Estava tão certa de que teria um manual pronto, de fazeres e de certezas de qual era a melhor forma de acomodar meus pais que estão ficando velhos… mas é muito mais complexo. Como fazer a melhor escolha?
Por Carina Mattievich (*)
Já fazem alguns anos venho pensando no tema do envelhecimento, seja porque meus pais estão ficando velhos e me preocupo com eles, ou por ver que alguns amigos e familiares já estão lidando com as dificuldades com algum membro da sua família, ou por recear eu mesma, da minha velhice daqui a uns anos, percebendo que o tempo escoa de forma tão rápida ao mesmo tempo que assistimos a um estiramento da nossa expectativa de vida, e ainda não vislumbramos todo o potencial e também o drama desse novo paradigma.
Pensando na minha profissão, arquiteta e urbanista, e quais seriam os desafios relacionados ao envelhecimento dentro de uma habitação, deparei-me com questionamentos do tipo:
Devemos continuar vivendo em nossas casas da mesma forma que vivíamos 15 ou 20 anos antes? Seria possível pensarmos numa casa que deve se adaptar às mudanças da passagem do tempo, assim como nos preparamos em outras fases da vida, como por exemplo, o casamento, a chegada de um bebê ou mais filhos, a saída dos filhos de casa, a aposentadoria? É certo pensarmos na casa como algo que tem vida e plasticidade e deve e pode se adaptar às novas demandas? Vivemos no lugar que desejamos realmente? Estamos aptos a fazer mudanças no nosso estilo de vida para podermos ter maior qualidade de vida e uma velhice mais plena e cheia de possibilidades?
Na tentativa de responder a estas questões, fui pesquisar em sites especializados e encontrei, com frequência, termos que eu não tinha familiaridade até poucos meses atrás: Instituições de Longa Permanência para idosos (ILPIs), Casas de Repouso, “Co-Housing”, “Aging in place”, Condomínios da terceira idade, entre outros. Há, na verdade, uma infinidade de “soluções de moradias e formas de viver” para os idosos…
Alguns parecem sugerir uma fórmula mágica para resolver os males e angústias que afligem os solitários, outros parecem dar alento para as famílias que já não podem mais com seus velhos, finais e definitivas para o que já não tem mais jeito… Os condomínios da terceira idade parecem uma solução viável para aqueles que querem sossego e tranquilidade mais afastados das cidades, mas há também a ideia de que podemos continuar habitando o nosso lar, aquele que guarda tantas lembranças de outras épocas…
Parece que não há uma fórmula apenas, terei que aceitar que não obtive uma única resposta para o meu questionamento. Estava tão certa de que teria um manual pronto, de fazeres e de certezas de qual era a melhor forma de acomodar meus pais que estão ficando velhos… mas é muito mais complexo. Na realidade, não há receitas.
Como o tema da terceira idade é relativamente novo no nosso país, que começa rapidamente a mostrar um envelhecimento da sua população de maneira acelerada, há poucos estudos e profissionais atuando com enfoque na arquitetura e Interiores. É certo que em termos de leis houve avanços, especialmente no que diz respeito ao Design Universal, que vem ao encontro das necessidades também da população idosa. Porém será necessário ir além e formatar diretrizes para essa população em especial.
O meu interesse específico é na abordagem do Desenho e Planejamento Residencial. Diretivas para habitarmos por mais tempo e com mais independência os nossos lares, usufruindo de toda a tecnologia possível bem como de um novo olhar sobre o potencial da velhice.
Pensando que esta “nova” fase da vida poderá se estender por até 40 anos, podemos imaginar quanta criatividade será necessária para criar espaços acolhedores, seguros e estimulantes para seus usuários. Muitos estarão capazes o suficiente para empreender em novas profissões ou atividades, usufruir de seu tempo para maior convívio social ou se permitirão focar em atividades de lazer ou viagens.
Em alguns países desenvolvidos, que lidam com aumento considerável da expectativa de vida há mais tempo, já estão à frente em estudos e publicações. Em parceria com a MIT AgeLab, a seguradora americana Hartford, que possui um Centro de Pesquisas de Mercado Maduro, The Hartford Center for Mature Market, que cria soluções inovadoras, gerida por gerontólogos, visa produzir conhecimento do perfil psicológico, sociológico e financeiro da nova dimensão do envelhecer.
Dessas pesquisas me interessei em particular pelo plano de ação: Modern Living, Modern Ideas, um guia gratuito, e que está disponível em inglês no site da Hartford. Joga luz num tema até pouco tempo pouco abordado pelos designers de interiores.
Este guia poderá me servir como ponto de partida para um enfoque no trabalho que pretendo desenvolver com a faixa 60+, aliando com meus conhecimentos de interiores residenciais.
O Guia divide o tema em 4 principais etapas do planejamento:
1) Pesquisa
Avaliando o juste da casa para o seu estilo de vida: Priorizando as coisas que são importantes para os idosos, fazendo ele pensar nas atividades que gosta e pretende continuar fazendo na sua casa. Ex. um Home Office, ou alguém que gosta de receber visitas em casa. Ou até mesmo alguma condição de saúde que poderia afetar esse estilo de vida.
2) Pense
A decisão de como e onde se quer viver: a) Considerar os 3R´s > relacionamentos, região e recursos. Ou seja, a importância ou não das pessoas à sua volta, família e netos; b) Decisões sobre o lugar: cidade x campo, Praia x montanha, as temperaturas também podem ser levadas em conta, ou se apresenta estações marcadas, haveriam muitas opções; c) E finalmente a acessibilidade financeira, no presente e no longo termo, considerando que poderá haver um estiramento na longevidade. Pensar realisticamente em custo de vida em determinado lugar escolhido.
3) Explore
Considerando opções de desenho universal: O Desenho universal ou Acessível se aplicaria nos espaços e produtos para criar ambientes mais acessíveis, confortáveis e fáceis de usar para qualquer idade, tamanho e habilidades. Três palavras resumem o espírito de espaços pensados em base de desenho universal: Adaptáveis, fáceis e abertos. Sem prescindir da estética!
4) Planeje
Crie um plano de ação para alcançar seus objetivos.
Naturalmente cada plano será muito pessoal, dependerá das expectativas e possibilidades de cada um. O interessante é seguir estas diretrizes e poder conversá-las abertamente. Conversando com familiares e entes queridos sobre algo visto num programa de melhoria de casa (hoje comuns na tv por assinatura) ou até na casa de amigos.
Usando a lista como referência será possível tomar decisões de permanecer na casa ou até mesmo optar por uma mudança.
Como facilitadora deste processo estarei munida de ferramentas, a partir dos estudos de gerontologia, com um olhar mais cuidadoso, tolerante, poderei ajudar neste processo que deve ser visto como mais uma etapa importante nas nossas vidas, que pode ser produtiva, prazerosa, agradável e, por que não, muito feliz!
(*) Carina Mattievich – Arquiteta e Urbanista, formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1996. Iniciei minha carreira como arquiteta no escritório Sig Bergamin Arquitetura Ltda, de Nova York, e depois tive meu próprio escritório com outras sócias. Sempre atuei na área de Interiores, fazendo projetos de reformas e Decoração predominantemente residencial unifamiliar. Atualmente faço parte de um grupo que promove atividades de encontros, palestras e workshops, visando bem-estar e longevidade, chamado Casa Plátano. Texto escrito para o curso Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento, ministrado pelo Cogeae (PUC-SP), no primeiro semestre de 2018. E-mail: [email protected]
Imagem destaque: Skiathos Greece