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Primeiro poema à maioridade

Admirável mundo novo, sensacional:
Eu estou aprendendo a ficar velho, no Brasil.
(Não como rejeito ou excluído social
Mas como maravilhoso vinho-verde de barril)
Sei meu endereço inteiro; escrevo poesias
Reconheço parentes, companheiros e crias
Até freqüento as Missas (de Sétimos Dias)
Sei quando a minha netinha da escolinha atrasa E ainda hoje eu me peguei
Cantando “As Flores do Jardim de Nossa Casa”
De Roberto Carlos – o Rei.

 

Nunca fui tão tranqüilo, sábio, sereno, gente
Como ao me sentir velho e muito consciente
Até um Curso de Terceira Idade eu comecei
Escrevi poema de amor aos meus ancestrais
Aos que vieram de muito antes de meus pais
E até posei de cara limpa, cara lavada De amante – dessa minha Pátria Amada
Ser velho é ser atual; ter paz e saúde
Eu tenho bagagem – eu fiz o que pude
Equilibrei a energia de uma juventude
À pureza da primeira infância, os primeiros ais
(Ah! as acontecências que a Saudade nos traz)
E assim, feliz, dei nisto que a vida hoje me faz:
Eu mesmo – e com muitissíma fé!
(Como é bom ser o que a gente é
Nada mais.)
Não tenho medo de:
Vaidade – fascinação
Escuro (ou Solidão)
Comunista, Injeção
Obesidade – pensão
-Ternura – Com uma nova amiga
Eu sou um amante à moda antiga
Mando flores, danço até bolero.
(Ser Velho é ser vero!)
Por quê, Deus do céu, não fui velho já nos meus quinze anos?
Ou com quarenta e tanto, na flor da juventude ainda não extinta?
(Se eu soubesse que velhice era tão bela assim, faria planos
E eu o seria feliz, ainda nos idos dos meus vinte anos, ou trinta…)
Não ter compromisso – ou ter alegria, diversão
Não respeitar sinais de pânico – ou decantação
Vaiar a depressão e não conferir bilhete de regressão
(E ainda chamar os brotos de brotos. Ai meu coração!)
Na outra vida – Vida Eterna muito além dessa ciranda
Quero ouvir Taiguara, Francisco Buarque de Holanda
Ler Sócrates, Neruda, Drummond – e tocar numa banda
Chamar a querida esposa-musa-vítima de “meu talismã”
E fazer sucesso nos rituais da família, toda santa manhã.
Não acreditar em inverdades – estereótipos, ou matutas lendas sem valor
Deus é coisa séria, caridade e orações aos simples – eis o eixo do Amor
Não precisar ser bobo, mentir, votar em político corrupto, falso ou ladrão
E nem precisar deixar de ser eu mesmo para agradar a parente ou patrão.
(Ser velho é realmente o maior barato. E ainda assim a maior “curtição”.)
(Os incautos adolescentes às vezes não me respeitam)

Enquanto ser velho é só pagar candidamente em dia
A existência – como soma de maravilhosa mais valia
E a gostosa prestação de uma pura integridade de Ser)
Ser criança para mim hoje já não é assim tão divertido
Ser adolescente pode ser trivial, ou de verbo rude, sem estudo
Ser jovem é ter muita grife só que com pouco conteúdo
SER VELHO É GANHAR A HONRA DE TER SIDO
Quem nunca chegar a ser um velho como deveria
E morrer muito antes por ter se exaurido
Talvez terá sido medíocre e vai descobrir um dia
Que fingiu um curtume, não terá existido.
Eu era um menino com faniquito que via anjos num jardim caboclo
Eu era um guri que amava Itararé, Pixinguinha e Tonico & Tinoco
Cheguei a ser triste e amargo – Como choro e ranger de dentro
Mas ser velho é o melhor exercício como se um sólido templo
E viver completo é mais verdadeiro – E um grande documento.
O Brasil não respeita os seus velhos
(Mas o Brasil não respeita o Brasil)
As crianças são idiotizadas desde o próprio berço familiar
(Os velhos permanecem íntegros, de vivência e de sonhar)
Os jovens dopam-se e ostentam rótulos em vão
(Mas os lutadores vencedores a terra herdarão)
Afinal, qual é o defeito de ser velho da Terceira Feliz Idade, então?
Dormir de pijama? Escovar os sonhos sábios de uma errança?
Comer espinafre? Torcer pro Timão? Ter céus na esperança?
Ter siricotico ao ouvir Castro Alves ou samba verdadeiro com Jamelão?
Ser velho, na verdade, é ser de novo, criança outra vez.
Com mais competência, lisura, calma e forja de lucidez
Deus dá aos velhos o sentido real de vida e da decência
Moisés, Miguelângelo, Picasso, Ziraldo – tudo que se fez
Aprenderam a ternura do amor dessa linda acontecência
Sem perder o ritmo e um dínamo da mais pura existência.
A hérnia? – E o equilíbrio racional?
A careca? – E a sapiência moral?
A aposentadoria? – E a nova releitura de Platão?
Ser velho é olhar para trás e dizer com emoção:
Vim, vi, Venci e Amei
E quem quiser que tenha competência, tesão
Para um dia chegar nessa terceira infância até onde eu cheguei!

Silas Correa Leite – poesilas@terra.com.br. Membro da UBE-União Brasileira de Escritores.
Trabalho que consta no Livro “O amor é o melhor remédio” (Inédito) – Poema lido na
Universidade de Sorocaba, por ocasião de encerramento de um Curso de Extensão para a Maioridade – Autor de Porta-Lapsos, Poemas.

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