É possível reduzir os fatores de risco para demência?

É possível reduzir os fatores de risco para demência?

Promover a conscientização sobre a prevenção no enfrentamento da demência vai além do tratamento clínico.


Thais Bento Lima da Silva e Maria Antônia Antunes de Souza (*)

A demência, condição neurológica de caráter progressivo, compromete de maneira expressiva as funções cognitivas, comportamentais e funcionais das pessoas, afetando diretamente sua independência e qualidade de vida. À medida que a população envelhece, a prevalência dessa condição aumenta, tornando-se um desafio global de saúde. Nesse contexto, a ciência tem reiterado a relevância das estratégias preventivas para minimizar os fatores de risco ao longo da vida. Assim, promover hábitos de vida saudáveis, aliados ao desenvolvimento de políticas públicas de saúde, constitui uma abordagem central no enfrentamento da demência.

De acordo com o artigo “Dementia prevention, intervention, and care: 2024 report of the Lancet standing Commission” (Livingston et. al., 2024), muitos fatores de risco são modificáveis. Portanto, a adoção de práticas preventivas ao longo da vida tem o potencial de reduzir significativamente o risco de desenvolvimento da demência.

Embora a etiologia da doença seja multifatorial, com aspectos biológicos, ambientais e sociais envolvidos, a implementação de abordagens integradas, que incluam cuidados com a saúde física e mental, tem se mostrado eficaz. Nesse sentido, o relatório da Lancet Commission on Dementia Prevention, Intervention, and Care sugere que até 40% dos casos de demência poderiam ser prevenidos ou retardados por meio de intervenções adequadas.

Intervenções

Interrupção do tabagismo e a redução do consumo de álcool – Fatores como o tabagismo e o consumo excessivo de álcool estão diretamente relacionados ao aumento do risco de declínio cognitivo. A interrupção do tabagismo e a redução do consumo de álcool não só auxiliam na prevenção da demência, mas também favorecem a saúde cardiovascular, fundamental para a preservação das funções cerebrais.

Uso de aparelhos auditivos e a realização de exames regulares – Outro ponto importante é a saúde sensorial, particularmente a perda auditiva, que representa um fator de risco considerável. O uso de aparelhos auditivos e a realização de exames regulares são medidas simples, mas impactantes na preservação cognitiva. Por outro lado, a perda auditiva, quando não tratada, contribui para o isolamento social e acelera o declínio cognitivo.

Promover a prática de esportes seguros e implementar medidas de prevenção de quedas – Traumas cranianos graves, frequentemente decorrentes de quedas ou acidentes, estão associados a um aumento no risco de demência. Portanto, promover a prática de esportes seguros e implementar medidas de prevenção de quedas entre pessoas idosas torna-se essencial para a proteção da integridade cerebral.

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Garantir o acesso à educação e incentivar o aprendizado contínuo – A educação possui uma extrema importância na redução do risco de demência. A baixa escolaridade, especialmente a ausência de educação formal na infância, está fortemente associada à vulnerabilidade ao declínio cognitivo em idades avançadas. Dessa forma, garantir o acesso à educação e incentivar o aprendizado contínuo são estratégias fundamentais para a prevenção da demência.

Garantir um sono de qualidade – Além disso, a qualidade do sono merece atenção especial. Distúrbios do sono, como a insônia crônica, têm sido relacionados à deterioração das funções cerebrais. Portanto, garantir um sono de qualidade é essencial para a consolidação da memória e a regulação dos processos cognitivos, destacando-se como uma prática preventiva importante.

Políticas públicas que considerem as desigualdades socioeconômicas – No contexto das desigualdades sociais e econômicas, é relevante observar que muitos fatores de risco para demência estão associados às disparidades no acesso à educação e aos cuidados de saúde. No Brasil, as regiões mais pobres apresentam maior risco de demência devido a fatores como baixa escolaridade, hipertensão e perda auditiva (Suemoto et al., 2022). Políticas públicas que considerem essas disparidades regionais têm grande potencial para colaborar na prevenção da demência no país.

Promover a conscientização sobre a prevenção – Por fim, para os profissionais da saúde, assim como gerontólogos, promover a conscientização sobre a prevenção vai além do tratamento clínico. Envolve a educação da população, o desenvolvimento de políticas públicas eficazes e a garantia de que as intervenções preventivas alcancem todas as camadas da sociedade. Mesmo na ausência de uma cura definitiva, essas medidas colaboram para um envelhecimento mais saudável, promovendo o bem-estar e a autonomia das pessoas idosas.

Referências
Livingston, Gill et al. Dementia prevention, intervention, and care: 2024 report of the Lancet standing Commission. The Lancet, v. 404, n. 10452, p. 572-628, 2024.
Suemoto CK, Mukadam N, Brucki SM, Caramelli P, Nitrini R, Laks J, et al. Risk factors for dementia in Brazil: differences by region and race. Alzheimer’s & Dementia. 2023;19(5):1849–57. https://doi.org/10.1002/alz.12820.
Setembro é Hora de Agir. (2024). Campanha do Mês Mundial de Alzheimer. ABRAZ, São Paulo.

Foto: shutterstock

(*) Thais Bento Lima da Silva – Gerontóloga formada pela Universidade de São Paulo (USP). Mestra e Doutora em Ciências com ênfase em Neurologia Cognitiva e do Comportamento, pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Docente do curso de Bacharelado e de Pós-Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo. É parceira científica do Método Supera. Coordenadora do Grupo de Estudos em Treino Cognitivo da Universidade de São Paulo.
Maria Antônia Antunes de Souza – Bacharel em Gerontologia pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Foi bolsista de iniciação científica PUB do projeto: “Intervenções psicoeducativas para a COVID-19 aliada à estimulação cognitiva no programa USP 60 +”.  Atualmente é colaboradora do Grupo de Estudos em Treino Cognitivo da USP (GETCUSP), atuando na área de pesquisa em treino cognitivo de longa duração.


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