Esta é uma data para a qual precisamos nos voltar com carinho e ao mesmo tempo objetividade. Carinho, porque estamos falando de 18 milhões de pessoas, que representam quase 10% de nossa população acima de 60 anos.
Lucia Vânia *
E objetividade, porque é hora de nos debruçarmos sobre um tema que, muitas e muitas vezes nem chega ao domínio público, porque se esconde dentro de casa, na sombra do ambiente familiar, à base de ameaças que o idoso tem medo de enfrentar.
Apesar de o Estatuto do Idoso estar em vigor desde 2004, por iniciativa do senador Paulo Paim, o Brasil ainda peca por não garantir aos cidadãos em idade mais avançada a proteção a que têm direito.
Os números comprovam o que estamos afirmando: as principais causas de mortalidade entre idosos são a violência e os acidentes, que formam a sexta causa de morte entre idosos.
Se comparados com a mortalidade das pessoas com idade avançada com a população em geral, os números mostram que: a morte por violência e acidentes é de 5,42 por 100 mil idosos, enquanto na população em geral é de 2,69 para 100 mil pessoas.
Mas há outros tipos de violência que não chegam às estatísticas e que também são cruéis e devem ser contidas. São os abusos financeiros praticados por familiares, estelionatários, desconhecidos, empresas, instituições públicas e até o próprio governo.
Esses abusos podem vir associados a maus tratos psicológicos, negligência e maus tratos físicos.
Como se explica que o próprio Estado seja responsável pela violência contra os seus idosos?
Há várias maneiras de praticar essa violência silenciosa: permitindo a desigualdade social, a dificuldade aos serviços de saúde, deixando o idoso ao desamparo e sem o abrigo da previdência social; permitindo que as instituições que deveriam trabalhar pelos seus cuidados pratiquem abusos, maus tratos, mortes e incapacitações.
Neste dia instituído mundialmente para a conscientização da violência contra o idoso, gostaria de fazer uma breve consideração a respeito do nosso país e do Estatuto por nós adotado.
Idealizado com o objetivo de proteger a dignidade das pessoas com idade mais avançada, o Estatuto, além de trazer a definição de “idoso”, contém preceitos e diretrizes fundamentais a serem seguidos pela sociedade em defesa da pessoa idosa.
Essa lei traz dispositivos que regulam direitos à liberdade, à vida, à saúde, à dignidade, e estabelecem medidas específicas de proteção, políticas de atendimento, de acesso à justiça, à habitação, entre outras.
Muitos desses dispositivos já foram regulamentados, mas muitos, de fundamental importância para a vida de expressiva parcela da população, ainda carecem de regulamentação.
Outros, apesar de estarem regulamentados, não foram efetivamente implantados, o que merece do Poder Legislativo a fiscalização adequada.
Na condição de vice-presidente da Subcomissão do Idoso, e com a preocupação de buscar junto ao governo esclarecimentos a respeito do assunto, é que expresso minhas preocupações.
Minha sugestão é que nossa primeira providência seja mobilizar a Subcomissão para buscar soluções junto aos órgãos públicos visando garantir respeito ao Estatuto e o esclarecimento da sociedade quanto aos direitos daqueles que tanto já fizeram pelo nosso país.
Três áreas chamam mais a atenção pelo descaso quanto à aplicação da lei. Trata-se das áreas da saúde, da assistência social e do trabalho, tão importantes para a terceira idade quando de resto para toda a população brasileira.
Segundo estudos realizados pela Consultoria do Senado Federal, tanto na saúde quanto na assistência social, que respondem por 70% dos problemas dos idosos, é preciso que o governo obedeça ao estabelecido no Estatuto.
É o caso dos artigos 48 e 52, que dispõem sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os programas de assistência ao idoso, mantidos por entidades governamentais e não-governamentais.
Apesar da Lei já estar regulamentada, alcançando os serviços de atenção à saúde e os asilos, a mesma tem sido descumprida e é motivo de recorrentes denúncias à imprensa e ao Ministério Público.
Da mesma forma, a própria Constituição determina que compete ao SUS formar recursos na área da saúde, enquanto o Estatuto determina a capacitação e reciclagem de recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia. Sua regulamentação, no entanto, ainda não aconteceu.
Devido a essa falta, a capacitação de recursos humanos nessa área tem sido dividida entre os sistemas de educação e de saúde, geralmente de forma desarticulada. Creio que o tema merece uma ação fiscalizadora de parte do Legislativo Federal.
Pretendo encaminhar, via Subcomissão, requerimento de informação ou de convocação, do Ministro da Educação, para prestar esclarecimentos sobre as providências que têm sido tomadas para dar cumprimento ao Estatuto.
A Lei do Idoso também foi firme ao deixar claro que o cidadão na terceira idade tem direito ao exercício de atividade profissional, respeitadas suas condições físicas, intelectuais e psíquicas.
O idoso deve ter a liberdade de poder exercer todo tipo de atividade profissional, em igualdade de condições com os demais trabalhadores.
Essa igualdade só se verifica se houver atendimento, por parte do empregador, de determinadas condições que respeitem as condições do idoso.
Nesse sentido, esse trabalhador deve contar com a proteção do Estado em relação aos trabalhos penosos, insalubres, em sobrejornada, ou que sejam exercidos em ambientes com alta carga de pressão psicológica, sob pena de serem considerados atos atentatórios aos direitos ao trabalho e à igualdade do idoso.
Muitas vezes, essas diferenças têm sido usadas como forma de discriminá-lo na hora de contratar trabalhadores.
Diz ainda o artigo 28 do Estatuto, que o Poder Público criará e estimulará programas de profissionalização especializada para os idosos, preparação dos trabalhadores para a aposentadoria com antecedência mínima de um ano, e estímulo às empresas privadas para admissão de idosos ao trabalho.
Ocorre que, até o momento, não foram implementadas ações governamentais, programas de qualificação, readaptação e requalificação profissional voltados ao trabalhador idoso.
Milhões de brasileiros contam apenas com uma aposentadoria mínima, numa idade em que ainda podem ser capazes de continuar trabalhando e melhorar a renda familiar.
Ao debruçar-me sobre o Estatuto do Idoso percebi o quanto esta Lei que o Congresso teve a sensibilidade de aprovar é fundamental para garantir à população da terceira idade uma vida digna. Mas isso só será possível se mantivermos nosso papel de fiscalizadores para podermos exigir do governo o cumprimento da Lei.
Nesse sentido, já apresentei à Casa três projetos de lei relativos ao Estatuto do Idoso que, espero, tenham rápida tramitação e a aprovação dos senhores senadores para garantir os direitos dos idosos em nosso país.
Eles tratam da proteção ao trabalho do idoso, das práticas discriminatórias contra os idosos e dos planos e seguros privados de saúde para permitir a despesa de acompanhante quando da internação de idosos.
Creio que esses são assuntos de interesse da nossa população de terceira idade, e que receberão o apreço de nossos parlamentares para uma discussão saudável com um resultado bastante promissor.
Obrigada.
Brasília, 15 de junho de 2007
*Senadora, vice-presidente da Subcomissão do Idoso no Senado