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Entrevista com Rosa Amarela – A espiritualidade, um poderoso recurso

Casal, ela de vestido branco e cabelos compridos e ele de camisa cinza com violão vermelho

A espiritualidade pode ser um guia que nos auxilia a encontrar equilíbrio e propósito em todos os momentos da vida.


O nosso trabalho é uma arte em defesa de um ato espiritual, de uma consciência, que vem contra todos os preconceitos.”
Pris Mariano

Em um mundo cada vez mais acelerado, a busca por significados e conexão com algo maior se torna uma ferramenta para chegarmos ao bem-estar humano. A espiritualidade, que não é sinônimo de religião, entendida como a busca por um sentido mais profundo da vida, tem sido reconhecida pela Organização Mundial de Saúde como um componente essencial para a saúde integral.

A busca pela espiritualidade pode acontecer de muitas maneiras: meditação, natureza, arte, relações, entre outras. Vale lembrar que é algo singular, ou seja, de cada um, assim como a escolha da religião. Respeitar essas escolhas de caminhos é respeitar a vida!

O duo Rosa Amarela, formado por Priscila (Pris) Mariano e Rodrigo Di Castro, traz majestosamente, em suas composições e nas vozes, a música ancestral brasileira com a missão de levar uma mensagem espiritual a quem os ouve.

Cada música e videoclipe é um convite à leveza, à alegria e à esperança, intimando a apreciar a natureza em sua grandiosidade. Uma criação genuína, feita a quatro mãos, da canção ao cenário.

Agradeço a oportunidade de ter conversado com o duo e do compartilhar de como a espiritualidade pode ser um guia constante, nos auxiliando a encontrar equilíbrio e propósito em todos os momentos da vida, valorizando culturas, a diversidade e o velho.

Silmara: A espiritualidade é uma conexão com o sagrado, em busca do sentido da vida, e que vai além do tangível. Para vocês, é claro um propósito de vida?
Rodrigo: Sim, existe um propósito de caminhada. A espiritualidade é como um guia que nos ajuda a evoluir e crescer como espírito. Nos ajuda a desvendar o que somos e para onde vamos. Uma conexão que nos motiva a sermos melhores para nós mesmos e para a sociedade.

Pris: Espiritualidade dá a vida, então, tudo se torna espiritualidade e nos serve como ferramenta para encontrar um propósito. O Rosa Amarela é um trabalho musical para além de uma nomenclatura religiosa. O propósito do nosso trabalho é despertar esse senso de integralidade, bem-estar, fé e o crescimento individual. Ele transcende as portas da religiosidade e vai para o que de fato traz a espiritualidade do todo, do ser, da vida acontecendo.

Em muitas de suas canções é mencionada uma força interna, como nos trechos: Chegando com a força do fogo. “A valentia de mil búfalos em uma mulher”, “Que eu sou filha do vento / E não me rendo, ao mal tempo”. Estudos indicam que o recurso espiritualidade auxilia no enfrentamento das adversidades da vida, promovendo resiliência e esperança em todas as idades. Teriam alguma experiência nesse sentido?
Pris: Essa manifestação de crença, coragem e entendimento tem sido real na vida a ponto de hoje ser traduzida em música? A gente passa todo dia por isso! [Risos]. Mas, sim, tivemos momentos na nossa história. Estamos casados há 22 anos e tivemos momentos que era Deus que guiava totalmente. – Não é Rodrigo? Em 2018 nossa filha teve uma crise de asma e ficou internada com risco de morte. Aquele foi um momento em que a força esteve presente com força. Noutro momento em que nós, como casal, decidimos dar um passo para a compra de uma casa, a fim de realmente construirmos a nossa família. A parte mecânica, materialista disso tudo veio junto e tivemos que ter coragem para seguir assim. Temos perdas e ganhos durante toda a vida e olharmos do ponto de vista espiritual como uma forma de força que nos impulsiona a passar por qualquer dificuldade, é o que nos fortalece como seres humanos e como casal. Isso é a fé presente!

Rodrigo: A espiritualidade nos ajuda dando esse impulso, mas a força de trabalho está na gente. Colocamos para manifestar a nossa fé. É um conjunto. A crença nos ajuda dando motivação, mas não esperamos cair do céu, fazemos a nossa parte. Não ficamos no campo da abstração esperando, trabalhamos sempre.

Ainda no mesmo tema, acompanharam algum velho que vocês tenham visto nele o recurso espiritualidade como um fator auxiliar para o bem-estar na saúde?
Pris: Sim, eu acompanhei a minha avó. Tive uma convivência muito próxima com ela, uma mulher de muita fé. Para entrar na casa dela você tinha que rezar e para sair você era rezado. A minha mãe também, um exemplo de entrega, de muita fé. Na nossa casa eu via sempre ela colocando o cafezinho para o Preto Velho, toda segunda. Praticava a reza do credo, o salmo 91 para sair de casa e na volta o 23. Isso sempre foi algo muito próximo da minha linguagem materna e familiar, ajudando muito diante de todas as dificuldades pelas quais minha mãe passou. Penso que foi pela fé que ela teve forças pra ficar por aqui o tempo que Deus destinou a ela. As duas sempre reagiram com superação e resiliência.

Como a espiritualidade modela a sua visão de estar no mundo e a da finitude?
Rodrigo: Isso é muito pessoal, no meu caso eu considero que a vida não acaba nunca. Numa visão de finitude, até onde a gente conhece, deixamos o nosso corpo aqui, dentro do que a ciência consegue comprovar. Contudo, o sentimento e o que o meu coração dita é diferente: não consigo me imaginar extinguindo a existência. Acredito que o nosso pensamento segue com a eternidade. Obviamente, com o envelhecimento, nossas forças físicas vão se esvaindo, mas no momento que a gente tem essa fé, encontramos outros valores que não dependem das nossas forças físicas, mas sim do nosso amor-próprio. Isso é desenvolvido de acordo com aquilo que a gente busca, não desistindo nunca. Por isso, não temo a morte, considero como uma passagem. Penso no hoje, no aqui e agora, e me pergunto: O que posso fazer hoje? Não precisa ser um grande feito como os filmes romantizam. Os pequenos gestos são também significantes. Dar um abraço ou regar uma flor são atitudes simples que nos ajudam a viver a vida com intensidade.

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Falando agora de religião, para vocês que são umbandistas, os velhos são sagrados: o preto-velho com a sabedoria; a velha benzedeira com a proteção; e os avós lembrados como ancestrais. Como essa valorização transforma o olhar sobre a velhice?
Pris
: Nas Casas de Axé de tradição de matriz africana e nas comunidades indígenas os mais velhos são ovacionados. Só pode se sentar para ensinar aquele que passou por todo o caminho para aprender. Ele é de profunda relevância. Nos terreiros, a gente pede bênção primeiro para o mais velho que esteja lá. Damos muito valor a essas pessoas que também deveriam ser valorizadas na vida ativa, não só nos segmentos religiosos. Nós dois somos suspeitos em falar, pois ontem mesmo estávamos recebendo em casa a Dona Percília, uma amiga de 84 anos. É uma delícia a companhia dela! Trabalha todos os dias vendendo paçoca no sinal, porque ama, sem necessidade financeira envolvida. Faz porque não gosta de ficar em casa e diz: – Não vou ficar em casa vendo paredes, filha. Muitas pessoas olham para o idoso como alguém inválido, que teria que ficar guardado. Pelo contrário, essa nossa amiga é prova e inspiração por ser ativa. Todos os dias sai de casa com sua bengala, animada para o trabalho.

Rodrigo: Todas as fases da vida precisam ser valorizadas.

Pris: Precisamos de políticas públicas para trazer o velho para a cena novamente. Me lembra muito aquele documentário Além do aposento. A pessoa se aposenta e faz o quê? Existe uma crítica da carteira assinada como exclusão do fim da vida, é sensacional!

Temos também a presença dos ciganos nas composições e nos videoclipes do duo Rosa Amarela. O velho nessa cultura, o ancião, é consultado em momentos mais importantes e até decide sobre os rumos da comunidade. Como essa relação com os ciganos afeta o seu caminhar?
Pris: Sim, os Barás, os mais velhos, são norteadores aos mais novos e são valorizados na comunidade. Nós temos mais contato com os ciganos astrais. Existem os ciganos de etnia, que são aqueles de sangue, que chegaram ao Brasil como refugiados ainda no processo do holocausto. Destes, temos poucos amigos. O Rodrigo gosta muito da cultura cigana, principalmente da parte musical. Isso influencia o nosso trabalho e a gente percebe que traz uma leveza, uma alegria.

Rodrigo, você conta que o nome Rosa Amarela veio de uma inspiração, uma rosa de seu jardim. A vida da rosa, assim como de todos os seres, depende de cuidados. Quais cuidados vocês asseguram como parte de um planejamento do envelhecimento saudável?
Rodrigo: O envelhecimento saudável está ligado à saúde mental e física, lembrando de uma boa alimentação e da atividade física. Acho muito importante se abster de alguns vícios, como a bebida e o cigarro. Quando somos jovens não nos damos conta, mas é na fase da velhice que vem a conta. Outro fator é a busca da felicidade nas ilusões e vícios plantados na sociedade com as falas de só sermos felizes condicionados àquilo que oferecem. A gente descobre que, na verdade, está na simplicidade, assim como você citou a rosa. Ela é linda  precisando somente de quê? De água, sol e terra. Não somos muito diferentes disso. Não precisamos inventar adornos para alimentar um sistema social. Manter uma vida focada no bem-estar é um bom planejamento para chegarmos bem à velhice.

O professor e historiador Leandro Karnal, na série Preconceitos: Você tem medo de quem?,  cita que a sociedade precisa caminhar para uma tolerância ativa, entendendo que a diversidade enriquece a convivência e que a diferença não é agressão, sendo o bárbaro aquele que exclui. Priscila, você cita que almeja que sua religião seja tão respeitada quanto as outras. Como o preconceito religioso lhe afetou em algum momento?
Pris: Afeta todos os dias. Por exemplo: no nosso trabalho a gente encontra dificuldade de espaços e de mídia que possam receber a nossa música, a poética do nosso trabalho. Tem pessoas que têm aversão a tudo que vem do culto de matriz africana. Do ponto de vista político, tudo que traz a palavra espiritualidade e religião é condenado. Compreendo a laicidade, mas nosso estado deixou de ser laico há muito tempo. Aqui no Rio de Janeiro, as bancadas contrárias tiram a nossa possibilidade de existência, liberdade intelectual, moral, e “colocam no nosso colo” um “demônio” que não é nosso. Usam isso como forma de fascínio e venda de facilidades. Um sistema que gera intolerância e falta de respeito. Socialmente temos uma tendência em classificar até dentro das próprias Casas de Axé: “Qual é a melhor?”; “Qual trabalho melhor representa o Axé?”. Isso enfraquece o coletivo e coloca uns contra os outros.

Rodrigo: Na umbanda a gente acredita numa tríade: Paz, Amor e Fraternidade. Quando se fala que usam da religião para praticar o mal, eu diria que não é religião, mas que estão usando de conhecimentos “magísticos”. E pegam um recorte, colocando todos na “mesma panela”. Por ignorância, desconhecem o que praticamos. Não existe religião ruim, mas sim, pessoas ignorantes, que ainda acreditamos que um dia irão despertar.

E como percebe esse preconceito religioso agindo de forma cumulativa ao sexismo e etarismo, no caso da mulher velha?
Pris: Eu acredito que esse preconceito é castrador, desde a fase da juventude até a velhice. É que quando se chega à velhice, a pessoa já está com muitas cascas, não percebendo tanto. Estamos vivendo uma consciência coletiva de que se não modificarmos esse paradigma violento, o que nos restará? Não precisamos competir e estarmos acima de ninguém. O nosso trabalho é uma arte em defesa de um ato espiritual, de uma consciência, que vem contra todos os preconceitos. A Dona Percília, que citamos anteriormente, é uma mulher, negra, de 84 anos, umbandista e que tem visão monocular. Ela se posta como protagonista, trabalha na rua e se sente cuidada. Tem família e amigos, boa parte deles são aqueles que trabalham nas ruas junto a ela. Para quem quiser conhecê-la, ela está no nosso clipe Porta do Cruzeiro. Não podemos aceitar outro lugar que não seja aquele que nos pertence por respeito e direito.

Rodrigo: Claro que ela poderá sofrer sim, pelo preconceito que o tempo todo chega a nós. Somos medidos pela religião, cor, classe social, detalhes físicos ou até pelo aparelho celular ou roupa que usamos. Mas… é como diz aquele pensamento: Se alguém chega até você com um presente, e você não o aceita, a quem pertence o presente?

Serviço
Duo Rosa Amarela
Canalhttp://www.youtube.com/@RosaAmarela 
Redes Sociais: @rosa8amarela

Fotos: divulgação do Rosa Amarela


Promoção válida até 06 de dezembro
Silmara Simmelink

Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: ssimmel@gmail.com

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