Muito além das três dimensões

Há pelo menos 80 anos, tem-se buscado o ‘graal’ da física moderna: a unificação da gravitação com as outras três forças fundamentais do universo – a eletromagnética, que atua entre cargas elétricas e responde, por exemplo, pelo atrito entre os corpos; a forte, que mantém os núcleos atômicos coesos; e a fraca, que está por trás de certos fenômenos radioativos.

Fred Furtado e Cássio Leite Vieira

 

O melhor candidato da atualidade para esse posto é a chamada teoria de supercordas, que postula que as partículas fundamentais que compõem a matéria são, na verdade, vibrações de uma entidade física com dimensões minúsculas (10 -33 cm), a corda. O prefixo ‘super’, no caso, significa supersimetria, ou seja, cada partícula conhecida hoje (elétrons, quarks, neutrinos etc.) teria um parceiro, a chamada partícula supersimétrica.

Em 1999, essa busca pelo que se convencionou chamar ‘teoria de todas as coisas’ ganhou velocidade com a publicação de dois artigos da física norte-americana Lisa Randall e de seu colega Raman Sundrum. Os trabalhos de Randall tornaram-se os mais citados da física teórica dos últimos cinco anos.

Randall é também uma ativa divulgadora de ciência. Seu primeiro e único livro de divulgação, Warped passages: unraveling the mysteries of the universe’s hidden dimensions (‘Passagens distorcidas: desvendando os mistérios das dimensões ocultas do universo’, ainda sem tradução), trata da possibilidade de o universo ter mais de três dimensões espaciais.

Professora catedrática da Universidade Harvard (Estados Unidos), Randall esteve no Rio de Janeiro no mês passado para dar uma série de palestras. Confira a entrevista exclusiva concedida à Ciência Hoje.

Na teoria de supercordas, o universo tem mais que as três dimensões espaciais nas quais vivemos. Onde estão as demais?

Lisa Randall – Essa questão é alvo de intensa pesquisa atualmente. Por cerca de 80 anos, acreditou-se que elas tivessem que ser muito pequenas – tão pequenas a ponto de não podermos enxergá-las – e dobradas de modo simples ou complexo. Também se descobriu que há a possibilidade de as dimensões extras estarem extremamente distorcidas ou curvadas, de forma que, mesmo se elas forem infinitas, não as consigamos ver. Ou seja, elas estão escondidas de uma maneira que não afeta a escala na qual são feitos os experimentos até agora. Isso não significa que, no futuro, essas dimensões não poderão ser detectadas.

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Por que a teoria necessita de dimensões extras?

Todo mundo quer uma resposta fácil para essa pergunta, mas ela é muito sutil. Essencialmente, a teoria seria instável se não houvesse essas dimensões extras. Dito de outro modo, não conseguiríamos fazer os cálculos necessários, e ela, portanto, não faria sentido.

Por que 10 dimensões espaciais?

No início, pensava-se que eram nove. Agora, no entanto, já se acha que talvez sejam 10. Mas isso depende de a interação das cordas ser muito forte ou muito fraca. Em outras palavras, às vezes uma teoria de 10 dimensões é equivalente a outra de 11, mas com outros valores de parâmetro. Agora, o porquê desse número específico se deve a um fato matemático: é o único que faz sentido para a teoria.

E por que só uma dimensão é temporal?

Na teoria das supercordas, já se considerou mais de uma, mas a questão é que, de novo, esse tipo de teoria é instável. Parte da razão para isso é intuitiva: se houver mais de um tempo, nossas noções de física se desfazem, e ocorre todo tipo de paradoxo.

Como se pode obter evidência direta da existência dessas dimensões extras?

Há duas maneiras. A primeira tem a ver com o fato de que a gravidade parecerá diferente em certas escalas de energia. Ou seja, se elas existirem, a gravidade poderia se espalhar por mais dimensões espaciais, além das três conhecidas, e a maneira como ela, a gravidade, varia segundo a distância depende disso. A segunda maneira abrange as partículas fundamentais, que, ao se moverem por essas novas dimensões, apareceriam para nós como novos tipos de partículas cujas massas dependeriam da geometria desse espaço multidimensional.

Fonte: Boletim Ciência Hoje/RJ – Revista CH 230/setembro de 2006. Acesse Aqui

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