Viúva argentina dorme em pequeno mausoléu com seu esposo falecido: “Quando você ama alguém, você faz todos os tipos de coisas”

Atualmente circula de tudo pela internet; desde pesquisas festejadas por cientistas, intelectuais e a mídia em geral até aquelas matérias sobre dicas infalíveis e milagrosas que mudarão sua vida. Entre estes extremos literários encontramos no final de junho uma notícia que conta a história (breve) de uma viúva argentina que dorme com o marido falecido, dentro de mausoléu, para lhe fazer companhia.

 

 

viuva-argentina-dorme-em-pequeno-mausoleu-com-seu-esposo-falecidoNem precisamos dizer que fatos como esse causam uma comoção geral, seja pela avaliação crítica de cada um, repleta de julgamentos, frases feitas e “psicologismos”, seja pela tendência imediata de sempre zombar daquilo que lhe parece diferente e mórbido.

Sabemos que nascer e morrer fazem parte do processo de vida de qualquer ser humano. Entretanto, o autor Combinato (2006) argumenta: “o ser humano caracteriza-se também e, principalmente, pelos aspectos simbólicos, ou seja, pelo significado ou pelos valores que ele imprime às coisas. Por isso, o significado da morte varia necessariamente no decorrer da história e entre as diferentes culturas humanas. Para o homem ocidental moderno, a morte passou a ser sinônimo de fracasso, impotência e vergonha. Tenta-se vencê-la a qualquer custo e, quando tal êxito não é atingido, ela é escondida e negada”.

É como se a morte precisasse ser negada e rechaçada a todo o momento, do contrário, a simples menção de sua existência, a torna real, com forma e contorno. Com isso, há que escondê-la, driblá-la ou simplesmente zombar, tamanho é o pavor de sua aproximação.

Mas a viúva da notícia ousou ir além e tomou a morte de seu marido como companhia. Assim começa a matéria: “Algumas pessoas têm maneiras estranhas de honrar seus entes queridos após fazerem ‘a passagem’. Adriana Villarreal, viúva de um argentino, dorme em um pequeno mausoléu com seu esposo falecido. A senhora possui 43 anos e vive em Buenos Aires”.

E não poderia ser de outra maneira, como conta o website ‘Jornal Ciência’: “a história ganhou as manchetes dos principais veículos de comunicação da Argentina depois de sua confissão de que passa algumas noites do ano com meu marido”.

Tanto foi o espanto e indignação que o “bizarro” acontecimento virou caso de polícia: “De acordo com Gustavo Bragança, comissário de polícia da cidade de Dos de Mayo, seus colegas foram investigar o que estava acontecendo no cemitério de San Lazaro, depois de relatos de pessoas que viram alguém escutando música alta dentro do mausoléu. Quando a polícia bateu na porta, encontrou a senhora Villarreal de pijama do lado do corpo embalsamado”.

Segundo informações locais, o falecido marido cometeu suicídio há 2 anos, enquanto ela estava trabalhando no México. Como quase tudo, hoje em dia, a investigação foi iniciada, mas as razões para a atitude da viúva ainda não foram esclarecidas (e talvez nem venham a ser). Apenas o relato de Adriana de que “ele era um bom homem e o amava muito”.

“Quando você ama alguém, você faz todos os tipos de coisas”, declarou Adriana à imprensa local. Talvez essa seja a resposta mais simples e até por isso as pessoas a considerem “doentia”.

O que motiva Adriana a isso? Amor? Culpa, por não estar ao lado do marido no momento do suicídio? Ou por não ter “percebido” qualquer alteração emocional no companheiro? Ficar ao lado dele, mesmo após sua morte, a fará compreender a decisão limite de tirar a própria vida?

Podemos ousar algumas suposições: Quem sabe, se, ao lado do marido, Adriana não busque respostas, o conhecimento das coisas, da sua existência e a de quem se ama.

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De qualquer maneira, essa senhora precisa de atenção e cuidado para “tratar” ou pela psicologia, “elaborar” essa perda. Para Kovács (1996: 14): “A separação pode ser vivenciada através de vários tipos de experiências, desde a separação com a figura materna até a separação de namorados e de casais. Ela envolve aspectos semelhantes ao luto; a diferença é que, na situação de luto, houve a morte concreta de alguém, enquanto, na separação, não. Apesar disso, ‘é preciso matar o outro dentro de si’”.

Ainda seguindo a linha de pensamento de Kovács: “o risco da separação depende da possibilidade de se perder, junto com o perdido, o significado da vida. É preciso, nesse momento, construir uma nova vida – agora, sem o outro; o que significa elaborar a perda, retomar as atividades cotidianas, investir em novas relações”.

Adriana estaria sozinha nesta caminhada de reconstrução da própria vida? Sem maiores informações e detalhes sobre sua vida, pensamos que sim.

“Após alguns dias e novas denúncias, a polícia descobriu que Adriana havia renovado o mausoléu por dentro, colocando uma cama, rádio, computador com internet e um pequeno fogão”, conta o ‘Jornal Ciência’.

E como quase tudo vira piada, no site da matéria, encontramos comentários desrespeitosos e cruéis. Alguém diz: “Sacanagem é os outros mortos ficarem denunciando só porque não recebem visitas assim tb”.

Em seguida chega a resposta de outro internauta, seguindo o mesmo tom zombeteiro da primeira: “kkkkkk mew fala sério como tem gente doida nesse mundo a mulher fez do ”mausoléu” a sua casa ate PC com net hahahaha… Onde este mundo vai parar hahaha”.

Irônico: oscilamos entre a tragédia e a piada, entre a comoção e as palavras banais. Será por isso que Adriana escolheu “estar ao lado do marido morto”, vivendo um “certo algo e não o completo nada”?

Vigotski (1996: 265) tem sua teoria quando afirma que a ciência assimilou muito bem o conceito de vida, mas não conseguiu explicar o de morte: “A morte é interpretada somente como uma contraposição contraditória da vida, como a ausência da vida, em suma, como o não-ser. Mas a morte é um fato que tem também seu significado positivo, é um aspecto particular do ser e não só do não-ser; é um certo algo e não o completo nada”.

Referências

JORNAL CIÊNCIA (2012). Viúva argentina dorme com esposo falecido dentro de mausoléu para lhe fazer companhia. Disponível Aqui. Acesso em 20/06/2012.

COMBINATO, D.S. (2006). Morte: uma visão psicossocial. Disponível Aqui . Acesso em 20/06/2012.

KOVÁCS, M.J. (1996). A morte em vida. In: M.H.P., BROMBERG; M.J., KOVÁCS; M.M.M., CARVALHO & V.A., CARVALHO (Orgs.). Vida e morte: laços da existência. São Paulo: Casa do Psicólogo.

VIGOTSKI, L.S. (1996). Teoria e método em psicologia. São Paulo: Martins Fontes.

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