A torto e a direito e a renegociação de dívidas dos estados com a União

A torto e a direito e a renegociação de dívidas dos estados com a União

A maior parte das dívidas, por má gestão, é de Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.


No dia 17/12/2024, a Agência Senado[1] noticiava que a renegociação das dívidas estatuais junto ao Governo Federal fora aprovada por unanimidade no Senado Federal e iria à sanção[2].

Em termos gerais, trata-se de dívidas estaduais que, “somam atualmente mais de R$ 765 bilhões — a maior parte, cerca de 90%, diz respeito a quatro estados: Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul”.

Evidentemente, o cenário da catástrofe climática que ocorreu recentemente no Rio Grande do Sul deve ser levada em consideração, assim como a responsabilização direta de agentes públicos que tenham sido incompetentes em suas funções preventivas a catástrofes climáticas. Entretanto, esta segunda parte não ocorreu, não é mesmo?

A matéria também destaca como funcionará novo aporte de dinheiro público, cuja parte sairá novamente do bolso de toda a população pagadora de tributos, de Norte a Sul, Leste a Oeste do país: “De acordo com o texto aprovado pelos senadores, será criado o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) para promover a revisão dos termos das dívidas dos estados e do Distrito Federal com a União. 

A proposta autoriza desconto nos juros, dá prazo de 30 anos para pagamento (360 parcelas), abre a possibilidade de os estados transferirem ativos para a União como parte do pagamento e cria exigências de investimento em educação, formação profissional, saneamento, habitação, enfrentamento das mudanças climáticas, transporte e segurança pública como contrapartida”. 

Durante o debate, alguns representantes dos estados no Senado Federal apontaram a má gestão pública que impactaram negativamente nas contas dos estados brasileiros endividados (mais uma vez).

Logo, há necessidade de, novamente, debater a responsabilização (que, inclusive, deveria ser criminal) de agentes públicos eleitores para gerir o dinheiro público e o fazem de maneira irresponsável. Não identifiquei que tenha ocorrido uma ampliação deste ponto do debate.

Na prática, o ambiente político-partidário brasileiro segue uma longa história secular (com passagens desde o período imperial) de que as responsabilizações dos maus governantes do dinheiro público dificilmente ocorrem. Os donos do poder[3] são, da mesma forma, donos do teatro das sombras[4]. Se por um lado a história nos serve para aprender com ela, praticar as correções de desvio, com a punição objetiva de maus gestores públicos brasileiros parece mais um livro disponível na estante de “ficção científica”.

Se por um lado é compreensível que a dívida pública também impacte nas políticas públicas das populações dos estados atendidos por novo benefício fiscal da União, afinal a população acaba sendo direta ou indiretamente impactada por tudo isto, por outro lado não se faz um debate ampliado sobre o tema. Como a necessidade de ajustes fiscais que impactem diretamente em políticas públicas às populações mais pobres.

Enquanto governadores e governadoras, deputadas e deputados estaduais, seguem com o apoio do dinheiro público para trabalhar em gabinetes climatizados, com mobília superconfortável e equipamentos de tecnologia de última geração, nada disto é visto quando o assunto é uma sala de aula em escolas públicas, ou então, nas unidades de saúde. Nelas, tanto a população atendida, como os profissionais que lá atuam, seguem com demandas históricas que ainda precisam de melhorias. Isto sem falar no abismo salarial entre agentes eleitos supracitados, para com a grande massa trabalhadora do país.

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Nesta linha de pensamento, aproveito recente postagem de Henrique Meirelles,  ex-secretário da Fazenda de SP, ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central. Já o citei aqui, tempos atrás. O vejo como um dos mais reconhecidos especialistas econômicos da história recente brasileira.

No último dia 23/12/2024, na rede social do Twitter, ele escreveu: “O BC vender reservas para conter uma alta desenfreada do dólar é apenas um paliativo, não a solução. O que acalmará o mercado e colocará as coisas no devido lugar é um conjunto de atitudes do governo para gastar menos e conter o aumento da dívida pública.” [5]

Destaco o trecho em que ele cita o governo gastar menos. Diferentemente deste seu pensamento, iria pela linha do governo gastar melhor (ou seja, potencializar os resultados sociais, econômicos, ambientais, urbanísticos e de governança).

Penso ser necessário refletir sobre o mantra de “gastar menos”. Eu prefiro o “gastar melhor”, comprovadamente melhor. Até porque na hora de cortar, usualmente priorizam cortar dos mais pobres em vez dos muito mais ricos. Da mesma forma, cortar dos que menos poder político tem, em vez de cortar dos que mais direitos políticos e superproteções estatais têm, como benesses tão peculiares da expressão popular a torto e direito.

Este desequilíbrio evidente na tomada de decisão governamental (e isto se observa, de maneira geral, respeitando-se exceções, às principais lideranças dos Três Poderes e ao Ministério Público em todo o país), escancara a necessidade de debater muito melhor o uso do dinheiro público, mas também, a responsabilização direta e objetiva quando do seu mau uso por quem é pago para garantir seu bom uso.

Tal reflexão me vem, entre tantas outras, depois de ler o artigo Vida Financeira dos Idosos: endividamento, aposentadoria e bem-estar financeiro[6], da Revista Longeviver, edição 24. A dor de muita gente está por aí, em todo o país, apesar de algumas minúsculas ilhas de bem-estar para alguns poderosos políticos.

Notas
[1] Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/12/17/renegociacao-de-dividas-dos-estados-com-a-uniao-vai-a-sancao
[2] Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/166531
[3] Sugiro ver https://www.companhiadasletras.com.br/livro/9786559210961/os-donos-do-poder?srsltid=AfmBOorQ79vnVuIm5RN9Pns_WPKZZ0OQdyw75Elj-8kEQboazXRcXBeE
[4] Sugiro ver https://www.record.com.br/produto/a-construcao-da-ordem-e-teatro-das-sombras/?srsltid=AfmBOor-E_BJnm99IckHjtKHK9H8-E3wO1EeT6k_a-h0DW3IiRm-jvk6
[5] Disponível em: https://x.com/meirelles/status/1871207434338885721
[6] Disponível em: https://revistalongeviver.com.br/index.php/revistaportal/article/view/8/8

Foto de Amin Alizadeh/pexels.


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Luiz Carlos Betenheuser Júnior

Graduação em Administração (UFPR); pós-graduação/especialização em Gestão Administrativa e Tributária (PUC-PR) e em Administração Pública pela Escola de Administração Pública (EAP / IMAP). É funcionário público municipal, 25 anos de experiência, sendo dois na área administrativa e os outros 23 anos na área financeira. Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração Pública, especialmente na área Financeira, na gestão orçamentária (execução, planejamento e controle social). Foi integrante do Conselho Consultivo do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba - IPPUC (2003); do Conselho Municipal de Assistência Social (2013 e 2014); Vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Curitiba (2015) e por duas vezes presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Curitiba (2014 e 2016); integrante do Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente de Curitiba (2017). Atualmente é coordenador financeiro da Secretaria Municipal de Administração e de Gestão de Pessoal e da Secretaria Municipal de Esporte, Lazer e Juventude.

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Graduação em Administração (UFPR); pós-graduação/especialização em Gestão Administrativa e Tributária (PUC-PR) e em Administração Pública pela Escola de Administração Pública (EAP / IMAP). É funcionário público municipal, 25 anos de experiência, sendo dois na área administrativa e os outros 23 anos na área financeira. Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração Pública, especialmente na área Financeira, na gestão orçamentária (execução, planejamento e controle social). Foi integrante do Conselho Consultivo do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba - IPPUC (2003); do Conselho Municipal de Assistência Social (2013 e 2014); Vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Curitiba (2015) e por duas vezes presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Curitiba (2014 e 2016); integrante do Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente de Curitiba (2017). Atualmente é coordenador financeiro da Secretaria Municipal de Administração e de Gestão de Pessoal e da Secretaria Municipal de Esporte, Lazer e Juventude.

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