Idosos em risco

Há três anos, quando o Estatuto do Idoso entrou em vigor, definindo direitos e estipulando deveres para melhorar a vida dos brasileiros de mais de 60 anos, esperava-se que haveria drástica redução dos casos de negligência em relação aos idosos, tanto no campo familiar como no institucional.

Thais Herdy *

 

No entanto, cenas de maus-tratos, instalações fora dos padrões sanitários, pessoal despreparado e atos de violência física flagrados em blitz e realizadas em casas de repouso e asilos continuaram chocando o País. Desde o início do ano, nove asilos e casas de repouso foram fechados em São Paulo por causa das más condições de atendimento aos idosos. Neste mês, um homem foi encontrado amarrado numa casa de repouso, na Vila Jacuí, na zona leste, e, em outro estabelecimento, no Butantã, na zona oeste, um falso médico respondia pelo atendimento dos idosos.

As entidades filantrópicas e particulares que dão assistência a idosos são campeãs de reclamações na Coordenação de Vigilância em Saúde (Covisa), ligada à Secretaria Municipal de Saúde, com 15 a 20 denúncias por mês. Apesar disso, a administração municipal pouco sabe a respeito dessa atividade. Não há sequer dados sobre o número total de entidades que abrigam os idosos. Sabe-se apenas que 61 estão regularizadas e têm licença de funcionamento da Covisa. Numa cidade de 1,2 milhão de idosos, esse número é irrisório e não corresponde à realidade.

O envelhecimento da população, o aumento da expectativa de vida e a maior presença da mulher no mercado de trabalho – o que a deixa sem tempo suficiente para dedicar-se aos filhos e aos idosos da família – são fatores que tornam lucrativo o segmento das casas de repouso.

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De fato, em muitos casos, cuidar de idosos não passa de uma atividade comercial. Uma casa, dividida em alguns quartos, pode se tornar, do dia para a noite, uma “clínica de repouso” particular. Um pouco de propaganda e promessas de atendimento integral podem render R$ 1,5 mil mensais por idoso internado, conforme os preços de “mercado”.

Mesmo em instituições filantrópicas – especialmente naquelas onde não há o acompanhamento da família e a fiscalização do Estado – há casos de administração negligente e caótica, que resulta em condições degradantes para os internos. Em muitas “clínicas” particulares, o objetivo é a maximização do lucro, e nada mais. Para tanto, desrespeitam-se as leis de zoneamento, as regras tributárias e as normas de saúde pública. Cortes de custos aumentam os lucros e, assim, a alimentação, a higiene e os cuidados com a saúde dos internos passam para segundo plano. Nessas casas ou asilos são comuns os maus-tratos.

Recente reportagem do Estado mostrou a situação degradante encontrada por técnicos da Covisa na Casa de Repouso Nova Esperança, no Imirim, na zona norte de São Paulo – um verdadeiro depósito de idosos, cheirando a urina, com quartos superlotados e sem ventilação. Foram encontrados alimentos estragados e cestas básicas estocadas em banheiros. Uma das internas, doente mental, era a responsável por descascar batatas, como se normal fosse confiar facas a alguém com problemas psiquiátricos.

A gerente da Covisa, Inês Suares Romano, afirma que o órgão está disposto a obrigar todas as entidades dedicadas a assistir os idosos a atuarem dentro da legalidade. Todas as autoridades deveriam fazer cumprir as normas que asseguram respeito aos idosos. O Estatuto do Idoso prevê penas de até 12 anos de reclusão para quem expuser alguém com mais de 60 anos a perigo de vida, humilhá-lo, negar-lhe cuidados básicos ou tratá-lo com violência. Onde isso acontece, a lei deve ser cumprida com rigor. Mas não basta fechar casas de repouso e asilos e processar os responsáveis pelas transgressões. É preciso que as autoridades mantenham programas de apoio à profissionalização das pessoas que trabalham nessas entidades. No cuidado com os idosos é preciso que haja caridade e solidariedade. Mas também é imprescindível o aprimoramento de técnicas de seleção profissional e de gerenciamento, para que melhore a qualidade do atendimento.

*Thais Herdy – Assessoria de Comunicação Social. Secretaria Especial dos Direitos Humanos

Presidência da República. Tel.: (61) 3429.3498/9805
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Fonte: Jornal O Estado de S.Paulo – Editorial, 01/05/2007.

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