nesta nova etapa da vida? O que eu quero fazer? Quais são os meus desejos? Como me manter saudável?
É assim que na maioria dos casos as questões do engajamento social e do voluntariado entram na vida das pessoas que estão na velhice. A possibilidade de se exercer o trabalho voluntário passa a ser uma atividade para a ocupação do tempo livre, uma vez que nossa sociedade não concebe o ócio e a possibilidade de uma pessoa não estar inserida na cadeia produtiva. O fator da saúde também é relevante, pois se atrela ao trabalho a possibilidade de se manter saudável evitando alguns tipos de doenças degenerativas.
Muitos dos programas de preparação para a aposentadoria reservam um momento para se falar da ocupação do tempo livre e o voluntariado é um grande tema, mas vejo que não existe uma reflexão sobre o voluntariado no contexto neoliberal, buscando situar a funcionalidade do trabalho voluntário ao capital.
Acredito que o problema não consiste nas ações voluntárias em si, mas, como as mesmas são apropriadas dentro da lógica de Reforma do Estado e transferência de parte das suas responsabilidades para a sociedade civil. Além do que é preciso pontuar que as práticas voluntárias fazem parte de um conjunto de ações pontuais, assistemáticas, sem acompanhamento e avaliação. Representando assim, muitas vezes, mais um projeto de marketing político-governamental do que uma ação que venha alterar, de forma propositiva, a estrutura da instituição onde se atua. Além do que muitas vezes a própria velhice e o processo de envelhecimento não são devidamente problematizados dentro desse contexto.
O curso a ser ofertado no Espaço Longeviver versará sobre as questões aqui colocadas.
Serviço
Curso: Arte, Política e o Trabalho Voluntário
1º Encontro: 31/01
2º Encontro: 07/02
3º Encontro: 14/02
4º Encontro: 21/02
Horário: 09 às 12h
Carga horária: 12 horas (4 encontros de 3 horas)
Local: Espaço Longeviver: Avenida Pedro Severino Junior, 366 – Sala 166 – Vila Guarani – Próximo ao metrô Conceição – linha azul
Contato: [email protected]
(*) Cláudia Soares de Oliveira – Matemática de formação construiu sua carreira na área de educação se especializando em psicopedagogia e psicomotricidade. Apaixonada pelas particularidades de cada ser, por histórias de vida, pelas questões da existência e motivada pelos problemas enfrentados diante da doença do seu pai, adentrou no campo da gerontologia e focou seus estudos e suas ações em torno daquilo que pode liberar as potências da vida. Neste percurso se especializou em Gestão de Programas Intergeracionais pela Universidade de Granada – Espanha e Mestre em Gerontologia Social da PUC-SP. E-mail: [email protected]