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Entrevista com Antônio Carlos Arruda. Na luta pela igualdade!

perfil de Antônio Arruda, ativista antirracista

Antônio semeou uma nova cultura, mudou comportamentos e salvou vidas!


Arruda já é considerado um velho parceiro, sempre disposto a multiplicar seu conhecimento e o ativismo antirracismo. É assim que eu o reconheço desde nosso primeiro encontro, no ano de 2016, quando uma amiga em comum o indicou para falar sobre o tema “racismo” na empresa em que eu atuava no RH.

De lá para cá, suas experiências trazem ainda mais contexto e força para uma luta que não tem idade. Ele vem nos mostrar a sua potência, que aumenta cada dia mais, nutrida pelo ideal de igualdade.

Durante a entrevista, em diversos momentos pensei: Quanto pioneirismo! Quantas oportunidades ele plantou com ações que hoje estão florescendo! Semeou uma nova cultura, mudou comportamentos e salvou vidas!

Silmara: Como você enxerga a oportunidade de envelhecer?
Antônio: Uma grande oportunidade, principalmente por eu ser um homem negro, nascido e criado na periferia de São Paulo. Estou com 72 anos de vida e consegui me graduar, pós-graduar e tive a oportunidade de estudar no exterior. Isso é muito raro, pois fui um homem que viveu o período da ditadura militar, momento aquele em que foi criado um aparelho de regressão civil da polícia militar. Todos os instrumentos de repressão criados pela ditadura militar se voltaram para atacar pretos e pobres. Estou vivo e bem, produtivo e com projetos para participar ainda mais da política.

Em seu papel de advogado e de professor, quais mudanças julga serem mais significativas com o passar do tempo e com a maturidade?
O papel de advogado já desempenho há 43 anos, e o de professor lecionei durante dez anos em universidades, na polícia militar e na segurança pública do Distrito Federal. O tempo foi importante, fui adquirindo maturidade e, com isso, fui tendo uma visão sistêmica e compreendendo o racismo que vem dos segmentos não negros e não indígenas “pra cima” das nossas comunidades, tendo uma visão da geopolítica internacional.

Foi a partir das minhas experiências que, junto com o juiz federal Fábio Esteves, criamos um curso de enfrentamento ao racismo, abrangendo todas as categorias de policiais do Brasil. Hoje este material está disponível na plataforma do Ministério da Justiça. Esse curso foi demandado logo após o caso do homicídio do dentista Flávio Sant’Ana, ocorrido em 2004. Esse foi o 1º curso que aborda a questão racial e passou a fazer parte da grade curricular da formação dos policiais de todo o Brasil.

No Geledés¹ – Instituto da Mulher Negra – você estruturou o primeiro trabalho jurídico de combate ao racismo no Brasil. Como foi desenvolver um trabalho tão importante socialmente e quais marcas ele deixa em sua história?
Foi como desenvolver um filho que eu carrego até hoje. Ele caminha independente, faz um tempo que não advogo por lá. Quando vejo os advogados fazendo o enfrentamento nos tribunais e vejo os negros profissionais das comissões de igualdade racial que temos na OAB, sinto muita alegria. Penso: nessa obra quem assentou o primeiro tijolo foi eu. Fico satisfeito de vê-la se consolidar. Deixou na minha história uma marca indelével.

Além desse marco, tive a honra de participar do primeiro conselho da comunidade negra que se instalou pela primeira vez em 1984. Na semana passada celebramos 40 anos de existência, sendo o primeiro órgão de política pública desde a abolição. Na época fui nomeado pelo governador para criar este conselho.

Em 2011, você assumiu a coordenação de políticas para a população negra e indígena da Secretaria de Justiça e Defesa da Cidadania de São Paulo. Nesse momento você deixou a posição de cidadão para se tornar membro do poder executivo. Como foi assumir esse papel?
Foi a primeira oportunidade de trabalho organicamente com os negros e indígenas, momento importante para a construção de muitas políticas públicas como a criação de financiamento, construção de casas para os quilombolas e para os indígenas, dentre outras.

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Qual sentimento lhe vem com esse resultado?
Vem o sentimento de alegria junto com a responsabilidade. Fui reconhecido pelo trabalho e logo na sequência veio a elaboração do curso de combate ao racismo com a polícia militar.

Nos papéis já citados você esteve diretamente ligado ao combate ao racismo. Sabemos que esse mal gera tanto a desigualdade e violência psíquica, quanto a violência física. Como você vê ele afetando a população preta que já chegou na velhice?
Na minha faixa etária, infelizmente, vejo muita gente com cicatrizes. Pessoas que perderam o filho por morte provocada pelos agentes públicos. Muita mágoa por não verem seus filhos se formarem e ainda outros passando por dificuldades financeiras. A marca da desigualdade e do racismo estrutural estampada na pele e na memória.

No documentário “Quantos dias. Quantas noites”, Sueli Carneiro², em sua participação, cita que, ao pensar no envelhecimento, a primeira pergunta que lhe vem é: “Como falar de longevidade num contexto em que o primeiro direito ameaçado é o direito à vida e que o desafio é chegar à idade adulta e ao envelhecimento?” Uso da pergunta dela para saber mais sobre o que você pensa sobre isso.
Sou um sujeito de sorte, mas nós temos como primeiro desafio a sobrevivência. Nossa vida está em risco constante. Se observarmos os desastres ambientais recentes, evidencia-se as diferenças. São os negros e indígenas que sofrem o racismo ambiental. Brancos ricos que exploram a madeira, fazendo sofrer quem está na outra ponta. É assim que acontece. Concordo com a Sueli Carneiro. Não tenho o mesmo brilhantismo dela, mas sinto a mesma coisa.

Falando de direitos e do envelhecer, qual recado você deixa aqui hoje?
Para as pessoas da minha geração, digo: Ainda somos fortes e por isso temos que ser produtores de nosso envelhecimento, inclusive para os jovens. Nós não desistimos nunca, seremos sempre combatentes. Nosso dever é lutar por qualidade de vida e moradia, buscando a igualdade social, racial e de direitos.

Notas
(1) A Geledés – Instituto da Mulher Negra é uma organização política brasileira de mulheres negras contra o racismo e sexismo, tendo como principal objetivo erradicar a discriminação presente na sociedade que afeta indivíduos com essas características, sem desencorajar a luta contra todas as restantes formas de discriminação, tais como a homofobia, a discriminação baseada em preconceitos regionais, de credo, opinião e de classe social, tendo em vista que todos os alvos de discriminação são afetados pela iniquidade que tende a restringir a fruição de uma plena cidadania. Seu nome deriva do conceito de Guelede, sociedades secretas femininas na cultura iorubá ( https://www.geledes.org.br/).
(2) Sueli Carneiro – Aparecida Sueli Carneiro é uma filósofa, escritora e ativista antirracismo do movimento social negro brasileiro. E fundadora e atual diretora do Geledés — Instituto da Mulher Negra – e considerada uma das principais autoras do feminismo negro no Brasil.

Serviço
Instagram: https://www.instagram.com/arruda_ac/

Fotos: arquivo pessoal de Antônio Carlos Arruda


Silmara Simmelink

Psicodramatista formada pela Associação Brasileira de Psicodrama e Sociodrama. Psicóloga graduada pela Universidade São Judas Tadeu. Especialista em Gerontologia pelo Albert Einstein e fez curso de extensão da PUC-SP de Fragilidades na Velhice: Gerontologia Social e Atendimento. Pós graduada em psicanálise pela SBPI e Sociopsicologia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de SP. Atua em clínica com abordagem psicodramática e desenvolve oficinas terapêuticas com grupos de idosos. É consultora em Desenvolvimento Humano e especialista em psicologia organizacional titulada pelo CRP/SP. E-mail: ssimmel@gmail.com

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