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Velhice como uma fase da vida: composta de perdas e ganhos

A pesquisadora Andrea Lopes, antropóloga, doutora em Educação e Gerontologia Educação/Gerontologia (FE/Unicamp), com bolsa sanduíche (CAPES) nos Estados Unidos, atuando como pesquisadora visitante na University of Southern California e no Center for Healthy Aging, inicia entrevista à grande imprensa tratando o envelhecimento da população brasileira e a velhice como temas de atenção pública no país, um processo iniciado em meados do século passado que ainda carece de entendimento do que sejam as diferentes velhices que se apresentam e a complexidade que este processo do envelhecer compreende.

 

 

Andrea Lopes é atualmente docente da USP, na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), no curso de Gerontologia. É vinculada ao Max Planck Institute for Humam Development (Alemanha) como pesquisadora visitante. É colaboradora no projeto Rede Fibra, Pólo Unicamp, que desenvolve pesquisa sobre Fragilidade em idosos brasileiros, do ponto de vista biopsicosocial. É colaboradora da pesquisa sobre Educação Permamente entre idosos financiada pelo INEP-MEC. Recentemente realizou pesquisa no Japão investigando trabalho voluntário realizado por idosos japoneses, em comparação aos idosos americanos e brasileiros, pesquisa desenvolvida no doutorado.

Segundo Lopes, “não existem no Brasil apenas velhos acamados e dependentes ou apenas velhos ativos e independentes, que são mais percebidos como parte da terceira idade do que propriamente a velhice. Deve-se ressaltar que velhos no Brasil são as pessoas com 60 anos ou mais e não há vergonha nenhuma em se conquistar mais uma fase da vida”. Esta compreensão é essencial para que se identifiquem diferenças, particulares nestes indivíduos que demandam por oportunidades sociais, que adquiram vez e voz para expor abertamente suas necessidades e possibilidades. Como afirma a pesquisadora, “não há receitas para envelhecer, mas configurações que devem ser compreendidas e atendidas”.

Propostas para este novo cenário não faltam, muitas até importantes e pertinentes para as questões do envelhecimento. Entretanto o que falta é um processo de acompanhamento destas ações, analisar a efetividade e agir concretamente nos resultados, sejam eles eficazes ou não. Atualmente a configuração de família é outra, vê-se duas ou até três gerações de idosos convivendo juntas, onde um deles ainda supre financeiramente as demandas básicas de sobrevivência ou do lado afetivo e emocional, no cuidado e educação dos netos. Muitos destes idosos são os considerados “muito velhos”, os octogenários, que requerem uma atenção mais específica. Como resultado, quem atende quem neste novo contexto familiar? Lopes afirma: “a atuação em torno da velhice precisa atender mais que o idoso, precisa atender as famílias, a comunidade, a mídia, as ruas, o trânsito, a economia”. Mas para isso acontecer, as ações devem estar voltadas para o processo de envelhecimento, um movimento educativo que começa na infância, no ensino básico preparando a população para uma velhice que, com certeza, virá.

Pensar a família como única responsável deste cuidar é um equívoco. Nesta nova configuração familiar, todos trabalham e tem suas próprias questões e carências a tratar. Sendo assim, a antropóloga sugere que “a atuação junto à velhice deve ser em rede, incluindo o apoio e orientação aos familiares e a comunidade, disponibilizando profissionais especializados, espaços de socialização e inclusão (…) Esse deve ser um projeto de nação, não um projeto individual ou familiar”.

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Com esse aumento da faixa etária muitas discussões em torno da melhor idade para entrada no mercado de trabalho e aposentadoria são feitas. Mas, na verdade, conforme esclarece Lopes, é muito difícil prever o movimento futuro. Vivemos numa sociedade que não se entende velha. Velho é o outro, eu não sou assim – esta percepção está ligada a idéia geral que somos um país jovem e a velhice não nos pertence, está distante em algum local desconhecido, talvez, até no Outro, jamais em mim.

Lopes complementa: “nunca na história da espécie humana viveu-se tanto, mas a discussão que fazemos em Gerontologia – o campo científico que estuda a velhice e o envelhecimento – é que ainda não sabemos o que fazer com todos esses anos, em termos de qualidade e oportunidades sociais e pessoais de contínuo desenvolvimento pessoal”.

Outro ponto importante: buscar na experiência de outros países a solução para os nossos próprios problemas é um engano. Lopes reforça a importância do investimento em pesquisa, na abertura de novas frentes de trabalho, mais criativas e propositivas. A pesquisadora coloca em discussão perguntas, questões em torno do tema “trabalho voluntário formal” e seus requisitos para uma adequada realização: “Será o trabalho voluntário formal, tal como organizado hoje, uma alternativa de inclusão de idosos brasileiros a ser priorizado pelas políticas públicas, tal como vemos em alguns países? O Terceiro Setor brasileiro está, em geral, preparado para recrutar, selecionar, treinar e supervisionar idosos voluntários?”

Para Lopes, vivemos uma ideia de velhice que é “socialmente construída com pessoas, que, em geral, ainda dividem a velhice em saudáveis-independentes-ativos e doentes-dependentes-inativos. Essas imagens bipolarizadas mascaram a diversidade das experiências de ser idoso e homogeneízam a velhice. Devemos falar, então, de diferentes velhices com particularidades, detalhes sutis que compõem uma imensa diferença neste ser que envelhece.

Quer queira, quer não, a “revolução etária” já começou, obrigando a população e governo a pensar numa mudança de conceitos, pensar em renovação e especialização de profissionais em diferentes áreas e níveis de formação em Gerontologia e Geriatria. Ou seja, se pensarmos mais em temos de “clareza e consciência etária, maiores serão as chances de promoção de bem-estar individual e coletivo em todas as idades. Evitar a velhice exaltando o mito da juventude eterna só nos tira o foco do que deve ser feito para todas as idades, condições e demandas”.

Sobre o “mito da eterna juventude”, Lopes finaliza a entrevista, afirmando ser “um produto de mercado”. Apesar dos diversos tratamentos vendidos pela mídia como promessas de juventude eterna, não há como evitar a velhice ou tratá-la: “Ser velho não é uma doença, mas uma fase do curso de vida, composta por perdas e ganhos, como qualquer outra idade. Basta sabermos como equalizar essa balança.”

Referências
MENDES, Karla Losse. (2011). Ser velho não é uma doença, mas uma fase do curso de vida, diz antropóloga. Disponível Aqui. Acesso em 01/10/2011.a

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