Será que vai haver um estancamento da esperança de vida nos países desenvolvidos? Ainda é cedo para fazer qualquer estimativa mais conclusiva, mas a estagnação econômica que abala os Estados Unidos e a Europa pode funcionar como um freio ao constante aumento da esperança de vida. Já nos países em desenvolvimento, as projeções indicam a continuidade do aumento da expectativa média de vida, mas, provavelmente, em ritmo mais lento.
José Eustáquio Diniz Alves (*)
“Ninguém quer morrer. Ainda assim, a morte é o destino que todos nós compartilhamos. Ninguém nunca conseguiu escapar. E assim deve ser, porque a morte é muito provavelmente a principal invenção da vida. É o agente de mudança da vida”. Com essas palavras Steve Jobs saudou os formandos da Universidade de Stanford, em 2005.
A despeito da inevitabilidade da morte, a luta contra a mortalidade precoce já teve vitórias espetaculares. A esperança de vida da humanidade mais que dobrou no século XX (passando de 30 para 65 anos), fato que nunca tinha acontecido no passado e, provavelmente, nunca vá acontecer no futuro. A Divisão de População da ONU estima que a esperança de vida ao nascer da população mundial esteja em 70 anos no quinquênio 2010-15 e deva chegar a 82 anos em 2100. Mas a esperança de vida é uma média que considera a história de vida de todos os indivíduos em um determinado período de tempo. Algumas pessoas morrem cedo e outras conseguem ir até idades bem avançadas, como os onze supercentenários que viveram entre 116 e 122 anos.
Existe uma corrente de pesquisadores que considera que o ser humano vai conseguir adiar a morte e vai haver um aumento da longevidade dos indivíduos. O biomédico inglês, Aubrey de Grey, disse que já nasceu a pessoa que vai chegar aos 150 anos de idade, superando em muito o recorde da francesa Jeanne Calment que viveu 122 anos e 164 dias. Evidentemente, este tipo de afirmação poderá estar sujeito à comprovação até o ano 2160. Porém, mesmo que esta afirmação se descubra verdadeira em menor espaço de tempo, o aumento da longevidade de uma ou algumas pessoas não significa o aumento da esperança de vida média da população mundial. Como vimos, a previsão média da ONU é de uma esperança de vida ao nascer da população mundial de 82 anos em 2100.
Embora muitas pessoas devam ultrapassar os 100 anos e algumas possam ultrapassar os 122 anos, que é o recorde mundial conhecido e registrado, existem alguns indícios de que não vai ser fácil aumentar a esperança de vida. A crise econômica e ambiental que deve se aprofundar nas próximas décadas tende a estagnar os ganhos de sobrevida.
O exemplo da Rússia serve de alerta, pois a esperança de vida estava em 69 anos em 1985-90 e caiu para 65 anos no quinquênio 2000-2005. Reportagem de 12 de dezembro de 2011 da revista Der Spiegel mostra que a esperança de vida nas parcelas de baixa renda da população alemã caiu de 77,5 anos, em 2001, para 75,5 anos em 2010. No lado oriental, a queda foi maior, de 77,9 anos para 74,1 no mesmo período. No Japão, o tsunami de 2011 e o aumento do número de suicídios entre idosos fez a esperança de vida cair ligeiramente em 2012.
Dados do projeto OSPI-EUROPE, mostram que a taxa de suicídios de Portugal foi de 10,3 por 100.000 habitantes, superior à de quaisquer outras mortes violentas no país. De fato, Portugal é o terceiro país da Europa onde o suicídio mais cresceu nos últimos 15 anos, estimando-se que morram mais de cinco pessoas por dia.
O jornal The Guardian, em matéria de 18 de dezembro de 2011, mostrou que o número de suicídios na Grécia, que era um dos mais baixos do continente (2,8 por 100 mil habitantes) dobrou entre janeiro e maio de 2011, em relação ao mesmo período de 2012. Também aumentou a violência cotidiana na medida em que cresciam o desemprego e as taxas de pobreza. Por fim, existem notícias de pessoas passando fome na Grécia, mas nada comparado com o que ocorreu no inverno de 1941-42, quando mais 300 mil pessoas morreram de fome no país, que vivia então sob ocupação nazista. Enfim, a crise econômica tende a aumentar as taxas de mortalidade e morbidade, embora não haja um perigo iminente de redução drástica da esperança de vida.
Será que vai haver um estancamento da esperança de vida nos países desenvolvidos? Ainda é cedo para fazer qualquer estimativa mais conclusiva, mas a estagnação econômica que abala os Estados Unidos e a Europa pode funcionar como um freio ao constante aumento da esperança de vida. Já nos países em desenvolvimento, que estavam apresentando maiores taxas de crescimento econômico e possuem maiores espaços para diminuir a mortalidade infantil, as projeções indicam a continuidade do aumento da expectativa média de vida, mas, provavelmente, em ritmo mais lento.
Para o mundo como um todo ainda não há como fazer previsões mais precisas quanto aos efeitos da crise econômica e até das mudança climáticas sobre o processo de redução das taxas de mortalidade e o prolongamento médio dos anos de vida. Mas é possível haver um cenário em que haja aumento da longevidade (pelo menos de uma parcela da população global ou regional) com estancamento da esperança de vida ao nascer. É importante acompanhar o que acontecerá no Brasil e no mundo nos próximos anos, pois pode haver novidade no quadro internacional da transição da mortalidade e na composição do grupo etário do topo da pirâmide populacional.
(*)José Eustáquio Diniz Alves – Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Membro da rede de Colaboradores do Portal do Envelhecimento. Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: [email protected]