As “classes” sociais que iniciaram a redução da base da pirâmide serão também aquelas que estarão na frente do processo de mudança da estrutura etária. Desta forma, o envelhecimento populacional brasileiro vai ocorrer com mais intensidade para os segmentos de maior renda e, com lapsos de tempo maiores para as camadas sociais de menor renda.
José Eustáquio Diniz Alves *
Todo país que passa pela transição demográfica experimenta uma mudança da estrutura etária.
Num primeiro momento a redução das taxas de mortalidade infantil aumenta a base da pirâmide de idade e sexo (homens no lado esquerdo e mulheres no lado direito). Isto aconteceu no Brasil entre 1950 e 1970.
Nas décadas seguintes, a queda da taxa de fecundidade reduziu a base da pirâmide e aumentou a parte central, onde estão as pessoas em idade de trabalhar. No longo prazo, a conjugação da queda da fecundidade com o aumento da esperança de vida tem feito crescer a população idosa, localizada no topo da pirâmide.
Portanto, o Brasil vem passando por uma transição da estrutura etária. Mas esta transição não ocorre de maneira uniforme entre as “classes” sociais. Considerando os diferentes níveis de renda, as mudanças na pirâmide populacional ocorrem de maneira diacrônica.
Como a transição da fecundidade foi liderada pelas camadas de maior poder aquisitivo e maiores níveis educacionais, a pirâmide da “classe” de maior posição de renda começou a mudar há mais de 50 anos. As classes médias seguiram o mesmo caminho com um certo lapso de tempo.
As “classes” sociais mais pobres, abarcando a população coberta pelo Programa Bolsa Família, iniciaram o processo de declínio da fecundidade com um certo atraso e só apresentaram uma redução da natalidade na primeira década do século XXI. Ou seja, na década passada, diminuiu o número absoluto de nascimentos de crianças morando em domicílios com renda per capita menor de R$ 70,00 (valor de 2010).
A redução da base da pirâmide é um fato positivo, pois com a mesma quantidade de recursos, o Estado brasileiro pode melhorar as condições de saúde e educação das crianças brasileiras. O Brasil tem vivido uma janela de oportunidade demográfica que começou favorecendo as camadas sociais de maior renda e educação. Agora a janela está aberta também para a população mais pobre.
As “classes” sociais que iniciaram a redução da base da pirâmide serão também aquelas que estarão na frente do processo de mudança da estrutura etária. Desta forma, o envelhecimento populacional brasileiro vai ocorrer com mais intensidade para os segmentos de maior renda e, com lapsos de tempo maiores para as camadas sociais de menor renda.
O envelhecimento também ocorre de forma diacrônica quando se consideram as populações em seus diferentes níveis de renda.
O Brasil não poderia desperdiçar esta situação favorável, pois considerando o conjunto da população, a razão de dependência demográfica voltará a crescer no quinquênio 2020-25. A crise econômica atual ameaça o bônus demográfico e os segmentos mais vulneráveis da populacão. O momento para erradicar a pobreza e avançar com os direitos de cidadania seria agora.
Infelizmente o ano de 2015 não tem trazido boas noticias. Porém, as vindouras gerações ficarão agradecidas se a péssima conjuntura atual for temporária e se o mercado de trabalho melhorar nos próximos anos, garantindo uma vida melhor no presente, condição para continuar melhorando no futuro.
* José Eustáquio Diniz Alves – Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. Membro da Rede de Colaboradores do Portal do Envelhecimento. E-mail: [email protected]