Enquanto as memórias nos ajudam a lembrar de coisas que encontramos ou pensamos antes, os estudos de memorização perguntam: Por que nos lembramos do que lembramos? Por que esquecemos o que esquecemos?
A memória é uma fonte de mistérios científicos, mas também de mistérios pessoais. Todo dia, vemos e presenciamos coisas das quais vamos nos esquecer. O que se mantém, de certa forma, vira parte da nossa consciência, e nos ajuda a contar a história da nossa vida. (Wilma Bainbridge)
Por que nos lembramos de algumas coisas, e de outras não? O que torna um acontecimento, pessoa, imagem, som ou cheiro memorável? Entender como o cérebro humano guarda determinadas memórias, ou como funciona a “memorabilidade”, ainda é um desafio para a ciência. Reportagem do Vox traz uma conversa com pesquisadores que tentam desvendar esses mistérios: por que algumas imagens aparentemente nada marcantes, quando mostradas para diferentes pessoas, são mais lembradas do que outras? Quanto a capacidade de memória depende do indivíduo e quanto do objeto em questão?
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Responder a essas questões pode ter aplicações práticas das mais nobres (como ajudar pessoas com Alzheimer) a questionáveis (saber o que realmente gruda na cabeça das pessoas pode levar a uma corrida ainda mais agressiva de marcas por espaço no nosso cérebro), e também pode nos ajudar a entender melhor o que nos torna humanos. “A memória é uma fonte de mistérios científicos, mas também de mistérios pessoais. Todo dia, vemos e presenciamos coisas das quais vamos nos esquecer. O que se mantém, de certa forma, vira parte da nossa consciência, e nos ajuda a contar a história da nossa vida”, diz a neurocientista Wilma Bainbridge.
Mas não só. Parece que a memória também é importante na hora da partida. É o que o filme francês Prata-Viva (2019), com roteiro de Stéphane Batut, Christine Dory e Frédéric Videau trata. Pois além de aproximar diversas formas de exclusão: o racismo, a xenofobia, a pobreza, também nos aproxima da morte. Juste (Thimotée Robart), ator principal, faz o papel de um ser invisível que ajuda os mortos a encontrar lembranças para, assim, fazer a transferência dos novos fantasmas a um plano superior. Sem lembranças os fantasmas ficam à deriva, perambulando por aí.
Memorabilidade
A pergunta que fica é: quais memórias se tornam lembranças? A reportagem do Vox traz a neurocientista cognitiva Wilma Bainbridge, da Universidade de Chicago, que “brinca” com memórias, ao mostrar para Brian Resnick, autor da reportagem, imagens cotidianas a fim de adivinhar quais ele iria lembrar. Segundo a neurocientista, para cada par de imagens mostrada uma delas seria mais provável de ficar na mente do repórter. Na realidade, Bainbridge não estava perguntando sobre a sua memória, mas sobre memorabilidade.
Resnick também quer saber por que algumas imagens são inerentemente mais propensas a serem lembradas do que outras. Descobriu que após diversos estudos os pesquisadores descobriram que algumas imagens deixam uma impressão muito mais duradoura. Mas desconhecem o que esteja influenciando a memorização das imagens. Foi o que aconteceu com Resnick, as imagens que ele escolheu não eram memoráveis, pois 30% das pessoas pesquisadas, como ele, se lembraram justamente das imagens que ele não havia escolhido. São imagens que não têm explicações simples para que uma seja mais memorável do que outra.
Resnick verificou que imagens com pessoas tendem a ser mais memoráveis do que imagens de uma paisagem em branco, e que nos lembramos melhor de fotos mais brilhantes com maior contraste. Os cientistas tendem a apontar um conjunto de atributos que determinam o que torna algo memorável, o que inclui coisas como categorias de objetos, funções, cores e texturas.
Brian Resnick escreve que enquanto a memória é o que nos ajuda a lembrar de coisas que encontramos ou pensamos antes, os estudos de memorização perguntam: Por que nos lembramos do que lembramos? Por que esquecemos o que esquecemos? E ele mesmo responde: A memória ainda paira como um grande mistério na ciência. Nenhum cientista tem certeza absoluta de como o cérebro classifica e armazena fisicamente todas as informações – e todos os tipos de informações – que são codificadas em memórias. Mas os psicólogos cognitivos esperam que ao se perguntar o que lembramos, se comece a ensinar os cientistas como lembramos.
O repórter escreve ainda que para a psicologia a memória é um grande tópico. É uma palavra, mas significa muitas coisas diferentes que nossos cérebros podem fazer. Diz ele, “você pode usar a memória de trabalho para manter alguns dígitos na cabeça enquanto desbloqueia um teclado; memória episódica para recordar uma viagem escolar à feira estadual de quando você tinha 10 anos; memória sensorial para evocar os cheiros dos bolos. Você pode se lembrar de fatos históricos; você pode se lembrar das instruções de como chegar ao local…”
Referências
RESNICK, Brian. Why do we remember what we remember? Disponível em: https://www.vox.com/the-highlight/22716264/memory-science-memorability
ISOLA, Phillip; XIAO, Jianxiong; TORRALBA, Antonio; e LVA, Aude. What makes an image memorable? Disponível em: http://web.mit.edu/phillipi/www/publications/WhatMakesAnImageMemorable.pdf
Foto destaque de Askar Abayev/Pexels