Consumo dos idosos, só a mídia (ainda) não sabia…

Se antes o tema central da mídia era jovens em conflito, potencial inquietante do futuro, ou os gastos da “velhice”, hoje parece que ela “acordou” para a existência dos idosos, não como fardo, mas como consumidor. Não exatamente aqueles do passado que temos gravado no nosso imaginário – ‘o senhor com uma bengala na mão e de costas curvadas ou a senhora sentada na cadeira de balanço tricotando para os netinhos’.

 

 

consumo-dos-idosos-so-a-midia-ainda-nao-sabiaVivemos hoje um cenário muito diferente disto, embora reconhecemos que a imagem retratada ainda persiste, mas outra está se impondo e com isso mudando a paisagem da nossa velhice, anunciada há muito tempo. Basta ver o espaço reservado pelo Jornal ‘Folha S.Paulo’, do dia 10 de junho, ao potencial de mercado dos idosos, considerado agora como “um novo segmento” da população e não apenas como peso.

Na mesma semana um artigo da revista Exame e mais três matérias do mesmo jornal falam do consumo dos idosos, e aí chegamos numa questão fundamental: Será que a mídia descobriu finalmente que cresce, a passos galopantes, o número de idosos e como consequência desse efeito, cresce na mesma proporção seu consumo? Será que a mídia achava que ao ser velho a pessoa deixava de existir e não consumia mais? Será ainda que achava que nossos desejos morrem porque envelhecemos?

Uma das matérias assinala que “São 22,3 milhões de pessoas, das quais 5,4 milhões ainda estão no mercado de trabalho, com ou sem carteira assinada. Apesar desse potencial de consumo, o varejo ainda dá pouca atenção à chamada terceira idade”.

Na verdade, até então, esse varejo nem se dava conta que o país envelheceu e que hoje, por força de múltiplas exigências, sejam elas oriundas da necessidade financeira até da almejada qualidade de vida, esses senhores e senhoras trabalham, são produtivos, querem viajar, namorar, dançar, ou seja, desfrutar de tudo que o dinheiro de seu trabalho ou de sua aposentadoria, ou ainda o tempo livre, pode proporcionar. E por que não?

Gilberto Cavicchioli, professor do Núcleo de Gestão de Pessoas da ESPM, em declaração à imprensa confirma: “Só recentemente o comércio começou a se preocupar de fato com hábitos e costumes desse consumidor e a treinar seus funcionários para atender esse pessoal”.

Renato Meirelles, diretor e sócio do Data Popular sugere uma possibilidade: “Para conquistar um consumidor com experiência e dinheiro no bolso, o varejo precisa investir em serviços”.

Antonio Carlos Borges, diretor-executivo da Fecomercio SP fala também à imprensa sobre esse perfil de consumidor desconhecido para o varejo: “A redução acelerada da taxa de natalidade e o aumento significativo da expectativa de vida, associados à migração de consumidores das classes D e E para outras, mudam a dinâmica do consumo. As famílias gastam mais e melhor e o varejo tem de se preparar para atender essa demanda”. Isto é, agora só falta o varejo despertar, mas não só ele, profissionais do designer, da arquitetura, engenharia, programadores e desenvolvedores de softwares, das exatas, educadores, filósofos, religiosos, estilistas, enfim, todos são chamados a pensar em produtos e serviços para estes consumidores. Além de hotéis, companhias aéreas, parques de lazer e, claro, também as diversas instâncias dos governos nos mais diversos setores.

Poder da internet

Um dos artigos cita o caso da enfermeira aposentada Sueli Monteiro Carvalho, 55, que arriscou e montou sua loja virtual do Magazine Luiza, no Facebook. Ela não imaginou o poder que a internet tem na construção das relações e muito menos quem faria parte de sua “carteira” de clientes.

Com a criação do ‘novo negócio’, um grupo de senhoras, de 70 anos para cima, decidiu fazer compras pela primeira vez pela internet. Segundo ela, “Começou com minha mãe, de 80 anos. Ela ficou feliz quando o produto foi entregue em sua casa, em seu nome”. Depois vieram primas, tias e até a sogra pedir ajuda de Sueli para comprar produtos vendidos pela rede social.

Mas há quem prefira as compras no mundo real. É o caso das amigas Elza Pires Paes Gonçalves, 65, e Wanda José Vieira, 67, entrevistadas pela imprensa. A professora aposentada Wanda relata o seguinte: “Sou louca por ouro. Tenho umas 200 peças, entre brincos, anéis e correntes. Sempre que preciso de um reforço no orçamento recorro ao penhor e depois recupero minhas joias”.

Ela declarou à imprensa que usa seus cinco cartões de crédito, os empréstimos consignados e os bicos vendendo doces e salgados. Wanda já circulou por muitos lugares em viagens e excursões. Elza, coordenadora de um centro de convivência para a terceira idade, prefere as bolsas, os sapatos e as viagens de navio, e confessa: “Mas até piquei o cartão de crédito para não ficar endividada”.

O que isso significa? Que todos nós temos desejos e não importa a fase da vida. Queremos é viver, portanto, um varejo inteligente precisa de mudanças, treinamento e, acima de tudo, ouvir a demanda daqueles que o acessam cada vez mais.

Christine Pereira, diretora comercial da Kantar Wordpanel falou à imprensa sobre esse sutil, mas importante aumento do poder aquisitivo dos idosos: “Na faixa a partir dos 60 anos, constatamos que a renda média está 7% acima do gasto médio mensal. Nas demais faixas etárias, o gasto se equipara à renda ou está acima do rendimento”.

De olhos nesse mercado e acompanhando os números, a rede Magazine Luiza faz promoções específicas ao menos três vezes ao ano: o Dia do Aposentado. Dos 6 milhões de clientes da rede, 13% têm 60 anos ou mais. São quase um quarto dos chamados “clientes Ouro” – aqueles que fazem cinco compras ao ano e cujos gastos somados chegam a R$ 2.000, no mínimo.

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Rogério Bruxellas, diretor de marketing do Magazine Luiza explica: “Há uma mudança de comportamento nesse consumidor, que hoje já tem uma convivência mais amigável com celular, com computadores. Há cinco ou seis anos essa proximidade com a era da informática era impensável nessa faixa etária”.

Iniciativas

Claudio Felisoni, presidente do Ibevar opina que “Para conquistar esse público, o varejo deveria incentivar o uso de cartão da loja (cartão fidelidade), uma vez que 65% dos pesquisados entendem que ser fiel é vantajoso”. E Renato Meirelles, do Data Popular complementa: “Os mais velhos são conservadores com relação a marcas e locais de compra. Conquistar esse público não é fácil, por outro lado é garantia de clientela fiel”.

Outra iniciativa que o varejo deve estar atento, segundo Felisoni é: “Organizar promoções para esses consumidores aos finais de semana para estimular as compras também aos sábados e domingos”.

O professor Juracy Parente, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV e professor visitante da Universidade da Flórida diz que “Nos Estados Unidos, o tratamento específico para esses consumidores é muito maior. Hotéis, companhias aéreas, parques de lazer investem em ações para os seniores porque sabem que esse público tem mais tempo para atividades”.

Mas, para que tudo isso possa ser viabilizado, é preciso se livrar de ideias e conceitos sobre os idosos que já não funcionam mais e finalmente se dispor a conhecer esse mercado que pode e muito ensinar o varejo a trabalhar de forma mais digna, respeitosa e ainda obtendo os sonhados lucros.

É compreensível que o mercado pense: Como entender e atender esses “novos” consumidores? E a afirmação que não quer calar: esses idosos não se sentem velhos, entendendo estes como doentes, caquéticos, ou tomados por uma fragilidade paralisante. A maioria deles tem doenças crônicas, e até câncer, mas a vida continua e com ela os desejos. Não querem entrar numa loja e ouvir “a mocinha” dizendo: “A senhora quer que eu pegue uma cadeira para descansar?”.

E as ironias não param por aí. O uso de eufemismos como “melhor idade” é uma delas e em seguida, claro, não poderia deixar de vir a exclamação: “Melhor idade é quando eu tinha 20 e poucos anos!”.

Força da experiência

“Hoje em dia, pessoas perto dos 70 anos não têm cara de velhinha de bengala! Afinal, foram culturalmente ativos e pioneiros: viram o homem pisar na Lua, viveram como hippies, atuaram na liberação feminina, viveram o regime militar, a revolução sexual, a revolução da informática e da internet, entre tantas outras modificações. Para eles, a idade é um estado de espírito, e não um número”, afirma à imprensa Maurício Morgado, professor da FGV e especialista em marketing e varejo.

Outra diferença fundamental para Morgado, é que nesse grupo, o que vale, são as motivações pessoais: “Entre os 20 anos e os 40 anos, as pessoas sentem-se imortais. O esforço pessoal é focado em ser alguém e a sensação geral. Acredita-se que é possível moldar o mundo às nossas necessidades”. Nessa fase somos e nos sentimos poderosos, temos tempo para consertar os eventuais erros ou escolhas equivocadas. Tudo parece ser possível e qualquer meta se torna atingível diante de tanta motivação e gana.

Mas como complementa o professor, “Depois dos 40 anos, percebe-se que a realidade não é tão boa assim e as pessoas iniciam uma busca por significado na vida que se estende até seus últimos dias. De maneira geral, até os 40 o foco é no ‘ser social’. Depois dessa idade, o foco passa a ser o ‘eu interior’”.

Assim seguimos, talvez em busca do que realmente somos. Essa viagem, assim o desejamos, que seja longa e renda muitos aprendizados. Quem for esperto e tiver uma boa escuta, ficará ligado nessa “delicada demanda” e saberá oferecer produtos e serviços que satisfaçam verdadeiramente essa necessidade que um dia certamente será nossa!

Referências

EXAME (2012). Estudo traça o comportamento da Geração A. Disponível Aqui. Acesso em 11/06/2012.

MORGADO, M. (2012). Lojas não sabem aproveitar o potencial de consumo de idosos. Disponível Aqui. Acesso em 11/06/2012.

ROLLI, C. (2012). Cresce potencial de consumo dos idosos. Disponível Aqui. Acesso em 10/06/2012.

ROLLI, C. (2012). Renda da 3ª idade é maior que os gastos. Disponível Aqui. Acesso em 10/06/2012.

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