Carta aberta sobre pessoas idosas e turismo

Carta aberta sobre pessoas idosas e turismo

Pesquisadores da área de longevidade solicitam em carta aberta a atenção da Embratur para a participação das pessoas 60+ no turismo brasileiro


O deputado federal Marcelo Freixo (PT-RJ) foi nomeado presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), órgão vinculado ao Ministério do Turismo. O decreto presidencial com a nomeação foi publicado em edição extra do Diário Oficial da União, na noite do dia 12 de janeiro de 2023.

Carta aberta a Marcelo Freixo, presidente da Embratur, sobre pessoas idosas e turismo

Caro presidente da Embratur (Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo), senhor Marcelo Freixo,

Nós, pesquisadores da área de longevidade, solicitamos a sua especial atenção para a valiosa participação das pessoas 60+ no turismo brasileiro.

Você sabe que ninguém quer morrer cedo. Porém também ninguém quer “envelhecer”. Esse paradoxo acarreta situações indesejadas de idadismo e de negação da existência de grande número de pessoas idosas em nossa sociedade.

Caso a Embratur vá estimular o turismo 60+, gostaríamos de contribuir com algumas reflexões.

O Relatório 2019 da OMT (Organização Mundial de Turismo) aponta o Turismo como o setor da economia que mais cresce no mundo movimentando hoje trilhões de Dólares em todo o planeta (3,6 trilhões). O setor oferece cerca de 300 milhões de empregos no mundo todo. No Brasil são mais de 15 milhões de empregos ligados ao turismo (OMT, 2019).

A definição de um mercado de turismo 60+ criaria novas oportunidades para o setor nas temporadas de baixa ocupação, melhorando a competitividade nos destinos nacionais e diminuindo os efeitos da sazonalidade. Tornaria possível a oferta de produtos de qualidade adequados para pessoas idosas – sejam pessoas aposentadas, pensionistas ou apreciadoras de viagens.

Soma-se a isso a percepção de que a sociedade precisa se preparar para o expressivo aumento da população idosa com medidas consistentes que façam frente ao contexto de cerca de 34,6 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade, que correspondem a 16% da população total (IBGE – PNAD-Contínua, 2020).

Especificamente no mercado de turismo brasileiro, uma pesquisa de Sondagem do Consumidor, de agosto de 2016, mostrou que 25,4% destes brasileiros na faixa etária acima de 60 anos pretendiam viajar nos seis meses seguintes, sendo de 59,9% a escolha de destinos domésticos (Brasil, 2016).

Estudiosos consideram que as atividades turísticas influenciam a promoção da saúde das pessoas idosas e as oportunidades para que continuem sua aprendizagem ao longo da vida, além da participação na sociedade pela manutenção da convivência e da presença nas mais diversas instâncias; além da segurança cultural relacionada às identidades e às interações harmoniosas entre maiorias e minorias em ambientes multiculturais.

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A iniciativa de turismo 60+ faria frente ao desafio social colocado pelas visões negativas da velhice expressas em estereótipos, preconceitos e estigmas materializados em discriminação etária – o idadismo-, em um contexto de mudanças para visões positivas da velhice associadas às pessoas idosas ativas e saudáveis e a relações satisfatórias entre gerações (Birman, 2015; Elias, 2001; Monteiro, 2013; Parker, 2013; Dórea, 2020).

Destacamos que turismo 60+ gera ganhos para prestadores de serviços turísticos como dirigentes de hotel, pousada, hostel, apart-hotel, pontos turísticos e de ecoturismo, circuitos gastronômicos, trabalhadores do turismo, entre muitos outros. Incluindo integrantes da Embratur.

Box de Recomendações

1. Foco na convivência intergeracional
– Atenção à forma de tratar pessoas idosas: não se deve ter cerimônia excessiva nem intimidade.
– Tratamento sem preconceito e discriminação, sem uso de expressões como terceira idade, melhor idade, envelhescente.
– Respeito à preferência por não revelar idade de muitas pessoas 60+.
– Cuidado com os ‘estereótipos negativos’ que aparecem na infantilização da pessoa idosa pelo uso do diminutivo referindo a “sua comidinha, sua roupinha” e associam as pessoas 60+ à incapacidade e à infância.

2. Melhorias para a educação / informação de pessoas 60+
– Compreensão da diversidade nesse grupo etário e como lidar com a heterogeneidade. Todos querem viver mais anos, sem se sentir idosos.

3. Segurança na circulação por espaços internos e externos
– Estar alerta a objetos nos trechos de passagem das pessoas, evitando tapete dobrado; pedaços de piso ressaltado; algo no meio do caminho; pouca iluminação à noite; lugares mais escuros sem janelas; falta de corrimão e de apoios em banheiros.
– Condições físicas e requisitos quanto a visão, audição e cognição; gosto cultural.

4. Acessibilidade física interna e externa
– Vigilância quanto à necessidade de rampa ou de suavização de desníveis; à falta de sinalização em escadas e entradas/saídas; calçadas irregulares.

5. Acessibilidade sensorial e cognitiva
– Possibilidades de acesso às artes e à produção cultural sem barreiras causadas por perdas visuais e auditivas. Podem ser oferecidas modalidades de tradução audiovisual aplicadas a televisão, cinema, teatro, balé, espetáculos musicais, exposições de artes plásticas como: Audiodescrição – para pessoas cegas e com deficiência visual; e Legendagem – para surdos e ensurdecidos. Também recomenda-se o uso de letras grandes que permitam leitura sem dificuldade.

Referências
BIRMAN, Joel. Terceira idade, subjetivação e biopolítica. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.22, n.4, out.-dez. 2015.
BRASIL. Ministério da Saúde (MS). Política Nacional de Promoção da Saúde – PNaPS: revisão da Portaria MS/ GM nº 687, de 30 de março de 2006. Brasília: MS; 2014.
BRASIL. Ministério do Turismo. Dicas para atender bem turistas idosos. 2016.
BRASIL. Ministério do Turismo. Cartilha Viaja Mais Melhor Idade 2ª Edição. Brasília: Ministério do Turismo, 2013: http://www.viajamais.gov.br
BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei 10.282/2018 Altera a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), para dispor sobre o símbolo a ser utilizado para referência a direito do idoso
Camarano, A.A. et al. Como vivem os idosos brasileiros? In: Camarano, A.A.(Org.). In Os novos idosos brasileiros: muito além dos 60? Rio de Janeiro: Ipea, 2004, p. 25-75
DEBERT, G. G. 1999. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Edusp.
DÓREA, Egídio Lima. Idadismo: um mal universal pouco percebido. São Leopoldo, RS. Ed. Unisinos, 2020
FOLHA DE SÃO PAULO. Conceito de idoso ficou velho. 26.jun.2018.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.
IBGE – – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sinopse do censo demográfico 2010: população residente, por sexo e grupos de idade, segundo as Grandes Regiões e as Unidades da Federação em 2000 e 2010. Rio de Janeiro, 2010.
IBGE. – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional por amostra de domicílios contínua (PNAD Contínua). Rio de Janeiro: IBGE, 2016.
MONTEIRO, S e Villela, W. (orgs). Estigma e Saúde. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2013
OMT – Organização Mundial de Turismo. Relatório 2019. International Tourism Highlights. OMT, 2019.
PARKER, R.Interseções entre estigma, preconceito e discriminação na saúde pública mundial. In: Monteiro, S.; Villela, W. (org.). Estigma e Saúde. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2013.
SISAP-IDOSO Sistema de Indicadores de Saúde e Acompanhamento de Políticas do Idoso/ICICT/Fiocruz. Site https://sisapidoso.icict.fiocruz.br/
SCHEIN, M. et al. Revista Turismo Visão e Ação – Eletrônica, v. 11, nº 3, p. 341 – 357, set/dez. 2009: https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/rtva/article/viewFile/152/1398

Assinam:  Pesquisadores do Grupo de Pesquisa CNPq Gestão Social e Desenvolvimento Local (GESDEL) e  coordenação do Observatório Paraense da Longevidade.

Fotos: Alcides Freire Melo


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