Deus na escuridão

Deus na escuridão

Uma definição do amor materno mais linda que já vi é de Valter Hugo Mãe, em seu livro “Deus na Escuridão”.


«Deus é exatamente como as mães. Liberta Seus filhos e haverá de buscá-los eternamente. Passará todo o tempo de coração pequeno à espera, espiando todos os sinais que lhe anunciem a presença, o regresso dos filhos.»
Valter Hugo Mãe

Nem sempre é fácil escrever.

Nomear as tantas emoções não é tarefa simples.

Estar triste nos faz buscar a causa da tristeza então descubro o que se passa e o que tantas outras vezes já me fez sentir assim.

Lembrei então do livro “Deus na Escuridão” do escritor Valter Hugo Mãe, em especial do capítulo que dá o nome ao livro.

Desconheço uma definição do amor materno mais linda do que a deste autor.

“Deus é exatamente como são as mães, que criam e depois vão ficando para trás, à distância, numa distância que parece significar que não são mais precisas e Ele, como elas, só sabe amar acima de qualquer defeito e qualquer falha, com cada vez mais saudades…”

Meu filho sairá de casa. De novo.

Já foi e voltou umas tantas vezes.

Morou com amigos e com a namorada. Voltou. Foi trabalhar no interior. Voltou.

Quando ele sai, eu choro. Todas as vezes.

Choro pelo mesmo tema constantemente.

Foi este filho quem me ensinou a ser mãe e foi ele quem me ensinou a dor de deixar ir e de distanciar a sua presença dos meus olhos.

Desta vez parece diferente pois a sua vida se enlaça com outra para no amor viver um ao lado do outro.

Como posso estar triste com toda alegria que essa união me causa?

Até outro dia ele era tão pequeno e me olhava como quem olha uma princesa fazendo eu me vestir de rosa para tocar seus olhos com a delicadeza da cor do meu vestido.

Éramos grudados. Inseparáveis. Amigos de brincadeiras e nas fantasias.

Sempre tivemos a arte brincando conosco e nos unindo cada vez mais.

Foi com esse companheirismo que ele cresceu. Foi com a certeza do meu amor que ele aprendeu a caminhar para longe dos meus olhos.

Daqui uns dias ele sairá mais uma vez de casa e mais uma vez meu coração aperta.

Não. Ele não está indo para outro continente nem mesmo para outra cidade.

Estaremos no mesmo bairro o que me faz crer o quanto é insana a cabeça de uma mãe.

Não perca nenhuma notícia!

Receba cada matéria diretamente no seu e-mail assinando a newsletter diária!

“Deus confessa que buscou no escuro. Passando as mãos pelas ruas do mundo, a descer o nariz para buscar seu cheiro… Deus, como as mães, tem a impressão de que vai morrer se não voltar a ver seus filhos…”

Tento deixar de lado este meu jeito Prima Donna de existir e procuro jogar luz no meu lado racional (confesso precisar de holofotes).

Sei que nada disso faz sentido. Para quê tanta dor? Ele estará a poucas quadras daqui! Deixa de ser louca!

Desse jeito, falando comigo mesma, procuro diminuir a vibração deste drama que se escreve em meus dias.

Vai, meu filho. Vai viver sua vida e seu amor.

Da minha janela quase avisto seu novo lar. Fisicamente, não estaremos tão longe assim. Posso e devo me acalmar.

Apenas não se esqueça de trazer sua presença para perto dos meus olhos. Esteja certo de que ganharei o dia com isso.

No mais, “Deus, como são as mães, tem a impressão de que vai morrer se não voltar a ver os filhos. Depois, ouve pacientemente o filho a repreendê-lo, porque não devia andar a sua procura, porque não é mais criança…”

Segue sua vida com a certeza do meu amor.

Amor que não se explica e não se mede. Apenas se sente.

O livro “Deus na Escuridão” vale a leitura. Nele a poesia em prosa se mistura com o realismo fantástico característicos da escrita deste autor, um dos mais brilhantes escritores da língua portuguesa da atualidade.

Um livro que fala sobre o cuidado e sobre o amor.

Sim, Deus é como as mães e se essa mãe tiver no sangue uma gota sequer de sangue italiano e se além disso houver alguma influência das mães judias em seu comportamento, Deus enlouquece!

Deus é como as mães e nesse amor sagrado vivemos e morremos.

Às vezes ouso ser poeta. As vezes arrisco alguns versos.

Mas quando penso que meu filho sairá de casa, de novo, penso na ira de Deus que se manifesta contra a impiedade e injustiça.

­­— E se você sumir ou ficar muito tempo sem me ver, vou aí e te trago pelas orelhas!

Sim, Deus é exatamente como são as mães.

Foto de Anna Tarazevich/pexels.


Cristiane T. Pomeranz

Arteterapeuta, entusiasta da vida e da arte, e mestre em Gerontologia Social pela PUC-SP. Idealizadora do Faça Memórias em Casa que propõe o contato com a História da Arte para tornar digna as velhices com problemas de esquecimento. www.facamemorias.art.br E-mail: [email protected].

Compartilhe:

Avatar do Autor

Cristiane T. Pomeranz

Arteterapeuta, entusiasta da vida e da arte, e mestre em Gerontologia Social pela PUC-SP. Idealizadora do Faça Memórias em Casa que propõe o contato com a História da Arte para tornar digna as velhices com problemas de esquecimento. www.facamemorias.art.br E-mail: [email protected].

Cristiane T. Pomeranz escreveu 93 posts

Veja todos os posts de Cristiane T. Pomeranz
Comentários

Os comentários dos leitores não refletem a opinião do Portal do Envelhecimento e Longeviver.

-->

Conecte-se com a gente

LinkedIn
Share
WhatsApp
Follow by Email
RSS