Quem são os “outros”?

Quem são os “outros”?

A vergonha de Marcos para expressar dificuldades com sua sexualidade me marcou.


                                                                                            

-“Na última consulta eu até pensei em te perguntar isso, mas fiquei com vergonha!”

Foi assim que recebi de Marcos uma resposta para meu questionamento em nossa consulta, e após seu relato conversamos sobre dúvidas quanto a uma dificuldade de ereção, sobre sua falta de libido e pela ausência de ejaculação em suas relações sexuais.

Mas o que me marcou não foram as alterações e dificuldades relacionadas para a expressão de sua sexualidade. Foi sua vergonha em tratar do tema, algo que a partir de um caso particular assumo que possivelmente se relacione com uma grande maioria de pessoas idosas atendidas por profissionais de saúde.

Não é incomum relatos como esse ou até mesmo pessoas idosas que nunca são perguntadas sobre sua vida sexual em consultas de rotina. Em apontamentos que questionamos sobre quedas, distúrbios do humor ou da cognição e até mesmo sobre seu hábito intestinal, quase sempre a sexualidade passa longe de nossas bocas.

Por um lado, profissionais da saúde podem presumir que a sexualidade tenha prazo de validade e expire com o passar dos anos. Porém, também existem aqueles que até gostariam de tocar no assunto, mas sentem-se envergonhados ou pouco preparados.

Por outro, há a situação das pessoas idosas. Alguns, como Marcos, referem vergonha ou timidez para trazer questionamentos sobre uma temática ainda considerada tabu em nossa sociedade. Já outros podem acreditar que é muito mais importante falar do coração, do cérebro ou de outros órgãos, e que a sexualidade seria pouco importante frente outras demandas.

Pelo contrário, sexualidade faz parte de quem somos. É expressa em energias, em sentimentos, em toques, carinhos e até em sonhos e desejos. Além disso, não há como separar um Coração ou Pulmão de um ser vivo, com história, biografia e valores.

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Da mesma forma que não somos uma ilha isolada no mundo, nosso ser não é um conjunto de órgãos agrupados por músculos e cartilagens. E por tudo isso, sexualidade deve fazer parte de nossos questionamentos, não sendo mais ou menos importante que outras questões de saúde que enfrentamos ao longo da vida.

Por fim, retiro do dicionário a definição de “vergonha”: sentimento de insegurança causado por medo do ridículo e do julgamento dos outros; E com essa frase deixo nossa principal lição de casa: quem são esses “outros” que tanto nos julgam?

Eu, você, a sociedade ou nós mesmos? Vamos pensar nisso porque talvez existam mais dúvidas do que certezas, mas mesmo assim: há de se garantir que uma pessoa idosa se expresse sexualmente sem se achar ridícula ou julgada pelos “outros”.

Serviço
Podcast EnvelheSER caxt: https://www.youtube.com/@envelhesercaxt

Foto: Pexels


Milton Crenitte

Médico Geriatra, Doutor em ciências pela USP. Coordenador médico do ambulatório de sexualidade da pessoa idosa do HCFMUSP. Professor de curso de medicina da Universidade de São Caetano do Sul. Voluntário da ONG Eternamente SOU.

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Milton Crenitte

Médico Geriatra, Doutor em ciências pela USP. Coordenador médico do ambulatório de sexualidade da pessoa idosa do HCFMUSP. Professor de curso de medicina da Universidade de São Caetano do Sul. Voluntário da ONG Eternamente SOU.

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