Dos “batateiros” às coxinhas

Que tal conhecer a história da deliciosa coxinha, que começa com os batateiros do Grande ABC Paulista, e de quebra, algumas receitas com batatas?


Você deve conhecer algumas pessoas com apelidos engraçados. Os apelidos são nomeações que expressam particularidades de alguma coisa. De acordo com os dicionários, a palavra apelido vem do latim apellare, “chamar alguém de ….”. Ainda podemos dizer qualificação ou titulação individualizada que aponta determinada característica peculiar de alguém ou de algo. O artigo de hoje trata justamente disso, do apelido dado a quem nasce em São Bernardo do Campo, município do Grande ABC da cidade de São Paulo, os “batateiros”, e como consequência, à história da nossa querida e famosa coxinha.

Para entendermos melhor, é preciso conhecer a história da cidade e de uma grande curiosidade para a cidade dos batateiros, nome dado antigamente para quem nascia em São Bernardo do Campo. Até hoje quem mora na cidade também é batateiro, sabe por quê?

Os batateiros

Essa expressão, segundo o Jornalista Ademir Medici, nasce da rivalidade futebolística com o time de Santo André, lá pelos anos 1920, para os imigrantes italianos que trabalhavam na lavoura e plantavam muita batata. Tinham rivalidade do time de futebol, particularmente do município vizinho, Santo André, “os ceboleiros” e, mais além, também entre os moradores do centro e os colonos, que começaram a se identificar mais com os apelidos.

Medici cita a personagem D. Benta, de Monteiro Lobato,obra infanto/juvenil do criador da boneca Emília. Segundo ele, no volume “O Minotauro”, há comentários com relação às batatas:

– A senhora falou em picadinho com batatas – disse a esposa de Péricles. – Que é batata?

– Um tubérculo, Dona Aspásia. O tubérculo duma planta da família das solanáceas, que foi o melhor presente da América aos europeus.

– E como é a batata? – Indagou Heródoto.

– Porque, sendo um tubérculo, fica enceleirado no solo, não exigindo colheita imediata, como as coisas que dão no ar e se não forem colhidas a tempo secam ou apodrecem. Depois do descobrimento da batata e de sua introdução na Europa, melhoraram muito as condições alimentares de certos países. A fome que periodicamente os assolava diminuiu.

– E como é a batata? – Quis saber Aspásia.

– A forma é irregular, mais ou menos arredondada. São uns tubérculos que se desenvolvem nas raízes da plantinha, revestidos duma película amarelada e muito ricos em fécula. Usamo-las cozidas em água, ou fritas.

– Há também a batata-doce – disse Narizinho -, e de duas qualidades, a amarela e a roxa. São maiores e bicudas…

Tudo aquilo eram tremendíssimas novidades para os gregos, que por muito tempo ficaram no assunto, a ouvir histórias de batatas fritas, batatas sautéespurées de batata, doce de batata – e até dos erros de língua que surgem na conversa e também recebem o nome de “batatas gramaticais”.

Aqui no Grande ABC SP, “a batata” ajudou as famílias a melhorarem seus cardápios diários, suas rendas com a venda de vários pratos preparados com batatas.

Batatas e coxinhas

Uma grande surpresa para mim – que sou pesquisadora junto aos alimentos e gastronomia – foi descobrir a origem da coxinha. Segundo os historiadores da alimentação, a coxinha foi criada durante a industrialização de São Paulo, para ser comercializada como um substituto mais barato e mais durável às tradicionais coxas de galinha que eram vendidas nas portas de fábricas.

Mas pesquisando um pouco mais, verifiquei registros no século XIX que documentam a história da princesa Isabel, pois seu filho adorava comer coxas de frango empanadas e fritas, daí que as pessoas passaram também a comer a receita do reino.

A primeira publicação que menciona coxinha aparece no livro do chef francês Marie-Antonie Carême, conhecido como o “rei dos chefs e chef dos reis” com a publicação em 1844, croquete de poulet”, um croquete de coxa de frango, moldado em forma de pera”.

A coxinha é muito popular no Brasil. Ela se popularizou no século passado, quando era vendida nas proximidades de fábricas para os funcionários consumirem. Ela era preparada com batatas e tinha seu custo benefício menor que só com frango e também podia ser preparada e armazenada por mais tempo com preço mais acessível.

Até hoje a receita sofre transformações e adequações com relação a recheios, tamanhos e tipos de preparos.

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Num trabalho voluntário, de oficinas educativas, com entidade do município de São Bernardo do Campo onde moro, mensalmente dou aula para mães e crianças carentes, sempre com o objetivo principal de “educar com alimentos” num trabalho de Oficina memória – história – família – cidadania – alimento – arte culinária e gastronomia.

As oficinas objetivam valorizar o ato de cozinhar e sua historia; resgatar receitas e técnicas de preparo para o salgado tradicional e conhecido nacional e mundial; valorizar os alimentos e as técnicas antigas de preparo com sua história; vivenciar e resgatar ingredientes através dos 5 sentidos: tato, olfato, visão, audição e paladar; conhecer a história do município de São Bernardo do Campo; consciência e respeito aos alimentos; e saber de onde vem o alimento, respeito a quem plantou e colheu o alimento bom, limpo e justo, na perspectiva  Slow Food.

No mês de agosto, aniversário do município, resgatamos a história de São Bernardo do Campo, e nos deparamos com os batateiros e as coxinhas. Na última oficina os participantes manusearam e sentiram uma variedade de batatas e suas técnicas de preparo e sugestões gastronômicas. Tocaram, cheiraram, provaram, prepararam, degustaram e comentaram sensações percebidas. Também aprenderam que a história que vivenciaram foi a grande chave do aprendizado em aula; refletiram sobre a frase “sou batateira com orgulho”, depois de conhecer a história de um simples salgado que traz tantos saberes; e aprenderam novas receitas, vamos a elas?

Receitas com batatas  

Coxinha cremosa de batatas

Ingredientes da Massa
– 300 Ml de caldo de frango
– 200ml de leite
– 300 G de farinha de trigo
– 500g batatas cozidas e amassadas
– 50g (2 Colheres de sopa de manteiga)
– Sal a gosto
– 300g ou 1 Peito de frango cozido, desfiado e temperado a gosto (alho, cebola, salsa, azeitonas verdes, pimenta)
– 1 Clara (para empanar)
– 300g de farinha de rosca (para empanar)
– Óleo para fritar

Obs.: Em caso de restrição à lactose utilize leite de soja ou de arroz e margarina vegetal e não manteiga.

Modo de Preparo
– Em uma panela, coloque o leite e o caldo do frango, leve ao fogo por aproximadamente 3 minutos.
– Acrescente a batata espremida, a manteiga, o sal e bata bem.
– Volte ao fogo, mexendo com frequência
– Quando ferver, adicione a farinha de trigo toda de uma vez mexendo rapidamente até virar uma massa de coxinha homogênea e que desgrude do fundo da panela.
– Coloque a massa sobre uma mesa   e sove-a bem., até ficar bem lisa e macia.
– Modele as coxinhas e recheie com o peito de frango bem temperado.
– Passe as coxinhas na clara de ovos e na farinha de rosca ou farinha panko
– Frite em uma panela pequena ou média (funda) e com óleo bem quente.
– Escorra em papel toalha e sirva quente.

Doce de Batata Roxa  

A Batata Doce roxa normalmente é mais doce do que a batata branca, assim como também mais suculenta. São poderosas fontes nutricionais como fibras, sais minerais e vitaminas do complexo B, C e D. E pensando em calorias, contém a cada 100g de 90 a 95 kcal, a roxa mais calórica, lógico!

Doce de Batata marca a história brasileira, amada e surpreendente sempre!

Ingredientes
– 1kg de batata doce roxa ou clara de sua preferência, cozida e espremida.
– 1 xícara de chá de agua ou suco de maçã
– 1/2 xícara de chá de açúcar
– 1 colher de sopa de manteiga
– 3 gotas de essência de baunilha

Opcional: 1 pitada de canela em pó

Modo de preparo
– Em uma panela coloque a agua e o açúcar deixe ferver por 3 minutos
– Junte a batata doce espremida e a manteiga
– Mexa até soltar da panela, finalize colocando a essência de baunilha e misture bem.  
– Espere esfriar e sirva.
– Se quiser preparar como doce de corte, deixe apurar bem firme no fogo (soltar da panela) despeje em uma forma untada com manteiga. Deixe secar e corte como desejar (com cortadores de diversos tipos).
– Conserve em recipiente fechados.

Referências
Etimologia da palavra apelido
Conceitos.com https://conceitos.com/apelido/
Dicionário -Definições de Oxford Languages
LOBATO, Monteiro – O Minotauro – Maravilhosas aventuras dos netos de Dona Benta na Grécia antiga.
MEDICI, Ademir. Memória. Diário do Grande Abc

Fotos: arquivo pessoal


https://edicoes.portaldoenvelhecimento.com.br/produto/oficina-de-narrativas/

Ana Maria Ruiz Tomazoni

Ana Maria Ruiz Tomazoni - Doutora em Educação (PUC-SP), Mestre em Gerontologia Social (PUC-SP) e Pós-Graduada em Hotelaria e Eventos pelo Senac SP. É fundadora e Diretora Pedagógica da Escola de Gastronomia Sabor & Saber. Atua como docente, educadora alimentar, pesquisadora, escritora e palestrante. É avó de 7 netos e uma eterna aprendiz. E-mail: [email protected]. Site: www.saboresabergastronomia.com.br. Facebook Sabor & Saber Gastronomia. Instagram: saboresabergastronomia

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Ana Maria Ruiz Tomazoni

Ana Maria Ruiz Tomazoni - Doutora em Educação (PUC-SP), Mestre em Gerontologia Social (PUC-SP) e Pós-Graduada em Hotelaria e Eventos pelo Senac SP. É fundadora e Diretora Pedagógica da Escola de Gastronomia Sabor & Saber. Atua como docente, educadora alimentar, pesquisadora, escritora e palestrante. É avó de 7 netos e uma eterna aprendiz. E-mail: [email protected]. Site: www.saboresabergastronomia.com.br. Facebook Sabor & Saber Gastronomia. Instagram: saboresabergastronomia

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