Entrevista com Jane & Herondy - Portal do Envelhecimento e Longeviver
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Entrevista com Jane & Herondy

O casal de cantores Jane & Herondy apontam que o humor deixa a vida mais leve.

Estamos envelhecendo com alegria, de forma natural.” (Jane)


Me apropriarei de uma das etapas do psicodrama, o compartilhar, para dizer aqui como saí do encontro que tive com o casal de cantores Jane & Herondy. 

Parafraseando J. L. Moreno, esse é um momento de trazer o que ressoou no coração, não no cérebro. Posso dizer que muitas coisas me afetaram durante nossa conversa, isso porque, após a entrevista, houve uma interação em que eles também tiveram curiosidades sobre mim, o que me levou a várias reflexões sobre minha própria vida. Acessar cenas importantes de minha existência, recheadas de humor e brincadeiras, me fez enxergar o quanto isso descontrai e deixa a vida mais leve.

Agradeço a eles por contribuírem no meu revisitar parte de minha história e por reforçarem meu ânimo.

Silmara: A Canção “Nosso Amor É Um Sonho” é a história da união de vocês que hoje já completa 54 anos. Com o refrão, “tempo vem, tempo vai…” o que o tempo trouxe para vocês?
Jane: O tempo reforçou a nossa filosofia de vida. Brincamos que a nossa cabeça é de pudim. Não podemos levar a vida a sério sempre. Claro que, com o tempo, fomos adquirindo experiência de vida. É clichê falarmos que o envelhecimento traz sabedoria, pois nem sempre é assim. Mas, no nosso caso, em alguns momentos instruímos nossas filhas sobre alguns caminhos parecidos pelos quais já passamos e que podem ser evitados por elas. No fim, cada um tem que experimentar seus próprios caminhos, e é nessa hora que ficamos discretos e temos esse entendimento.

E como o relacionamento se transformou com o envelhecimento?
J: A transformação foi a de que passamos a ser mais cuidadores um do outro. Mantemos o tratar com carinho e brincamos muito. Dias atrás, recebemos em nossa casa uma amiga de nossa filha que citou: “É muita alegria pra uma manhã só.” Nossos espíritos já se encontraram em outras vidas, pois combinamos em tudo.
Herondy: Somos assim o tempo todo!

Cientistas dos Estados Unidos em uma pesquisa¹ detectaram que a curva da felicidade tem dois picos, um na juventude e outro ao passar dos 50 anos, havendo uma urgência de ser feliz após essa idade. Isso representa as fases pelas quais vocês passaram?
J: Sim, quando vejo o Herondy assistindo um filme, pergunto onde ele gostaria de estar. E ele me responde:  “Aqui! Aqui mesmo!” Isso mostra um pouco de nossa felicidade.
H: Acho que isso acontece porque trabalhamos com a música. Temos facilidade de nos relacionar, trazendo a felicidade.
J: Sempre penso que vou morrer antes dele. Já em outro momento, penso: E se ele for primeiro? Não sabemos como serão as nossas reações. A gente até brincava que o ideal seria programar para morrer juntos, antes disso deixando as filhas avisadas que estaríamos felizes. Tirando a brincadeira, estamos abertos ao que Deus nos reserva.
H: No domingo, fomos fazer um show e o palco estava um breu. A nossa produtora nos guiou segurando pelo braço.

O segurar pelo braço foi recebido como um incômodo ou um acolhimento?
H: Fiquei preocupado em não errar o passo. De fato estava muito escuro e ela quis nos guiar. 

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Todas as composições do repertório J&H trazem o amor como protagonista. Já na sociedade, o amor e o sexo são classificados pelo imaginário social como algo a ser vivido na juventude, trazendo o preconceito de que na velhice essa é uma prática ausente. Qual é a visão de vocês?
J: O amor é pra todos e pra tudo! Quando termino de limpar a casa ou de cozinhar, percebo que apliquei o amor ali. Já sobre o sexo, acontece de acordo com cada corpo, a gente encara o envelhecimento natural. Me percebo com as rugas aumentando e o cabelo ficando mais ralo. Estou com 80 anos.
H: E eu estou com 78. 
J: Tive uma irmã, a Gracinha, que após seu divórcio, namorou até os 94 anos, inclusive encontrou um amor numa casa de repouso em que ela escolheu morar nos últimos anos de sua vida. Tinha um cérebro brilhante. Até o fim da vida declamava versos em francês. Acho que um ponto que a favorecia era o de viver rodeada de jovens enquanto lecionava línguas. 
Entendo que um fator que colabora para me deixar ativa é o uso da tecnologia. Faço até manipulação de fotos pelo Photoshop®. Fui enviar uma foto ao meu neto em que mostrava um anel que ganhei de presente dele, mas percebi que dois dedos ficaram ocultos pela roupa. Não hesitei em recriá-los pela ferramenta.[risos]

“Não se vá…” já tem 48 anos e é um grande sucesso até hoje, ultrapassando gerações. No aqui e agora, o que não querem que se vá?
J: Tudo na vida tem um fim e vai embora. Eu não queria que reduzissem a quantidade de cabelo, mas ele está indo embora, porque é algo da genética familiar. 
H: Pra mim, a vontade de comer. 

Em 1985, durante um acidente de carro que sofreram, o Herondy teve um traumatismo craniano e depois, em 2010, teve um AVC (acidente vascular cerebral). Esses acidentes afetaram por um tempo o físico, mas geralmente há também um abalo emocional, social, familiar e espiritual. Qual desses fatores vocês se lembram de terem sido abalados com mais destaque?
J: Com o acidente, o lado que ficou mais abalado foi o financeiro, pois para nós, que somos artistas, temos sempre que nos manter em evidência na mídia. Quando ele fraturou a bacia tivemos que aguardar o osso se reconstituir. Nessa época tivemos gastos grandes com equipamentos e cuidados hospitalares. Enquanto ficamos longe do trabalho, veio a chegada dos sertanejos. O que segurou Jane & Herondy foi o nosso casamento. Normalmente, quando um artista passa por uma fase como essa fica “pirado” e entra em depressão. De repente, quando veio o AVC, tivemos mais uma “puxada de tapete”. Estávamos em Aracaju iniciando um novo trabalho na rádio, o que nos levou a mudar para a cidade. Quando veio esse problema de saúde tivemos que voltar imediatamente para São Paulo. Para nós, foi como um balde de água fria. Um período difícil, estávamos perdendo a casa, necessitou de muitos remédios e terapias. Ele ficou sem falar e com problemas de memória. Essa volta para São Paulo foi uma condição diferente de vida, tendo que nos adaptar a moradia em um grande condomínio. Por fim, fomos “abraçados” pelas pessoas que aqui moram. 
H: A gente não reclamava e nem chorava. O otimismo foi o que nos sustentou! Agora estou ótimo.

Se pudessem voltar à juventude, teriam algum alerta para a Jane e o Herondy?
J: Eu diria para ser menos inocente. Analisar mais as situações, pois tivemos grandes perdas financeiras por confiar facilmente durante negociações.
H: Comer menos. Abusei da comida e engordei 22 kg. Isso tudo, acumulado com o colesterol e pressão altos, foi o que me levou ao quadro de AVC.
J: Ele se achava o “Super-homem”, tinha até o apelido de “Super”, porque fazia de tudo e comia de tudo. 

Nota
¹Jornal Estado de Minas – “Felicidade tem idade? Pesquisa revela a curva da felicidade”. Disponível em: https://www.em.com.br/app/colunistas/alessandra-aragao/2023/02/11/noticia-alessandra-aragao,1456026/felicidade-tem-idade-pesquisa-revela-a-curva-da-felicidade.shtml

Fotos: arquivos de divulgação da dupla.


Silmara Simmelink

Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: ssimmel@gmail.com

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