Por que as pessoas com demência mentem? - Portal do Envelhecimento e Longeviver
Ícone do site Portal do Envelhecimento e Longeviver

Por que as pessoas com demência mentem?

No final da década de 80, ao retornar ao país após ter ficado fora por cinco anos, fui morar em uma pensão na região da Bela Vista em São Paulo. Dona Edith era uma senhora, solteira e sem filhos, que comandava a pensão que tinha cerca de 10 quartos.

Paula Spencer Scott/Caring.com Beltrina Côrte


Todos individuais. Todos os moradores eram profissionais liberais, entre eles publicitário, médico, professor…

Tínhamos uma cozinheira e uma arrumadeira. Tudo sob o comando de dona Edith. Após algum tempo, começamos a perceber algumas mentiras e não entendíamos. Começaram a sumir algumas coisas dela e a cada vez ela culpava um de nós, criando até intrigas.

Na mesma ocasião, uma colega de doutorado da USP começou a falar que sua mãe, uma grande intelectual, tinha doença de Alzheimer, e fazia o mesmo. Era na realidade os sintomas de demências. Mas na ocasião pouco se sabia ou se falava a respeito por aqui.

No caso de dona Edith ficou claro e tivemos que chamar a única irmã que tinha e que vivia no sul mas que não se viam há décadas. Enfim, dona Edith foi para o sul acompanhada de nossa arrumadeira, que ao voltar assumiu o comando da pensão. Saí em seguida e não tive mais notícias dela.

Depois foi minha mãe que também desenvolveu a doença de Alzheimer. Deixava o forninho ligado e quando meu pai perguntava ela inventava, dizendo que era uma das filhas que nem mais viviam ali. Ela costumava arrumar uma trouxinha de roupa para ir pra “sua casa” e a escondia. Quando achávamos ela mentia dizendo que não tinha sido ela.

Enfim, quem tem alguém com doença de Alzheimer em casa sabe muito bem o que é isso. Mas não fique surpreso ou decepcionado, ao ouvir alguma mentira de seu ente querido.

Não perca nenhuma notícia!

Receba cada matéria diretamente no seu e-mail assinando a newsletter diária!

Verifique sua caixa de entrada ou a pasta de spam para confirmar sua assinatura.

Em recente artigo publicado pela editora de Caring.com, Paula Spencer Scott, alerta que distorções da verdade são, em parte, um mecanismo de enfrentamento para uma pessoa com demência, um meio de explicar (a si mesma ou a outros) realidades que de outra forma não fazem sentido.

Entre os exemplos Paula cita os seguintes:

Segundo Paula, mentiras ajudam a preservar um senso de dignidade, quando alguém está se sentindo envergonhado, com medo, ou de certa maneira consciente de que fez coisas erradas. Para Paula, o melhor a fazer é ignorar ou encobrir, pois se tentar corrigir o seu ente querido, só vai fazê-lo se sentir mais constrangido, e mais confuso.

E Paula nos lembra para jamais esquecermos que “é a doença falando” e não a pessoa que a gente ama.

Isso é verdade, lembro que na pensão ficávamos muito chateados com dona Edith que além de mentir, ainda culpava um de nós pela ausência de algo. Na minha família quem mais sentia era meu pai, que vivia dizendo que minha mãe o queria deixar louco.

Enfim, hoje entendo que brigar com a doença é pura perda de tempo!

Portal do Envelhecimento

Sair da versão mobile