Pesquisa aponta que o judô e o aikido favorecem a recuperação do tônus muscular e ainda ensinam praticantes a cair. O estudo desenvolvido pelo professor Eduardo Hebling concluiu que os praticantes seniores de artes marciais apresentam menores riscos de queda, uma das principais causas de invalidez e morte em pessoas acima dos 65 anos. “Isso acontece porque esse tipo de treinamento favorece a recuperação do tônus muscular e ainda ensina o idoso a cair”, explica o docente.
Manuel Alves Filho * Fotos: IJF/G. Sabu César Maia
A prática de atividades físicas é recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como fator fundamental para a manutenção da saúde e melhoria da qualidade de vida em todas as idades. No caso dos idosos, esse cuidado é ainda mais importante, pois contribui para aumentar o tônus muscular, perdido gradualmente por causa do processo de envelhecimento. Pesquisa desenvolvida pelo professor Eduardo Hebling, do Departamento de Odontologia Social da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), unidade de ensino e pesquisa vinculada à Unicamp, concluiu que os praticantes seniores de artes marciais apresentam menores riscos de queda, uma das principais causas de invalidez e morte em pessoas acima dos 65 anos. “Isso acontece porque esse tipo de treinamento favorece a recuperação do tônus muscular e ainda ensina o idoso a cair”, explica o docente.
O estudo conduzido por Hebling foi de caráter qualitativo e se concentrou em duas artes marciais, uma competitiva (judô) e outra não competitiva (aikido). A aderência, ou seja, a manutenção da atividade física por longo prazo, foi avaliada nesses grupos. Foram entrevistados 12 adeptos de cada arte marcial, frequentadores de academias da cidade de São Paulo. “No caso do aikido, os entrevistados o praticavam, em média, há 37 anos. No do judô, há 51 anos”, informa o pesquisador. Um dado curioso é que todos os entrevistados eram homens. A explicação, conforme o autor da pesquisa, é que o judô foi introduzido no Brasil na década de 1940 e o aikido, na de 1970. “Naqueles períodos, a sociedade via esse tipo de atividade como algo exclusivo do universo masculino. Por isso é mais difícil encontrar mulheres idosas que pratiquem essas artes marciais”.
O principal objetivo da pesquisa, continua Hebling, foi identificar as razões que fizeram com que os idosos permanecessem praticando essas atividades físicas por tanto tempo. Entre as respostas dadas pelos entrevistados, destaque para os benefícios que os exercícios trazem para a saúde, mas também para a questão do favorecimento à socialização. “As duas artes marciais consideradas no estudo são originárias de países orientais, onde a figura do idoso é reverenciada. Nesses países, o velho não é visto como um fardo, mas sim como uma reserva de conhecimento que precisa ser valorizada. Dessa forma, esses praticantes de judô e aikido disseram que se sentem respeitados no ambiente do esporte. Além disso, eles também revelaram que não abandonam a atividade porque se veem na obrigação de repassar o conhecimento adquirido ao longo de décadas às novas gerações”, relata o docente da FOP.
A combinação entre ganho de saúde e integração social proporcionada pela prática das artes marciais é importantíssima para a ampliação da qualidade de vida dos idosos, de acordo com Hebling. Os exercícios físicos presentes nessas atividades contribuem para aumentar o tônus muscular, que é perdido progressivamente conforme a idade avança. Tal perda, observa o docente, interfere no equilíbrio da pessoa e faz com que ela sinta uma sensação de fraqueza. Esses fatores, somados a outros, favorecem a ocorrência de quedas, que por sua vez trazem consequências graves aos idosos.
Dados do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), órgão do Ministério da Saúde, estimam que de cada três indivíduos com mais de 65 anos, um é vítima de queda. Além disso, de cada 20 pessoas que sofrem quedas, uma é alvo de fratura que requer internação. Ademais, 40% dos que têm 80 anos ou mais caem ao menos uma vez a cada ano. “As consequências dessas quedas são variadas, sendo que boa parte delas é muito séria. Infelizmente, muitos casos evoluem para a invalidez e até mesmo a morte das vítimas. Um bom modo de prevenir esses casos, que trazem sofrimento ao paciente e grande custo social ao país, é estimular a prática de atividades físicas pela população em geral e pelos idosos em particular”, afirma Hebling.
Quanto à integração social propiciada pela prática das artes marciais, acrescenta o pesquisador, ela também é importante, pois ajuda na preservação da saúde mental. “Diversas pesquisas indicam que pessoas que mantêm fortes vínculos familiares e de amizade são mais felizes e por isso adoecem menos. No caso dos idosos, esse aspecto é ainda mais significativo, pois nesse período da vida as pessoas frequentemente se queixam da falta de atenção e afeto”, diz o autor da pesquisa. Outro ponto positivo a ser destacado, segundo Hebling, é o benefício que as atividades físicas trazem para a saúde de modo geral.
Pesquisas científicas também comprovam que o sedentarismo é uma das principais causas da obesidade, fator que está associado a uma série de doenças, como a hipertensão, o diabetes e enfermidades cardiovasculares. “Nos Estados Unidos, para ficar em um único exemplo, 12% das mortes são atribuídas à falta de exercícios físicos. Acredito que esse índice possa ser projetado para o resto do mundo, com algumas raras exceções”, infere o docente da FOP. A expectativa de Hebling é de que os resultados de sua pesquisa contribuam para a formulação de políticas públicas que estimulem a população a praticar regularmente atividades físicas, notadamente o segmento acima dos 65 anos.
Segundo o pesquisador, ações desse tipo são indispensáveis à preservação da saúde e da qualidade de vida da população brasileira, que vem passando por um rápido processo de envelhecimento. “Nos países desenvolvidos, esse envelhecimento populacional ocorreu de forma lenta. Nas nações em desenvolvimento, como o Brasil, o processo está sendo mais acelerado. Entretanto, ainda não temos políticas públicas que foquem o bem-estar de nossos cidadãos no futuro muito próximo. Ou seja, se quisermos ter idosos saudáveis e com boa qualidade de vida daqui a 15 ou 20 anos, o momento de estabelecer as condições para que isso aconteça é agora”, defende Hebling.
Prevenção
De acordo com o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), órgão do Ministério da Saúde, pesquisas científicas demonstram que exercícios com duração de dez semanas a nove meses já são suficientes para reduzir em 10% a probabilidade de queda entre os idosos. Além disso, treinamentos específicos para equilíbrio diminuem em até 25% o número de quedas. Já a prática do tai chi chuan, outra modalidade de arte marcial, reduz a possibilidade desse tipo de acidente em 37%.
Entre os fatores intrínsecos relacionados às quedas de idosos, conforme o Into, estão: perda da força muscular, osteoporose, anormalidades para caminhar, arritmia cardíaca, alteração da pressão arterial, depressão, senilidade, artrose e alterações neurológicas. Já entre os fatores extrínsecos surgem a deficiência de iluminação de ambientes, cômodos mal projetados, disposição inadequada de móveis e uso inapropriado de tapetes.
* Manuel Alves Filho, Jornal da Unicamp, 10 de outubro de 2014 a 19 de outubro de 2014 – ANO 2014 – Nº 610. Disponível Aqui