Essa foi a pergunta que Alexandre Kalache fez em diversos momentos durante sua palestra na XV Conferência Estadual da Pessoa Idosa de São Paulo ante o tema da mesma: “Os desafios de Envelhecer no Século XXI e o papel das Políticas Públicas”: Estamos preparados?
“Enquanto uns poucos estão envelhecendo com tudo, continua péssimo para milhões e milhões de brasileiros”, assim teve início a fala de Alexandre Kalache, presidente do Centro Internacional de Longevidade Brasil, na XV Conferência Estadual da Pessoa Idosa que está sendo realizada no município de Águas de Lindóia, em São Paulo, até dia 13 de novembro.
“Estamos aqui para dar resultados a esse povo sofrido e desigual, e não votos. Estamos aqui para que o Brasil seja um país mais amigo do idoso. Eu trabalhei com muito afinco para isso durante anos e são poucos os exemplos que me dão orgulho. Não são com decretos que se constrói uma cidade amiga do idoso, é com suor, muito trabalho, nem tampouco como foco de prefeitos e presidentes. É com trabalho sério, comprometimento”, disse Kalache.
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- 26/06/2019
Kalache falou da importância do protagonismo da pessoa idosa, da luta contra a desigualdade, pois ela tem gênero, cor e raça neste país. Apontou que a exclusão e a discriminação têm consequências negativas ao longo da vida. Mencionou a questão do racismo, sexismo, idadismo, comentando que o preconceito está na base e que os brancos deveriam ler mais os negros, repetindo frase da filósofa, escritora e ativista negra, Djamila Ribeiro, que diz o seguinte: “Falta aos brancos ler os autores negros – para aí sim pensar ações concretas de combate às desigualdades”. Vale lembrar que Djamila Ribeiro foi eleita em 2019 como uma das 100 mulheres mais influentes e inspiradoras do mundo pela BBC-Londres.
“Estamos preparados para os desafios do século XXI?”, pergunta Kalache à uma plateia de quase 400 pessoas, a maioria idosa, fazendo referência ao tema da Conferência. E ele mesmo, ao longo de sua fala, vai respondendo à sua questão. Primeiro anunciando que o que ele está fazendo é preparar o envelhecimento para nossos filhos. E por falar neles, ele apresentou dados demográficos que apontam a diminuição da taxa de fecundidade. São Paulo tem uma taxa de fertilidade de 1,5, estando abaixo da taxa de reposição. As mulheres que estão tendo filhos são as que têm menos de 8 anos de educação. Crianças que não irão para fora do país estudar nem jogar tênis… E então pergunta:
O que vamos fazer de políticas eficazes e mais justas para tanta gente envelhecida?
A resposta é educação. E propõe começar com um ensino público de qualidade, pois ele é a origem da desigualdade, a fim de que aqueles que são jovens hoje não sofram a desigualdade que vivemos atualmente. Kalache comenta que ainda temos no imaginário famílias de casas com muita gente, uma imagem que não corresponde mais à nossa realidade, pois hoje as famílias crescem não para os lados como antigamente, mas verticalmente.
Volta a perguntar: “Estamos preparados? Ou vamos continuar colocando o ônus nas famílias, agora verticais, como todos os governos fazem?, e que família?”. E diz: “Ai da sogra que tiver um só filho e 4 noras. Ninguém vai cuidar dela”, acrescentando a questão de gênero. Por isso ele fala das dimensões do cuidado, do cuidado comunitário que deve ser lapidado, do apoio dos vizinhos já que o apoio da família está escasso, enfim, fortalecer as redes de vizinhança, como também o cuidado institucional.
Kalache não poderia deixar de nomear o documento “Envelhecimento Ativo:
Um Marco Político em Resposta à Revolução da Longevidade”, revisão da Política do Envelhecimento Ativo da OMS (2015), elaborado pelo Centro Internacional de Longevidade Brasil (ILC-Brasil), entidade que ele preside. Nesse sentido disse que esta revisão promove os quatro capitais essenciais para o bem envelhecer: atenção à saúde; acesso a conhecimentos; condições financeiras, pelo menos renda mínima; e suporte e cuidado da família, amigos e pessoas próximas.
O diretor do ILC disse ainda na Conferência de abertura que não devemos culpar o idoso, pois ele é a vítima. Deve-se, sim, tratá-lo com dignidade e exigir a execução das políticas que estão aí.
E, de novo pergunta: estamos preparados?
Kalache foi mostrando que não estamos preparados, e que devemos formar e educar (ao longo da vida) profissionais para o século XXI. Segundo ele nós estamos literalmente “empurrando com a barriga o envelhecimento do país”, e esse é o desafio! Afirma Kalache: estamos no contexto da pobreza com imensa desigualdade, com diferenças de expectativa de vida cerca de 10 a 20 anos. A desigualdade mata jovem e mata idoso. O congelamento de cortes sociais por 20 anos só fará aumentar a pobreza e a desigualdade e uma velhice indigna demais. E nós temos que prevenir a desigualdade social. A desigualdade é ruim para todos.
Kalache termina sua fala convocando a todos os presentes a serem ativistas, a lutarmos por uma harmonia intergeracional, senão correremos o risco de estarmos falhando com os idosos do futuro.
Infelizmente temos que concordar com kalache. Nós que estudamos e atuamos com esta temática há 20 anos podemos dizer que não estamos preparados, não pelas políticas que aí estão, mas sim pela falta de compromisso, de vontade política de concretizá-las. Já repetimos aqui diversas vezes a pergunta: o que faz uma política dar certo? Por que a política anti fumo deu certo no país e é exemplo para o mundo? Porque houve vontade política. E é isso que falta em relação às políticas existentes em relação ao envelhecimento. Uma das hipóteses pode ser o idadismo que habita em cada um de nós e outra o significado que damos à velhice. Se ela não tem sentido, por que vamos investir nela? Eis uma questão que deixamos como reflexão.