As relações entre as gerações, passadas, do presente e futuro, o envelhecimento ativo e a solidariedade entre as gerações foram temas abordados pelo psicólogo José Carlos Ferrigno, autor do livro Coeducação entre gerações e convidado pelo Núcleo de Estudo e Pesquisa do Envelhecimento – Nepe, da PUC-SP em um evento aberto à comunidade que ocorre sempre na última quarta-feira do mês.
Ermelinda Maria Bueno
Ferrigno esclarece que pertencer a uma mesma geração determina os pensamentos e comportamentos do indivíduo e mesmo nos grupos, que apresentam certa similaridade porque suas primeiras e cruciais experiências os colocam em contato com as mesmas coisas. Pertencer a uma geração define apenas uma potencialidade de vivências comuns, isto é, o fato de ser da mesma geração.
O universo simbólico permite ordenar as diferentes fases da biografia, os ritos de passagem nas sociedades primitivas, ser criança, ser adolescente, ser adulto, etc. Nesse sentido, ele pergunta:
Como convivem as gerações na sociedade atual? O que prevalece nessas gerações? Cooperação? Conflito? Distanciamento? Como se relacionam as gerações nos diversos espaços sociais, encontros felizes ou infelizes?
Para se entender a complexidade que envolve o termo intergeracionalidade, o psicólogo – que atuou durante 33 anos no SESC, nos últimos anos como pesquisador da Gerência de Estudos e Programas da Terceira Idade do SESC de São Paulo e coordenador editorial da revista “A Terceira Idade” -, fez uma retrospectiva histórica das gerações como construção sociocultural, citando como era a representação das gerações na idade média, modernidade e pós- modernidade. Falou sobre o distanciamento das gerações na sociedade contemporânea, e dos espaços sociais exclusivos: criança, adolescentes, adultos e idosos.
Ferrigno também lembrou ao público presente que a intergeracionalidade não se dá necessariamente entre os idosos e as outras gerações mais novas. Ela se dá também entre crianças e adolescentes, pais e filhos, embora os programas voltados para esta temática existentes no momento focarem a relação entre avós e netos. Para ele a intergeracionalidade é um meio, estratégia, oportunidade de criação de espaços de encontro, sensibilização e promoção de apoio social.
Nesse sentido, Ferrigno fez uma reflexão sobre as novas configurações etárias na sociedade contemporânea, perguntando como será o futuro? Como serão os novos comportamentos das gerações? Uma nova imagem do idoso? Ele enfatizou a importância da solidariedade entre as gerações e de uma educação entre as gerações como fator de desenvolvimento social, a partir da integração das pessoas idosas com as demais gerações como um direito social. Assim como da importância do Beneficio de Prestação Continuada, alavancando a inclusão social da população pobre. Ferrigno salientou ainda que nas políticas públicas os idosos estão mais privilegiados em termos de políticas de proteção em relação às demais faixas etárias.
A intergeracionalidade como política
A intergeracionalidade está prevista nas recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU) e Organização Mundial da Saúde (OMS), assim como na Política Nacional do Idoso (1994) e no Estatuto do Idoso (2003), no Brasil, contemplando as relação entre as gerações.
As notícias de Programas Intergeracionais remontam a década de 1970 nos Estados Unidos da América, com os trabalhos voluntários recíprocos entre os velhos e crianças. Na Europa e na América Latina os primeiros programas foram a partir dos anos 90 com atividades de cultura, lazer, ações comunitárias entre as gerações. Atualmente os programas mais avançados são desenvolvidos na Inglaterra, Alemanha e Espanha. Normalmente eles objetivam o combate ao preconceito etário, o desenvolvimento de laços afetivos, troca de experiências e coeducação.
Para se obter êxito nas atividades intergeracionais, explicou Ferrigno, é necessário levar em conta os interesses comuns dos envolvidos, o desenvolvimento de atividades prazerosas, respeito às diferenças e atitudes solidárias. É importante capacitar as instituições e os profissionais para conduzir o processo intergeracional.
A professora Beltrina Côrte falou sobre a cultura da intergeracionalidade, e que para ser atingida é necessário uma outra postura, onde no lugar do Eu deve existir o Nós; no lugar do sujeito, a relação, as interações. Ao invés de focar o desigual, dar ênfase às diferenças, às experiências, às biografias. Alguns presentes apresentaram experiências intergeracionais em seus locais de trabalho, como uma assistente social de Minas Gerais que expôs uma experiência na área escolar e uma psicóloga que deu o exemplo de uma oficina de poemas, contos e causos, entre idosos e pessoas mais jovens.
O evento contou com organização das alunas do mestrado em Gerontologia, Ana Paula Loureiro, Denise M. Mazzaferro e Ermelinda Maria Bueno, sob a coordenação da Profa. Dra. Beltrina Côrte. As organizadoras do evento distribuiu material contendo experiências de trabalho intergeracional em países da América Latina e Brasil. Além do mais foi passado um vídeo de uma experiência britânica com imagens de relacionamento intergeracional, na família, no trabalho, nas atividades de lazer socioculturais.
O livro intitulado Coeducação entre gerações (Vozes em 2004), de autoria de José Carlos Ferrigno, mostra como o relacionamento entre as faixas etárias tem se modificado ao longo da história recente da civilização ocidental. Na Idade Média, crianças e adultos se misturavam durante as situações de festa ou de trabalho. Ainda hoje, nas comunidades rurais e nas pequenas cidades, esse encontro é mais frequente nas manifestações da cultura popular. Ao contrário, prevalece nos grandes centros urbanos a separação das gerações em espaços sociais exclusivos.
No livro, Ferrigno assinala que a aproximação das gerações pode incrementar a inclusão social de velhos e jovens, enriquecendo-os mutuamente, desenvolvendo a tolerância e a solidariedade e amenizando, portanto, os efeitos deletérios do preconceito etário. Mais ainda, que os velhos podem ensinar aos jovens a transmissão da memória cultural, histórias da família, valores morais e saberes práticos, podem colaborar com a desalienação cultural e políticas dos jovens. E, em contrapartida, os jovens podem trazer aos idosos o ensino de novas tecnologias, o conhecimento e a manipulação de computadores e produtos eletrônicos, assim como o manejo da internet.