Com o título “Sustentar o Progresso Humano: Reduzir as Vulnerabilidades e Reforçar a Resiliência”, pela primeira vez o Relatório da ONU reconhece os riscos na velhice ao apresentar uma seção sobre o envelhecimento.
Helen Clark *
Reforça a promoção do desenvolvimento em todo o curso da vida e pede apoio para os idosos, pois entende que estes podem dar uma valiosa contribuição para a sociedade se devidamente apoiados. Segundo o Relatório, as pessoas mais velhas podem ajudar a impulsionar a economia como um todo. Leia o prefácio.
O Relatório do Desenvolvimento Humano de 2014 – Sustentar o Progresso Humano: Reduzir as Vulnerabilidades e Reforçar a Resiliência – debruça-se sobre dois conceitos interligados e extremamente importantes para a salvaguarda do progresso realizado em matéria de desenvolvimento humano.
Desde a primeira publicação do Relatório do Desenvolvimento Humano (RDH) global pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em 1990, é possível observar que a maioria dos países registou um desenvolvimento humano significativo. O Relatório do corrente ano mostra que as tendências gerais a nível mundial são positivas e que o progresso continua a ser uma realidade. Contudo, há vidas perdidas e meios de subsistência e desenvolvimento comprometidos por crises e catástrofes naturais ou de origem humana.
Tais reveses não são, todavia, inevitáveis. Muito embora todas as sociedades sejam vulneráveis a riscos, algumas são muito menos penalizadas e recuperam com maior celeridade do que outras quando se veem confrontadas com a adversidade. O presente Relatório procura saber as razões dessa dicotomia e, pela primeira vez n um HDR global, contempla as questões da vulnerabilidade e da resiliência pelo prisma do desenvolvimento humano.
Grande parte da atual investigação sobre vulnerabilidade tem em conta a exposição das pessoas a determinados riscos e, frequentemente, num setor específico. Este Relatório adota uma abordagem diferente e mais holística. Tem em consideração os fatores que comportam riscos para o desenvolvimento humano e, em seguida, analisa formas possíveis de reforçar a resiliência a um leque alargado de riscos emergentes.
Esta abordagem é especialmente importante num mundo interligado como o nosso. Muito embora a globalização tenha sido benéfica para muitos, também deu azo a novas preocupações, manifestando-se por vezes como reações locais às repercussões de acontecimentos longínquos. Preparar os cidadãos para um futuro menos vulnerável significa reforçar a resiliência intrínseca de comunidades e de países. O presente Relatório lança as bases desse processo.
Em consonância com o paradigma do desenvolvimento humano, o Relatório adota uma abordagem centrada nas pessoas, prestando especial atenção às disparidades existentes entre os países e no interior dos mesmos. Identifica os grupos de indivíduos “estruturalmente vulneráveis”, que são mais vulneráveis do que outros em razão da sua história ou da desigualdade de tratamento de que são alvo pelo resto da sociedade. Muitas vezes, estas vulnerabilidades não só passam por transformações sucessivas como persistem por longos períodos de tempo e podem estar associadas a determinados fatores, designadamente género, etnicidade, indigenismo ou localização geográfica, entre outros. Muitos dos grupos e indivíduos mais vulneráveis veem a sua capacidade de resposta aos contratempos reduzida por restrições várias e concomitantes. Por exemplo, os indivíduos que são pobres e pertencem simultaneamente a uma minoria, ou que são do sexo feminino e portadores de deficiência, enfrentam numerosas barreiras que podem reforçar-se mútua e negativamente.
O Relatório analisa as mutações das vulnerabilidades ao longo da vida, adotando uma abordagem de “ciclo de vida”. Ao contrário de modelos mais estáticos, esta análise sugere que crianças, adolescentes e adultos enfrentam diferentes conjuntos de riscos que exigem respostas específicas. Algumas fases da vida são identificadas como especialmente importantes: por exemplo, os primeiros 1000 dias da vida de uma criança, a transição da escola para o trabalho ou do trabalho para a reforma. Os contratempos ocorridos nestes períodos podem ser especialmente difíceis de superar e ter repercussões de efeito prolongado.
Com base na análise dos dados disponíveis, o presente Relatório formula uma série de recomendações importantes suscetíveis de criar um mundo capaz de enfrentar as vulnerabilidades e reforçar a resiliência a futuros choques. Apela ao acesso universal aos serviços sociais básicos, em especial saúde e educação, a uma proteção social mais forte, designadamente pensões e subsídios de desemprego, e a um compromisso com o pleno emprego que reconheça que o valor do emprego vai muito além do rendimento que gera. Examina a importância de instituições equitativas e com capacidade de resposta e de uma maior coesão social que favoreça o reforço da resiliência ao nível das comunidades e a redução do potencial de eclosão de conflitos.
O Relatório reconhece que, independentemente do grau de eficácia das políticas na redução de vulnerabilidades inerentes, as crises continuarão a ocorrer com consequências potencialmente devastadoras. É, pois, vital o reforço de capacidades de resposta e recuperação de catástrofes, que permita às comunidades fazer frente e recuperar de choques ou impactos. A nível mundial, reconhecendo que os riscos são, por natureza, transfronteiriços e requerem uma ação coletiva, o Relatório exorta a compromissos globais e a uma melhor governação internacional.
Estas recomendações são importantes e oportunas. No momento em que os Estados Membros das Nações Unidas se preparam para concluir as negociações sobre a agenda do desenvolvimento pós—2015 e lançar um conjunto de objetivos de desenvolvimento sustentável, os dados recolhidos e analisados no presente Relatório, bem como a perspectiva do desenvolvimento humano que lhe serve de base, revelam-se particularmente valiosos. Por exemplo, a erradicação da pobreza será um objetivo central da nova agenda. No entanto, o Relatório defende que a precariedade dos progressos alcançados no domínio do desenvolvimento se mantém, se as pessoas continuarem em risco de regressar a uma situação de pobreza devido a fatores estruturais e vulnerabilidades persistentes. A erradicação da pobreza não passa apenas por “chegar ao nível zero”, mas também por o manter.
Para realizar a visão do PNUD de ajudar os países a alcançar simultaneamente a erradicação da pobreza e a redução significativa de desigualdades e de exclusão, bem como de promover o desenvolvimento humano e sustentável, importa aprofundar os conceitos de vulnerabilidade e resiliência. A menos que—e até que—as vulnerabilidades sejam resolvidas com eficácia e todas as pessoas tenham a oportunidade de participar do progresso alcançado no desenvolvimento humano, os avanços conseguidos não serão nem equitativos nem sustentáveis.
O presente Relatório visa ajudar os decisores e outros atores no domínio do desenvolvimento a preservar as conquistas em matéria de desenvolvimento através de políticas que reduzam as vulnerabilidades e reforcem a resiliência. Recomendo-o a todos os que aspiram a um progresso sustentado do desenvolvimento, em especial em benefícios das pessoas mais vulneráveis do mundo.
* Helen Clark – Administradora do PNUD
Leia na íntegra o relatório: Disponível Aqui