A Gerontologia Social no Brasil nasceu no Instituto Sedes Sapientiae. A participação de Elvira foi importante para a criação do Departamento de Gerontologia na Sociedade Brasileira de Geriatria, hoje, Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. A profa. Elvira foi uma das pioneiras de Gerontologia Social no Brasil. Uma grande perda que deixou um legado importante para o estudo do envelhecimento.
Graça Leal e Tomiko Born
No dia 6 de janeiro faleceu a Profa. Dra. Elvira da Conceição Abreu e Mello Wagner, uma das pioneiras de Gerontologia Social no Brasil. Uma grande perda que deixou um legado importante para a o estudo do envelhecimento.
Elvira foi uma mulher extraordinária: inteligente, dinâmica, batalhadora, sempre disposta a realizar um pouco mais para a construção da Gerontologia Social no Brasil. Como praticamente não havia livros e revistas publicados sobre a disciplina, escreveu textos e traduziu artigos de revistas e livros especializados no exterior, preparando apostilas para os cursos realizados no Sedes Sapientiae.
Foi uma das primeiras assinantes brasileiras de Gerontologist; sempre fazia questão de participar em Congressos Internacionais de Gerontologia, de onde trazia novas ideias e material didático. Visando possibilitar a formação de alunos e alunas de outros municípios e estados, organizou também cursos intensivos de verão.
Pode-se afirmar que a Gerontologia Social no Brasil nasceu no Instituto Sedes Sapientiae. A participação de Elvira foi importante para a criação do Departamento de Gerontologia na Sociedade Brasileira de Geriatria, hoje, Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.
O curso de Gerontologia Social do Instituto Sedes Sapientiae foi percussor na área da gerontologia, quando no país a população idosa ainda era reduzida e tinha pouca visibilidade. O programa foi implantado em 1979 pelas psicólogas Raquel Vieira da Cunha e Lea Rosenberg, aberto a profissionais de diferentes formações.
De 1980 a 2002 foi coordenado pela Dra. Elvira, com contribuições importantes para o estabelecimento da gerontologia em nosso país tendo como assistente Tomiko Born, assistente social. Nos últimos anos sua colaboradora foi a psicóloga Dra. Maria das Graças Sobreira Leal, atual coordenadora do curso.
O curso possibilita atuação qualificada, ações preventivas e programas inovadores dos profissionais junto à população idosa. Tem como proposta: estudar o processo do envelhecimento, da velhice e dos idosos; informar sobre temas e postulados fundamentais da gerontologia e capacitar profissionais de diferentes áreas para atuarem em Gerontologia.
Nota do Portal
A seguir reproduzimos algumas questões respondidas pela profa. Elvira em 1986, à Revista Psicologia:Ciência e Profissão, v.6(1).
Sobre o conceito de velhice
Elvira – Como é que se sente na velhice uma pessoa que vem de uma classe bastante desprotegida, que teve uma gestação sem qualquer assistência, cuja infância foi toda perturbada no seu crescimento biológico, psicológico e social? Como ela vai enfrentar o envelhecimento? Certamente com muito medo, que vai estar presente desde muito cedo na vida dela, porque em geral é um trabalhador empregado que vive sob a ameaça constante de desemprego iminente ou vive mesmo desempregado.
Quando se aposenta, cresce a insegurança na vida dessa pessoa por causa das condições em que se faz a aposentadoria dentro da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que é completamente diferente da aposentadoria do funcionário público ou do militar. O funcionário público e o militar têm garantidos que o seu ganho de aposentadoria vai ser exatamente o mesmo que a sua classe vai estar recebendo durante o período produtivo. Na medida em que a sua classe vai tendo equiparações salariais, os aposentados também vão sendo contemplados com as mesmas equiparações. A mesma coisa não acontece com o empregado assalariado que é a grande massa dos trabalhadores. Quando se aposenta, já sabe de antemão que vai passar a receber pouco mais que a metade daquilo que recebia antes. Além disso, vai sofrendo uma perda dos proventos de aposentado a cada ano que passa.
Sobre as distorções da velhice
Elvira – A maioria das pessoas acha que o envelhecimento implica necessariamente deterioração física e mental. Mas isso depende muito do estilo de vida da pessoa. As pessoas que envelhecem bem são as que se adaptam às modificações típicas da idade, à medida que percebem como não são ágeis e nem tão resistentes. Elas sentem que precisam ir mudando a sua maneira de viver, mas sentem também que devem continuar integradas na sociedade.
As pessoas mais jovens, que não têm contato com os mais velhos, fantasiam muito a respeito da velhice. Quando têm um contato constante com os velhos da sua família, da vizinhança, do ambiente de trabalho, formam uma ideia mais próxima e verossímil da velhice. Têm condições de constatar que a maioria dos velhos são lúcidos, interessados, capazes e desenvolvem uma espécie de sabedoria de vida. Esse contato dos jovens com os mais velhos fornece um modelo positivo de envelhecimento que é uma experiência extremamente valiosa para eles não temerem tanto a velhice. Coloca-se também a questão para os próprios jovens: como eles estão se preparando para lidar com a sua própria velhice? É preciso conscientizar que o velho não é só o outro, ele está também no jovem. Com isso promove-se a aproximação das gerações.
Sobre a assistência deficiente
Elvira – Quando uma pessoa de classe menos privilegiada sobrevive a uma idade mais avançada, continua vivendo em geral com a sua família. Mesmo se a família não pode tomar conta dos seus velhos como seria desejável, reluta e tenta ficar o máximo possível com seus velhos. Somente procuram um asilo no caso em que não conseguem mais sustentar a situação. No Brasil, os asilos são muito pouco numerosos e são sustentados por colônias de descendentes de imigrantes estrangeiros, como por exemplo, os italianos, os espanhóis, os ingleses, os alemães, os japoneses, os árabes etc. Ou então são sustentados por grupos religiosos que constroem e sustentam os abrigos para idosos.
O governo brasileiro não tem realmente participação efetiva; quando apresenta alguma iniciativa, trata-se somente de algum convênio com esses asilos de entidades civis e religiosas. O governo mesmo não constrói e nem sustenta os asilos. Em nosso país, o Estado não dá a devida importância ao aspecto social. Não cuida de seu cidadão, tanto quanto seria necessário, com programas de saúde, de educação, de lazer, de trabalho. Enfim, o Estado não dá amparo ao trabalhador, que constitui a maior parte da população, para que tenha um nível de vida digno ou pelo menos o mínimo indispensável para viver.
Podemos passar ao extremo oposto dos asilos, que são as chamadas casas de repouso destinadas às classes altas. No momento, elas também não oferecem absolutamente nada daquilo que prometem ou pretendem oferecer. Na realidade, as casas de repouso são lugares onde as famílias mais abastadas encostam os seus idosos e onde não existe um atendimento adequado. Nos asilos, costumam utilizar muito a argumentação de que não conseguem pagar os profissionais necessários como médico geriatra, terapeuta ocupacional, psicólogo, assistente social, fisioterapeuta e outros, que dariam uma assistência adequada. Mas essas casas de repouso, que cobram bastante caro e lidam com pessoas que têm recursos, também não possuem uma equipe multiprofissional na maioria dos casos, com muito poucas exceções. Então perguntamos por que as casas de repouso não contratam os profissionais? Obviamente, a resposta para nós é que a maioria das casas de repouso tem um objetivo comercial e não estão interessadas no atendimento adequado ao idoso.
De modo geral, predomina o ponto de vista de que se a pessoa está bem acomodada num local, tem alimentação e alguma assistência médica, o idoso já estaria bem. Consideram-se somente as necessidades de atendimento físico, as outras necessidades não são pensadas como necessidades das pessoas que envelhecem. A necessidade de lazer, de contato afetivo, de colocar um significado de vida, de ter atividades nas quais possa se sentir integrado na sociedade. Sem isso, a pessoa idosa vai perdendo o ânimo de vida que vem dos contatos e de se sentir realmente participante. No entanto, este objetivo pode ser obtido através de um trabalho preventivo com as pessoas, na medida em que envelhecem, e da assistência efetiva de uma equipe multiprofissional preparada dentro dos conhecimentos e conceitos da Gerontologia.
Sobre a formação em Gerontologia
Elvira – Ultimamente tem aumentado o interesse dos profissionais pelo curso de Gerontologia do Instituto Sedes Sapientiae. Alguns deles já estão trabalhando com entidades civis ou órgãos públicos. Às vezes, estes trabalhos não se restringem aos velhos internados nos asilos ou hospitais, mas abrangem a situação ideal que é a de os idosos permanecerem integrados e participantes na sociedade.
Em geral, os nossos alunos são psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais de Saúde. Mas o nosso curso está aberto aos profissionais de todas as áreas, sem restrições. Os arquitetos, advogados, engenheiros, jornalistas, economistas, entre outros, raramente se inscrevem no nosso curso e seria desejável que se inscrevessem mais ainda. Os profissionais de todas as áreas profissionais e científicas têm uma contribuição a dar na Gerontologia a partir de sua área específica.
Nós procuramos dar um embasamento teórico de Gerontologia que abrange os aspectos físicos, psicológicos e sociais dos processos de envelhecimento. Além das aulas, procuramos colocar os alunos em contato direto com as pessoas que envelhecem, com as famílias desses idosos e com as entidades que lidam com eles.
Não temos somente a proposta de dar informações teóricas sobre os processos de envelhecimento, também procuramos trabalhar a própria imagem e atitude perante a velhice que os alunos possuem. Consideramos uma condição básica que o profissional se veja, em primeiro lugar, como uma pessoa frente ao envelhecimento que não é só do outro idoso, mas dele também. Pedimos para os alunos desenvolverem trabalhos que os coloquem diretamente em contato com situações envolvendo o envelhecimento, e que são discutidos e elaborados em conjunto, nas supervisões. São trabalhos orientados, práticos, voltados para a nossa realidade e, portanto, eles podem examinar suas próprias reações e atitudes.