O velho precisa manter o interesse pela vida e se livrar do pavor à morte. Difícil encontrar um velho que já não tenha batido na trave do final da existência. Muitos fazem coleções de stents, marca-passos, infecções, tumores amigos, ou não, e generosas cicatrizes cirúrgicas. O velho vive na prorrogação, mas a sorte é que fica sabendo disso quando de alta hospitalar.
Gabriel Novis *
Envelhecer é bom! Do alto dos meus oitenta anos, eu posso dizer que a vista aqui de cima é até bem bonita!
Após completar os tão esperados 80 anos, mesmo enfrentando uma crise aguda de pangastrite (inflamação total da mucosa do estômago), eu percebi que dá para acrescentar alguns anos àqueles já bem vividos. Claro, deve ter sido o meu lado psicossomático aflito com a proximidade da finitude.
A velhice não é lá essa coisa maravilhosa, porém, a alternativa aos longos anos vividos é bem pior… Oscar Niemeyer dizia que a velhice era uma merda, mas levou um bom tempo para sair dela – aos 105 anos. Alguns mitos atormentam os velhos, como o de nunca ter falhado com uma mulher. Pertencemos a uma geração extremamente machista, incapaz de confessar qualquer tipo de fracasso nesse setor. Para que desmentir?
Inventaram até um remédio para isso!
Se o fabricante do Viagra tivesse conversado antes com um velho, a nova droga teria como propaganda estimular a libido, além de promover a volta da potência. Claro, as vendas ainda seriam muito maiores caso as expectativas se comprovassem.
Meus contemporâneos, na sua quase totalidade, perderam o tesão e, não somente o sexual, mas, principalmente, o tesão pela vida. As pessoas vão se tornando apáticas, e logo os estímulos cerebrais que comandam todos os outros, vão se atrofiando na sequência. Não por acaso é sabido que na velhice as paixões, quando surgem, são muito mais violentas que as de jovens.
Outros da minha idade projetam seus apetites na gastronomia. Comem de doces a churrascos sem dó nem piedade, aumentando os seus diâmetros abdominais. Em compensação, ingerem trinta comprimidos de fármacos por dia e, inadvertidamente, creem que os mesmos vão curar todos os seus males, esquecendo-se assim dos graves efeitos colaterais presentes em todas as drogas.
O velho precisa manter o interesse pela vida e se livrar do pavor à morte. Difícil encontrar um velho que já não tenha batido na trave do final da existência. Muitos fazem coleções de stents, marca-passos, infecções, tumores amigos, ou não, e generosas cicatrizes cirúrgicas. O velho vive na prorrogação, mas a sorte é que fica sabendo disso quando de alta hospitalar.
O velho só percebe a sua velhice por meio de sinais externos. A maneira como as pessoas lidam com o idoso é diferente.
Não se iludam companheiros com os olhares e as conversas dos jovens! Muitas vezes eles querem dizer que você é a cara do seu avô, ou então, muito fofo… Não crie fantasias, elas são más companheiras! Tenho amigos que contrataram até “Personal Geriatra”. Aonde eles vão, o geriatra vai atrás.
Fé, companheiros! Pois já vivemos barbaridades! A vida pode ser bela em qualquer idade, basta um pouco de sorte e muita determinação!
* Gabriel Novis Neves é médico em Cuiabá, foi reitor da Universidade Federal de Mato Grosso. Fonte: MidiaNews – Credibilidade em tempo real. Disponível Aqui