Após um afastamento voluntário de pouco mais de três anos —desde Esperança, na Globo — Beatriz Segall (80) cedeu aos convites da Record e aceitou voltar à TV. Em Bicho do Mato, ela brilha como a matriarca Bárbara, um papel diferente, como desejava, daquele que a consagrou no gênero. A atriz não nega o orgulho de ter interpretado Odete Roitman, que se transformou em sinônimo de vilã. Mas não esconde que a personagem da novela Vale Tudo se tornou um fardo. “Foi um presente maravilhoso, mas já tem quase 20 anos e as pessoas continuam me chamando de dona Odete. Eu não agüento mais”, desabafa ela, cheia de disposição para encarar desafios. “Nos últimos anos não houve nada que me chamasse atenção na TV, enquanto no teatro tive excelentes textos, como Três Mulheres Altas e Quarta-feira, Sem Falta, Lá em Casa. Não quero mais interpretar uma vilã. Quero que os autores mexam com a imaginação deles e me ajudem. E agora me pareceu que a Record estava querendo fazer um bom produto”, justifica. Além do teatro, Beatriz vinha dedicando mais atenção à maior desuas paixões, a família: os netos Pedro (20), João (13), Fernando (9), Joaquim(9), Olívia (7), Francisco (6) e Julio (1), e os filhos Sérgio, Mário e Paulo, do casamento com Maurício Segall (80) — filho do pintor Lasar Segall (1891-1957) — de quem se separou em 1982.
Carlos Lima Costa
– Você é uma grande matriarca, como sua personagem?
– Ela é uma chata. Eu não mando nada. Toda vida, fiz a vontade dos outros. Desde criança, a família é a razão de ser da minha vida. Fui uma mãe presente, fiquei 12 anos sem trabalhar para criar os filhos. Mas não sou muito exigente, nem exigida. E tenho sete netos que eu adoro, com os quais eu só brinco, levo para passear, mas não tomo conta de jeito nenhum. E aproveito todas as possibilidades para ensinar algo. Eu os levo muito a museus e eles estão ficando cansados (risos). Mas é importante. Desse ponto de vista, sou uma avó parecida com a dona Bárbara.
– Por ter sido professora, acaba sendo didática?
– Sou absolutamente didática. Faço o possível para não ser antipática, mas, no trabalho, sempre que posso, passo algo adiante. E sinto que os jovens atores gostam.
– Como é o seu cotidiano?
– Moro em São Paulo, onde vive a minha família. E venho ao Rio para trabalhar ou quando sinto saudade. O dia ideal é aquele em que acordo e não tenho nenhuma obrigação. Então, se quiser eu saio, fico em casa lendo, fazendo tricô…
–Você não quis casar outra vez?
– Há anos procuro um velhinho rico, mas não encontrei (risos). Nem mesmo achei um pobre que valesse a pena.
– Leva uma vida solitária?
– Não tenho solidão. Aprendi que sou excelente companhia para mim mesma. Sei aproveitar o tempo. E me sinto feliz de não depender dos outros para viver.
– Até pouco tempo você não revelava a idade. Por que mudou?
– Tenho um princípio de que ator não tem idade. No momento que o público sabe que você já fez 60 anos, você não pode mais interpretar uma mulher de 30. E muitas vezes poderia. Mas agora é uma grande data. Em 25 de julho fiz 80. Não é comum chegar à essa idade com a saúde e com a vontade de viver que eu tenho. E também não quero mais interpretar as moças ingênuas (risos).
– E quais as melhores lembranças dessas oito décadas?
– Ah, minha primeira viagem à Europa, meu casamento, o nascimento de cada um dos meus filhos e a minha carreira repleta de bons trabalhos como a peça Frank V, de Friedrich Dürrenmatt, e as novelas do Gilberto Braga, Vale Tudo, Água Viva e Dancin’ Days, as melhores coisas que fiz na TV.
Fotos: Fernando Lemos
______________________________
Fonte: Revista Caras, Ed. 671 – Ano 13, N. 37, de 15/09/2006