Vovô

Vovô

Um dia ele disse que estava cansado e se recolheu mais cedo.  Eu fui para casa e no dia seguinte mamãe disse que vovô Artur tinha entrado no sono eterno.

Marie Claire Blatt (*)

 

Quando ele nasceu, a casa de campo de Jacareí já não existia e nem o sobradinho de Pinheiros.
A chegada dele foi a sua alegria. A partir daquele momento a sua vontade de viver encontrou um objetivo.
O seu neto. A sua maior alegria, este pequenino ser com as suas mãozinhas firmes e dedinhos fortes.  O primeiro sorriso para ele, o avô! Emocionante.

Cresci,  tendo o meu avô como pai.  Eu já tinha seis anos quando me levava nas tardes de domingo a lugares incríveis.  O que mais me marcou foi o parque onde eu corria para pegar os pombos, o lago que tinha cisnes e peixinhos coloridos a quem eu jogava migalhas de pão para ver como vinham na minha direção batendo uns contra os outros.

Meu avô fez uma pipa azul, branco e vermelho. O dia em que me entregou foi uma grande surpresa.  Ele me mostrou e me ensinou como usar.  Eu ficava em êxtase ao ver como balançava no céu. E meu avô sorria e transpirava.  Debaixo do chapéu, para se proteger do sol se escondia uma careca.  Ele só tinha alguns fios de cabelos nos dois lados.  Quantas vezes eu quis pentear a careca! Coisas de menino traquino.

A gente sentava no banco debaixo das árvores.  Ele tirava o sanduíche do saquinho de papel e o Toddy e, enquanto eu comia me falava das árvores, das plantas e das formiguinhas que passeavam nas folhas. E, eu ouvia com atenção e devorava o lanche.  Então fazia perguntas e meu avô tinha todas as respostas.

Ele segurava minha mão e todo orgulhoso eu olhava para ele como um deus.  Ele sabia tudo!  Quando lhe contava coisas da escolinha, ele ouvia com atenção e me mostrava como é preciso raciocinar.

“Süss schäfele” dizia ele.  Eu soube mais tarde que ele me chamava carinhosamente de “doce carneirinho” em ídish.

Eu crescia, meu avô Artur, era o nome dele, envelhecia.  Mas isto não o impedia de ser o meu melhor amigo. Lembro-me das manhãs de domingo  quando ele me levava na matiné no Cine Ipiranga para assistir Tom&Jerry e o filme dos Trapalhões.

Neste dia eu tinha direito a tudo, batata frita, doce de algodão, balas, chocolate e o mais gostoso, um lanche no MacDonald.  Hoje o “Big Mac” tem um significado especial.

Quando completei 13 anos, no meu Barmitzva, ele me conduziu na Torá e me explicou sobre o meu comprometimento para sempre e a ligação espiritual, emocional e intelectual com D’us.  Meu avô, meu grande amigo, sempre me protegendo, sempre me compreendendo e esclarecendo as minhas dúvidas.

Cada dia o rosto dele ficava mais enrugado. Mas eu tinha enorme respeito e amor por ele.

Não posso esquecer as histórias que me contava de noite com um final para refletir.  Meus amigos gostavam muito dele e diziam “O meu vô não é tão pra frentex”.

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Um dia ele disse que estava cansado e se recolheu mais cedo.  Eu fui para casa e no dia seguinte mamãe disse que vovô Artur tinha entrado no sono eterno.

A saudade ficou, mas tenho as fotos como recordação.  Saudades daquele homem tão sábio que soube me mostrar o caminho da vida.

Vovô eu te amo por toda eternidade!

(*) Marie Claire Blatt, 79 anos, natural de Paris, França, entusiasta da vida e eterna estudante. É contadora de suas próprias histórias e crônicas, musicadas, que apresenta para proporcionar lazer às pessoas da terceira idade. Participou da Virada da Maturidade 2016/2017. Pertence ao grupo de danças Israeli da Unibes que se apresenta no Festival Karmel do Clube Hebraica e em outros eventos. Também faz parte do Coral. Frequentou o Curso de Jornalismo, Repórter 60+ para se reciclar e melhorar a expressão verbal e escrita e, assim, poder ser útil. E-mail: [email protected]

Nota da Redação

Esta crônica ilustra o curso que será dado no Espaço Longeviver, chamado “Arteterapia para Avós e Netos: Construindo Avosidades“, com o objetivo de valorizar a relação entre avós e netos por meio da Arteterapia e do aprendizado da História da Arte e do fazer artístico. Inscrições abertas, vagas limitadas.

O curso será realizado às quartas-feiras: 03/04, 10/04, 17/04, 24/04, 08/05, 15/05, 22/05 e 29/05

Horário: 14h30 às 16h
Carga horária total: 12 horas
Duração: 2 meses
Docente: Arteterapeuta Cristiane Pomeran
Local: Espaço Longeviver: Avenida Pedro Severino Junior, 366 – Sala 166 – Vila Guarani (zona sul), São Paulo. Próximo ao metrô Conceição – linha azul
Informações pelo e-mail: [email protected]
Inscrições:  https://edicoes.portaldoenvelhecimento.com.br/produto/construindo-avosidades/

 

 

 

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