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Além de saber o quanto foi gasto, é necessário saber o que mudou à sociedade tal gasto?

Com o esclarecimento complementar ao valor gasto, nós, a sociedade, podermos avaliar se tal gasto melhorou ou não a nossa vida. Teremos aí uma melhor capacidade de avaliação, quando soubermos quais metas físicas foram atingidas e quais não foram.


No dia 14/08/2019, o jornal Folha de S.Paulo noticiava: “Bolsonaro gasta só 6,5% de recursos previstos para segurança até agora” para logo depois da manchete, destacar na retranca: “Fundo de área prioritária para o governo só liquidou R$ 113 mi de R$ 1,7 bi planejados para o ano”.[1]

A abordagem da Folha poderia ir além. Deveria, mais ainda não é um ponto tido como referencial a análise orçamentária no Brasil ir além do valor gasto e do tipo do gasto (se obras, desapropriações, compras de material permanentes e equipamentos, ou de material de consumo ou de distribuição gratuita, como medicamentos, ou então, contratação de consultorias ou de serviços de pessoas jurídicas ao Governo).

Ainda é bastante comum pelo Brasil uma análise ainda da metade do século 20, quando se olhava apenas onde e quanto era gasto do orçamento público. Por outro lado, alguns países já tratam do tema orçamentário de uma forma diferente, desde a metade da última década do século passado.

Lá, o Governo é obrigado (ou “incentivado” pela pressão popular) a mostrar mais do que uma série infindável de códigos e nomenclaturas repletas de tecnicismo ou de uma prolixidade político partidária-ideológica. Lá eles precisam demonstrar o que foi transformada em uma realidade local ou para uma parcela da população (como a população idosa, por exemplo). Ou seja, busca-se de forma sistemática comprovar que o gasto do dinheiro público terá um fim específico para melhorar a vida do cidadão, que na condição de contribuinte, tem o direito de saber de forma acessível, rápida e simples, onde e quanto foi gasto, mas principalmente o que tal gasto resultou em benefícios à qualidade de vida daquelas pessoas.

No Brasil, as lideranças do Poder Executivo Federal, ainda em época de campanha eleitoral, apontaram como sendo uma das principais diretrizes do Governo, se eleitos, a segurança pública. Pelo voto direto, a maior parte da população brasileira que foi votar, escolheu tal governo. Logo, é absolutamente compreensível que se tivesse como eixo estruturante desse mesmo governo que fossem realizadas políticas públicas. Eu não vejo como políticas públicas possam sair do papel e se transformar em realidade sem a elas houver um aporte de recurso orçamentário.

A reportagem jornalística – e daí a importância de uma imprensa livre, para levar ao cidadão informações relativas à gestão governamental dos Três Poderes -, apontou um baixo desempenho na execução orçamentária de um dos pilares governamentais. Em que se pese a Lei Orçamentária Anual de 2019 da União ter sido planejada ano passado, em 2018, por um outro grupo do Poder Executivo Federal, o atua Presidente e seus Ministros podem, por previsão legal, alterar parte de uma Lei Orçamentária.

Há previsão legal para tal e é algo absolutamente compreensível de ser feito, apesar de um dos ícones orçamentários em todos os tempos, Aaron B. Wildavsky[2], ter demonstrado que o orçamento tem uma característica de certa imobilidade, com pequenas mudanças incrementais (e não grandes “revoluções”. Para ele, o orçamento tinha uma característica “evolucionária”: pequenas mudanças com o passar do tempo, já que as forças políticas superavam as forças técnicas.

Então, apesar de certa “imobilidade” orçamentária, já que a maior parte do recurso público está direcionado a ações pré-estabelecidas, há sim possibilidades de ajustes, por menores que sejam. Entretanto, por vezes, o valor liquidado[3] da despesa pública (correspondente à fase em que tal despesa já foi faturada pelo contratado pelo Governo e ao Governo apresentada, com um agente público atestando que aquela despesa ocorreu e agora precisará ser paga).

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Um baixo desempenho na execução orçamentária merece um esclarecimento por parte de quem está no Governo. Pode haver justificativas para tal situação. Geralmente há, mas por vezes, tal situação aponta claramente à necessidade de aperfeiçoamento da própria gestão. Descobriremos isso quando o Governo nos explicar o que fez com os 113 milhões de reais entre o R$ 1,7 bilhão  planejado à LOA 2019 da União.

Então, com o esclarecimento complementar ao valor gasto, nós, a sociedade, podermos avaliar se tal gasto melhorou ou não a nossa vida. Teremos aí uma melhor capacidade de avaliação, quando soubermos quais metas físicas foram atingidas e quais não foram. Saberemos então se o que foi dito no período eleitoral está ou não sendo cumprido depois dos governantes terem sido eleitos. Além de saber o quanto foi gasto, é necessário também saber o que mudou à sociedade com aquele gasto.


[1] Para conferir a matéria na íntegra, visite https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/08/bolsonaro-gasta-so-65-de-recursos-previstos-para-seguranca-ate-agora.shtml?utm_source=twitter&utm_medium=social&utm_campaign=twfolha.

[2] O autor tem muitas publicações, mas, infelizmente, poucas no idioma português. Uma literatura recomendada para quem compreende o idioma inglês está disponível no endereço https://www.cambridge.org/core/journals/american-political-science-review/article/theory-of-the-budgetary-process/03E867D70A5B952EC083092E8410ECE2.

[3] As fases da despesa pública estão estabelecidas na Lei n. 4320/1964: empenho, liquidação e pagamento.


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Luiz Carlos Betenheuser Júnior

Graduação em Administração (UFPR); pós-graduação/especialização em Gestão Administrativa e Tributária (PUC-PR) e em Administração Pública pela Escola de Administração Pública (EAP / IMAP). É funcionário público municipal, 25 anos de experiência, sendo dois na área administrativa e os outros 23 anos na área financeira. Tem experiência na área de Administração, com ênfase em Administração Pública, especialmente na área Financeira, na gestão orçamentária (execução, planejamento e controle social). Foi integrante do Conselho Consultivo do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba - IPPUC (2003); do Conselho Municipal de Assistência Social (2013 e 2014); Vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Curitiba (2015) e por duas vezes presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Curitiba (2014 e 2016); integrante do Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente de Curitiba (2017). Atualmente é coordenador financeiro da Secretaria Municipal de Administração e de Gestão de Pessoal e da Secretaria Municipal de Esporte, Lazer e Juventude.

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