Algumas vezes, certas questões polêmicas ou até tendenciosas, que colocamos as pessoas (independente de serem alunos, jovens ou não) podem já vir impregnadas de conceitos culturais, inclusive nossos, que levam o outro a respostas óbvias e esperadas.
Explico: comparar a situação e perspectiva do idoso aposentado brasileiro com indivíduos nascidos no Japão ou EUA sugere respostas “clássicas”, imediatas e normalmente sem qualquer reflexão (fato esse que já nos faz pensar em uma boa pesquisa – Por que será que isso ainda acontece?).
Bem, como esse não será o foco de nosso comentário, retorno a reportagem. Rodrigo Pessoa Mazzei – Mestre em Economia de Empresas e graduado em Ciências Econômicas – propôs a seus alunos a questão acima: “Como vocês imaginam o idoso e aposentado de um país como o Japão ou os EUA nos dias atuais? O que ele faz?”.
Segundo Rodrigo, a resposta quase em coro foi: “ele viaja!”. Em seguida, o professor repetiu a pergunta, dessa vez sobre o aposentado brasileiro. Ele conta: “Dessa vez vieram respostas como: está na fila do SUS! Ou ainda: pagando a conta da farmácia e do plano de saúde. Ou então: trabalhando para se sustentar, e coisas do tipo”. Concluindo: “Ou seja, bem diferente do cidadão de um país desenvolvido”.
Que conceito cristalizado é esse que nós brasileiros temos do país e da vida que vivemos? Como já dissemos, Rodrigo afirma que: “As colocações dos alunos eram esperadas. Embora não sejam especialistas em temas como demografia e economia, eles têm a noção do chamado processo de transição demográfica que estamos vivendo. O Brasil está passando por um rápido processo de envelhecimento da sua população e isso tem causado mudanças estruturais profundas que uma geração inteira verá acontecer. Outros países já passaram por um período de altas taxas de mortalidade e fecundidade para uma situação em que esses níveis se tornam significativamente reduzidos”.
Em parte, o professor está correto, mas ressaltamos que o acelerado envelhecimento da população é um fenômeno mundial e todos os países estão passando por uma situação de crise, de difícil compreensão do que virá nas próximas décadas. Já sabemos que profissionais especializados de vários setores – economia, saúde, social (…) – já trabalham em políticas públicas e desenvolvimento de pesquisas, focando um bem viver para tornar nosso futuro, cada vez mais longevo, digno e justo para todos.
Rodrigo ainda pergunta: “E quais seriam as mudanças decorrentes desse processo que eu e você leitor temos que nos preparar para enfrentar?”.
“Bom, são mudanças nas mais diversas frentes que são estudadas exaustivamente pelos centros de pesquisas. Elas afetam os serviços públicos, os gastos do governo, a poupança das famílias, os encargos das empresas, a cultura financeira das pessoas, o planejamento familiar, o mercado de trabalho, dentre outras”.
Cada questão acima proposta para estudo sugere um desenvolvimento, com certeza, complexo. Em função disso, o professor opta pela análise das “finanças pessoais, mais especificamente em aposentadoria”.
Em que situação você, caro leitor, se enquadra?
“Caso você seja trabalhador autônomo ou possui carteira de trabalho assinada e planeja se aposentar apenas pelo INSS, imagino que terá problemas pela frente para manter as despesas nos padrões atuais”, considera Rodrigo.
Ele complementa: “Nosso sistema de previdência pública depende da contribuição de quem está ativo no mercado de trabalho para financiar os aposentados e pensionistas. Como estamos caminhando aceleradamente para o envelhecimento da população, nota-se que algo terá de ser feito nas regras atuais do sistema de previdência. Serão cada vez menos cidadãos em idade ativa contribuindo para sustentar o volume crescente de aposentados. A conta não fecha!”.
Assim, corretamente, o professor afirma que “devemos nos preparar para o futuro”. Qual seria a solução?
Ele conclui (talvez o que já esperávamos ouvir):
– “Buscar alguma forma de poupança para arcar com as despesas que a terceira idade acaba trazendo, como medicamentos, exames, consultas além das despesas normais de moradia, alimentação”.
– “Uma alternativa seriam os planos de previdência complementar. Nos últimos anos eles tem se tornado bastante populares”.
– “Outros buscam fugir das taxas de administração desses planos estudando um pouco mais sobre o mercado de capitais. Há casos de pessoas que aplicam diretamente em títulos públicos do governo ou ainda partem para aplicações de renda variável, como as ações”.
Agora em coro: Cabe a cada um de nós viver os anos da maneira que queremos.
Como cada um investe sua poupança aonde quer, voltamos para o Japão…
O web site UOL traz a notícia: “Um japonês de 94 anos se tornou em 13/12/2012 o homem mais velho a disputar uma eleição no Japão. Ryokichi Kawashima apresentou, apenas três horas antes do prazo, sua inscrição como candidato ao parlamento do país pela prefeitura de Saitama, no centro do país”.
Ryokichi Kawashima investiu sua poupança de 3 milhões de ienes (R$ 75 mil) guardados para seu funeral, na sua campanha parlamentar. Seu comitê é composto basicamente de familiares. Ele conta que o que o levou a entrar para política após nove décadas de vida foi assistir a um debate pela televisão. “Eu não podia aceitar quão fragmentado e desorganizado eles [os principais candidatos] se tornaram. Eles não têm noção da realidade”, afirma.
Segundo a matéria do UOL, o Japão possui uma das populações mais velhas do mundo. Um quarto dos japoneses tem mais de 65 anos, gerando uma conta de R$ 27 bilhões à aposentadoria pública do país.
Mas está enganado quem pensa que a campanha de Kawashima está focada nas questões do envelhecimento e na situação do idoso japonês. Sua agenda é principalmente antinuclear e antinacionalista.
Sua decisão de correr as eleições foi tomada após se reunir com sua filha de 62 anos e os três irmãos mais novos, que tem entre 76 e 85 anos: “Todos meus amigos estão mortos, então organizei um encontro familiar e pedi a ajuda deles”, diz. Ele reconhece que tem poucas chances de ganhar uma vaga que também é disputada por candidatos do Partido Democrático do Japão, de situação e do oposicionista Partido Democrático Liberal. Os liberais são apontados como favoritos nestas eleições.
É, cada um vive sua velhice como quer, independente dos rótulos impostos pela sociedade, família, amigos ou até aqueles que nós mesmos nos impomos no decorrer da vida. Como fez Ryokichi Kawashima, investir sua aposentadoria num funeral? Que nada, investir sim, na vida, por mais bizarro que o tal “investimento” possa parecer!
Referências
Patrocinio, R. (2012). O que o envelhecimento da população tem a ver com as minhas finanças pessoais?. Disponível Aqui. Acesso em 08/01/2013.
UOL (2012). Japonês de 94 anos usa poupança do próprio funeral em campanha para parlamento. Disponível Aqui. Acesso em 14/12/2012.