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Ser Psicólogo – II

Diletantismo ou não, o fato é que já havia no Brasil pessoas sérias que se envolviam com o problema da indefinição do status da psicologia no painel das profissões. Enzo Azzi, Arrigo Angelini, Padre Benkö e Madre Cristina entre alguns outros ligados à universidade, começaram a se movimentar no sentido de qualificar a psicologia como disciplina autônoma e inseri-la como opção profissional em diversas áreas de atuação.

Waldir Bíscaro *

 

Essa movimentação não tinha ainda força para vazar para a mídia. Era nas reuniões anuais da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) que aconteciam propostas e debates a respeito da criação e regulamentação da profissão dos psicólogos.

Em 1959, por questões pessoais, interrompi o curso de Especialização em psicologia clínica e para não perder tempo fui ver como andava o mercado de trabalho. Por sugestão de amigos, me candidatei como vendedor de ações em uma corretora de valores. Dizia-se então que aquela era a profissão do futuro.

Quando os diretores da corretora viram meu currículo, me chamaram e, em vez de me aceitarem como vendedor de ações, me propuseram que trabalhasse como psicólogo na empresa. Não conhecia nada de empresa e, muito menos, qual poderia ser o papel de um psicólogo dentro dela.

Até então, apenas lecionara; e de psicologia, só teoria. Eles me garantiram que eu teria assessoria de um escritório de psicologia.

Ao fim de sete ou oito meses, havia aprendido muito sobre ações ordinárias e preferenciais, sobre underwriting e aberturas de capital, mas de psicologia do trabalho, mesmo, saí de lá jejuno. Não havia o que fazer e busquei emprego em escola.

Em 1960, voltei à PUC. Retomei a especialização em clínica e ao mesmo tempo fazia o último ano de filosofia. Lecionava de manhã e à noite, em colégios particulares e estaduais.

No ano seguinte, sem ter mais obrigações com a faculdade, ocupava todo o tempo em lecionar. Em maio leio um anúncio de concurso para bolsa de estudos na FGV, patrocinada por um banco mineiro.

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Participo do processo seletivo e após uma semana sou chamado a Belo Horizonte para uma conversa com o Professor Pierre Weil que me convence a aceitar emprego em sua equipe em vez da bolsa. Começava aí uma nova etapa na minha carreira e na relação com a psicologia.

Mais do que um emprego, minha passagem por BH, foi uma verdadeira academia, onde trabalho e estudo se fundiam. Éramos ao todo cerca de vinte profissionais, psicólogos, sociólogos, médicos, todos sob a gestão de Pierre Weil, de Célio Garcia e de Ruy Flores. Os dois últimos recém vindos da França. Finalmente descobri a verdadeira psicologia do trabalho e por ela me encantei.

Essa passagem por BH teve marcas interessantes. Pela primeira vez, participei de uma greve de bancários e me identifiquei como trabalhador. Outra marca, me tornei uma espécie de caixeiro-viajante da psicologia ao tentar divulgar e vender serviços de psicologia junto á indústria.

De volta a São Paulo, em 62, me inscrevi no Curso de Especialização em Psicologia do Trabalho, da PUC e o conclui em 64, com a defesa pública de um TCC sobre “O problema do mando nas organizações”.

Por esse tempo, a psicologia já gozava do status de disciplina autônoma e de profissão regulamentada. Logo mais, seriam também instalados os Conselhos, o federal e os regionais.

Por falar em conselho… nunca soube por que tramas ou desígnios, fui nomeado conselheiro suplente do CRP-06. Quase ao final do mandato, me tornei efetivo e aí exercia um papel pra lá de burocrático: examinar as pastas dos candidatos a psicólogos, para conferir cursos e diplomas.

Esperava que houvesse alguma missão mais interessante, uma atuação mais política. Quando insinuei algo nesse sentido, a direção me disse que isso era simplesmente impensável. O CRP era órgão governamental e só voltado para questões da categoria.

No exercício de meu trabalho como psicólogo organizacional e com atuação predominante em treinamento e desenvolvimento, me sentia muito à vontade, sem conflitos íntimos frente a minhas preferências políticas. Atendia pessoas que trabalhavam e, junto aos dirigentes, defendia um tratamento humano e democrático para os subordinados, mas uma coisa me incomodava… para muitos a chamada psicologia industrial soava mais como psicologia a serviço do patrão.

Como sair dessa?

* Waldir Bíscaro é filósofo e psicólogo e ex-professor de Psicologia do Trabalho na PUC/SP. E-mail: awbiscaro@uol.com.br

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