Para todos que ainda sentem saudades, que ainda guardam um maluco beleza e uma maluca beleza dentro de si… Ao meu pai, a todos os pais, segue minha homenagem.
Meu pai, dá-me os teus velhos sapatos manchados de terra
Dá-me o teu antigo paletó sujo de ventos e de chuvas
Dá-me o imemorial chapéu com que cobrias a tua paciência
E os misteriosos papéis em que teus versos inscreveste.
Meu pai, dá-me a tua pequena chave das grandes portas
Dá-me a tua lamparina de rolha, estranha bailarina das insônias
Meu pai, dá-me os teus velhos sapatos. (Vinicius de Moraes)
Sei que já faz muito tempo, acho que mais de uma vida bem vivida, isso se contarmos pelos anos que seguiram seu curso. Não importa, mesmo assim tenho pena do não partilhado, da falta dos abraços do meu pai, das palavras não ditas, dos olhares não trocados, das broncas não dadas, enfim… mesmo hoje ainda sinto aquela dor, que nem nome tem, silenciosa, discreta, vazia.
Fico imaginando, aqui na minha fantasia, como você está. Na minha lembrança, ainda é um jovem de pele morena, de cabelos pretos, ralos, um tanto gordinho, de sorriso fácil, braços acolhedores: bom, um ser humano dos melhores que Deus já colocou nesse mundo.
Você pode até dizer que sou suspeita, já que sou filha, mas que nada… ele era tudo de mais generoso, encantador, alguém que guardava uma profunda indignação às diferenças, aos preconceitos, uma pessoa que realmente se importava com o outro e que de fato fazia em favor daqueles que mais necessitavam.
CONFIRA TAMBÉM:
Talvez este mundo não fosse o seu, não fosse talhado para o homem que você era. Havia uma certa ou total inadequação, um inconformismo que se manifestava nos menores detalhes, um cansaço dos dias, da falta de reconhecimento, de oportunidade, do medo de não prover.
Nutro a esperança, alimentada a cada instante: quem sabe você ainda exista em um mundo paralelo e lá, estamos juntos, lá celebramos os dias, todos os dias, lá envelhecemos juntos, eu, você, a mamãe e todos os nossos queridos e queridas.
Lá, vamos ao circo e damos boas risadas com um palhaço sem noção, com a mágica do invisível e a “ciranda da bailarina” toda encantada, perfeita, inocente.
“Confessando bem, todo mundo faz pecado, logo assim que a missa termina, todo mundo tem um primeiro namorado, só a bailarina que não tem […]”.
Lá tem algodão doce, tem pipoca, tem brincadeira, tem carinho, tem seu colo, tem magia.
Sim, lá teria até Jô Soares no delicado ”Doce, Doce… viver no Planeta Doce”.
E, de repente, apareceria, na calada da noite um tal carimbador maluco e… Plunt Plac Zum, não vai a lugar algum!
Que nada… Pegaríamos o primeiro foguete e rumo a imensidão do universo, sem selo, sem registro, sem carimbo.
Voaríamos… retornaríamos no tempo, 1969: destino Lua, com algumas paradinhas no nosso planeta Sol. E não é que estou gostando mesmo dessa prosa? Ah, o que eu queria mesmo era ir com você, sabe-se lá para onde.
Mas já que eu não posso…
Boa viagem, até outra vez, e se você quer saber: aqui está tudo bem.
Agora, o Plunct Plact Zum pode partir sem problema algum
Para todos que ainda sentem saudades, que ainda guardam um maluco beleza e uma maluca beleza dentro de si.
Ao meu pai, a todos os pais, a ele que, além de ser o meu amor, é um lindo pai, amoroso, dedicado, gentil… entre todos os homens-pais, eu o escolheria.
Referências
Balão Mágico: https://www.youtube.com/watch?v=FIGyvd0amvI
Ciranda da bailarina: https://www.youtube.com/watch?v=DP4jqyVGjMM
Foto destaque de Juan Pablo Serrano Arenas/Pexels.