Conversas e memórias – narrativas do envelhecer

“Conversas e memórias – narrativas do envelhecer”, de Gonçalo Luiz de Melo e Adriana Rodrigues Domingues, traz à tona um trabalho inovador realizado com grupos de idosos da zona leste da capital paulista.

Clara Comunicação *

 

conversas-e-memorias-narrativas-do-envelhecerO livro (editora Via Lettera) registra os passos do trabalho iniciado em 2002 no Centro de Referência do Idoso (CRI) de São Miguel Paulista, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, e vai além, ao reproduzir histórias narradas por seus participantes (na forma de crônicas e texto teatral) e uma análise, à luz da Psicologia Social, sobre as repercussões na saúde e bem-estar dos envolvidos.

Convidado pela professora Elza Lobo, coordenadora da Ouvidoria da Secretaria de Saúde, a introduzir o projeto “Conversas e Memórias” no rol de atividades culturais e educacionais do CRI, o autor Gonçalo de Melo quis fugir à tradicional fórmula “baile-bingo-bolinho” para propor o exercício da conversação.

Seu objetivo era provocar a revelação de histórias que levassem os idosos a repensar suas trajetórias e dar novos significados à atual fase de suas vidas. As conversas eram estimuladas com a leitura de notícias, poesias, crônicas e até idas ao cinema e ao teatro em grupo.

Os encontros, acompanhados de perto pela psicóloga Adriana Domingues, foram transformados em tese de doutoramento defendida por ela na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que tem alguns capítulos reproduzidos na parte 1 do livro.

A experiência e as transformações?

Adriana mapeou cuidadosamente os efeitos do que ela chama de “experiência comunitária” do grupo, e as transformações produzidas nas vidas de seus integrantes, em geral com histórico de muita pobreza e sacrifícios. Os encontros, marcados pela cumplicidade, produziam momentos de alegria, mas também de choro contido, tensão, tristeza.

A autora colheu expressões e depoimentos emocionantes, como o da idosa-personagem, Marcolina: “Será que uma pessoa analfabeta pode escrever poesia? Porque tem tanta coisa que passa pela minha cabeça que eu queria escrever, mas não sei”.

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Ou de outra integrante, Tereza: “O grupo me ajudou a perder a vergonha de existir e sair de casa”. De Cidinha: “Entendemos que temos liberdade para caminhar, o direito de expressar nossas opiniões e que podemos ser ouvidos”. E mesmo o de Dalvina: “Aqui neste Centro, virei gente de verdade”.

O resultado é material riquíssimo para reflexão. Ao revelá-lo, o livro pretende estimular a criação de outros grupos de idosos com proposta semelhante. E mostrar um caminho possível para uma vida mais plena aos 70, 80, 90 anos, em um País cuja população está envelhecendo rapidamente. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 7% dos brasileiros têm mais de 65 anos, porcentagem que deverá se elevar para 18% em 2050.

A vida vira arte

Nas suas partes 2 e 3, o livro é dedicado às crônicas inspiradas nas histórias surgidas ao longo do trabalho e ao texto teatral baseado em sete dessas crônicas.

O prefácio das crônicas coube ao escritor João Silvério Trevisan, autor de vários livros, entre eles o premiado “Ana em Veneza” (Editora Best Seller). O do prefácio do texto teatral é assinado pelo diretor e dramaturgo João das Neves, fundador do Grupo Opinião nos anos 1960, autor de inúmeras peças, entre as quais “Besouro Cordão de Ouro” e “As Polacas – Flores do Lodo”, para citar duas das mais recentes.

João das Neves foi quem levou o tema ao grupo Alziras, que se interessou em transformá-lo em espetáculo teatral. “Conversas e Memórias”, a peça, permaneceu em cartaz durante o mês de dezembro de 2009 no Teatro Denoy de Oliveira, em São Paulo.

O projeto hoje?

Os grupos continuam a realizar o trabalho. O projeto é mantido no CRI de São Miguel Paulista, que mudou o nome para Instituto Paulista de Geriatria e Geriatria – IPGG, e no MandaCRI, no bairro do Mandaqui. Aproximadamente 50 idosos participam. ?Em 2011, com o apoio da Lei de incentivo estadual – ProAC foram realizadas 120 oficinas utilizando a mesma metodologia do projeto Conversas e Memórias, no IPGG – Instituto Paulista de Geriatria e Gerontologia de São Miguel Paulista; com os residentes do Lar da Velhice Desamparada (da Associação Espírita Bezerra de Menezes), em Itaquaquecetuba; e com a comunidade de japoneses idosos do Ikoi-No-Sono (da Associação Dom José Gaspar), em Guarulhos.

Os autores

Gonçalo Luiz de Melo – Advogado, com atuação há mais de 30 anos na área de família, é também arte-educador e possui formação em psicanálise. Autor de “Os olhinhos da jabuticabeira – contos da infância” (2012), resultado do trabalho sobre memória e invenção, com mais de 80 idosos da zona norte e leste da cidade de São Paulo. Desenvolve projetos culturais, especialmente com idosos. Coordena o projeto “Em tarde Ser”, com um grupo de idosos japoneses da Assistência Social Dom José Gaspar – Ikoi-no-sono – em Guarulhos.

Adriana Rodrigues Domingues – Psicóloga e docente na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, tem como prioridade profissional trabalhar a relação entre saúde coletiva e psicologia comunitária. Desenvolve projetos de pesquisa e intervenção voltados à análise e mapeamento de experiências comunitárias.?

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