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Podemos reprogramar a vida. Como fazer isso com sabedoria?

Durante quatro mil milhões de anos, o que vivia e morria na Terra dependia de dois princípios: o da seleção natural e o das mutações aleatórias. Aí vieram os seres humanos e alteraram tudo — cruzaram plantas e animais, alteraram o ambiente e até se fizeram evoluir propositadamente. Juan Enriquez indica cinco recomendações para um futuro onde esta capacidade de programar a vida se desenvolva rapidamente. “Esta é a aventura mais excitante em que os seres humanos participaram,” diz Enriquez. “Este é o melhor superpoder que os seres humanos já tiveram.”

Juan Enriquez * Tradução: Sofia Lucena

 

O ator Dustin Hoffman, anos atrás, fez o filme “A Primeira Noite de um Homem” (The Graduate) onde há duas cenas-chave: A primeira delas é a cena de sedução. Eu não vou falar sobre essa hoje à noite. A segunda cena é quando ele é levado pelo velho para a piscina e, como um jovem estudante da faculdade, o velho basicamente diz uma palavra, apenas uma palavra. E, claro, todos sabem qual é essa palavra. É “plásticos”.

E o único problema com isto é que era um conselho completamente errado.

Deixe-me dizer-lhes porque estava tão errado. A palavra deveria ter sido “silicone”. E deveria ter sido silicone porque as patentes de base para semicondutores já haviam sido feitas, já haviam sido arquivadas, e eles já estavam construindo-as. Então Silicon Valley estava sendo construída em 1967, quando este filme foi lançado. E no ano seguinte que o filme foi lançado, a Intel foi fundada. Se o jovem tivesse escutado a palavra certa, talvez ele teria terminado no palco – oh, eu não sei – talvez com esses dois.

Enquanto você está pensando nisso, vamos ver que conselhos podemos dar de modo que o próximo jovem não se torne um vendedor de Tupperware.

Em 2015, que conselho você daria a um estudante de faculdade perto da piscina? Apenas uma palavra? Acho que a resposta seria código de vida (lifecode). O que é código de vida? Lifecode, ou código de vida, são as várias maneiras que temos de programar a vida. Em vez de programar computadores, estamos programando vírus ou retrovírus ou proteínas ou DNA ou RNA ou plantas ou animais, ou toda uma série de criaturas.

Enquanto você está pensando sobre essa incrível capacidade de fazer a vida fazer o que você quer que ela faça, o que está programada para fazer, o que você acaba fazendo é o que temos feito há milhares de anos, que é criando, mudando, misturando, combinando todos os tipos de formas de vida, e acelerando-as.

E isso não é algo novo. A rúcula foi modificada de tal modo que, se você mudá-la de uma maneira, você fica com um brócolis. E se você alterá-la de uma segunda maneira, você fica com couve. E se você alterá-la de uma terceira forma, você fica com couve-flor. Então, quando você vai a esses mercados naturais, orgânicos, você está realmente indo para um lugar onde as pessoas têm mudado o código de vida de plantas por muito tempo. A diferença hoje, está em escolher um termo completamente politicamente neutro, como “design inteligente”.

Design inteligente

Estamos começando a praticar o design inteligente. Isso significa que, em vez de fazer isso de forma aleatória e ver o que acontece ao longo de gerações, estamos inserindo genes específicos, estamos inserindo proteínas específicas, e estamos mudando o código de vida para fins muito deliberadas. E isso nos permite acelerar a forma como estas coisas acontecem.

Deixe-me dar um exemplo. Alguns de vocês, ocasionalmente, podem pensar em sexo. E nós meio que nem percebemos como mudamos o sexo. Então, nós pensamos que é perfeitamente normal e natural mudá-lo. O que aconteceu com o sexo ao longo do tempo foi – normalmente, sexo é igual a eventualmente, um bebê. Mas no mundo de hoje, o sexo mais a pílula é igual a nenhum bebê.

E, mais uma vez, pensamos que isso é perfeitamente normal e natural, mas não foi assim para a maior parte da história humana. E não é o caso para os animais. O que isso faz é nos dar controle, então o sexo se torna separado da concepção. E enquanto você vai pensando sobre as consequências disso, em seguida, fomos brincando com coisas que são um pouco mais avançadas, como a arte. Não no sentido de pintura e escultura, mas no sentido de tecnologias de reprodução assistida.

O que são tecnologias de reprodução assistida? Tecnologias de reprodução assistida são métodos como a fertilização in vitro. Quando você faz a fertilização in vitro, há boas razões para fazê-lo. Às vezes você apenas não pode conceber. Mas quando você faz isso, o que você está fazendo é separar sexo, concepção, e bebê. Você não tomou o controle apenas de quando se tem um bebê, você separou quando e onde o bebê é fertilizado. Você separou o bebê, do corpo e do ato. E já que você está pensando em outras coisas que temos feito, vamos pensar sobre gêmeos.

Você pode congelar o esperma, você pode congelar óvulos, você pode congelar óvulos fertilizados. E o que isso significa? Bem, isso é uma coisa boa se você é um paciente com câncer. Você está prestes a sofrer quimioterapia ou radiação, então você salva essas coisas. Você não os irradia. Mas se você pode salvá-los e pode congelá-los, e pode ter uma mãe de aluguel, isso significa que você dissociou sexo de tempo. Isso significa que você pode ter gêmeos nascidos – oh, em 50 anos? Em 100 anos? 200 anos? E estas são três mudanças realmente profundas que não são do futuro. São coisas que nós nem agradecemos por ter hoje.

Manipular o código de vida acaba sendo um superpoder. É uma maneira incrivelmente poderosa de mudança de vírus, de plantas, de animais, talvez até mesmo de evoluir nós mesmos. É algo que Steve Gullans e eu estivemos pensando por um tempo.

Vamos ter alguns riscos. Como toda tecnologia poderosa, como a eletricidade, como um automóvel, como computadores, este material potencialmente pode ser mal utilizado. E isso assusta muita gente. E aplicando estas tecnologias, você pode até mesmo transformar seres humanos em quimeras. Se lembra do mito grego, em que você mistura animais? Bem, alguns destes tratamentos realmente acabam mudando o seu tipo de sangue.

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Ou eles podem colocar células masculinas em um corpo do sexo feminino ou vice-versa, o que soa absolutamente horrível até você perceber, que a razão para você estar fazendo isso é para substituir a medula óssea durante tratamentos de câncer. Assim, tomando medula óssea de outra pessoa, você pode estar mudando alguns aspectos fundamentais do mesmo, você também está salvando sua vida. E enquanto você está pensando sobre essas coisas, há algo que aconteceu 20 anos atrás.

Foi Ema Ott. Ela entrou recentemente na faculdade. Ela está estudando contabilidade. Ela jogou dois esportes no colégio. Formou-se como uma oradora oficial na formatura. E isso não é particularmente extraordinário, exceto que ela é o primeiro ser humano que nasceu de três pais. Por quê? Porque ela tinha uma doença mitocondrial mortal que ela poderia ter herdado. Então, quando você troca o DNA de uma terceira pessoa e coloca-o lá dentro, você salva as vidas das pessoas. Mas você também está fazendo a engenharia da linha germinativa, o que significa que seus filhos, se ela tiver filhos, não vão passar por isso. E [suas] crianças estarão salvas, e seus netos estarão salvos, e isso passa adiante.

Isso faz com que algumas pessoas fiquem nervosas. Há 20 anos, as diversas autoridades disseram, por que não vamos estudar isso por um tempo? Há riscos em fazer coisas, e há riscos em não fazer coisas, porque havia uma dúzia de pessoas salvas por esta tecnologia, e então nós estivemos e continuaremos pensando sobre isso para nestes 20 anos. Enquanto pensamos sobre isso, enquanto nós gastamos tempo dizendo: “Ei, talvez devêssemos ter estudos mais longos, talvez devêssemos fazer isso, talvez devêssemos fazer aquilo”, existem consequências para o agir, e há consequências para o não agir. Como curar doenças mortais – que, por sinal, é completamente antinatural. É normal e natural para os seres humanos serem derrubadas por epidemias massivas de pólio, da varíola, de tuberculose. Quando vacinamos as pessoas, estamos colocando coisas não naturais em seu corpo porque pensamos que o benefício supera o risco.

Construímos plantas não naturais, os animais não naturais, que podem alimentar cerca de sete bilhões de pessoas. Podemos fazer coisas como criar novas formas de vida. E criar novas formas de vida, mais uma vez, soa terrivelmente assustador e terrivelmente enfadonho, até você perceber essas formas de vida ao vivo na sua mesa de jantar. Aquelas flores que você tem em sua mesa de jantar – não há muita coisa natural sobre elas, porque as pessoas têm criado as flores para que elas fiquem com esta cor, para ser deste tamanho, para durar uma semana. Você não costuma dar a seu amado flores silvestres, porque essas não duram muito tempo.

O que tudo isto faz é enlouquecer Darwin completamente. Veja-se, por quatro bilhões de anos, os que viviam e morriam neste planeta dependiam de dois princípios: seleção natural e mutação aleatória. Os que viviam e morriam, o que estava estruturado, já foi completamente transformado. E o que temos feito é criar este sistema evolutivo completamente paralelo onde estamos praticando a seleção não natural e mutação não-aleatória.

Então deixe-me explicar essas coisas. Esta é a seleção natural. Esta é a seleção não natural.

O que acontece com estes materiais é que começamos a reproduzir lobos há milhares de anos na Ásia Central para transformá-los em cães. E começamos a transformá-los em cães grandes e em cães pequenos. Mas se você pega um dos chihuahuas que você vê nas bolsas Hermès na Fifth Avenue e deixa-o solto na planície Africana, você pode assistir a seleção natural acontecer.

Poucas coisas na Terra são menos naturais do que um campo de milho. Você nunca, em qualquer cenário, andaria por uma floresta virgem e veria a mesma planta crescendo em fileiras ordenadas, ao mesmo tempo, e nada mais vivendo ali. Quando você faz um milharal, você está selecionando o que vive e o que morre. E você está fazendo isso por meio da seleção não natural. É o mesmo com um campo de trigo, é o mesmo com um campo de arroz. É o mesmo com uma cidade, é o mesmo com um subúrbio. Na verdade, metade da superfície da Terra tem sido estranhamente projetada de modo que o que vive e o que morre é o que queremos, que é a razão pela qual você não tem ursos pardos andando pelo centro de Manhattan.

Bem, isto é mutação aleatória. Este é Antonio Alfonseca. Ele também é conhecido como o Polvo, seu apelido. Ele foi o Arremessador do Ano de 2000. E ele tinha uma mutação aleatória que lhe deu seis dedos em cada mão, o que acaba por ser muito útil se você é um arremessador.

Uma mutação não-aleatória é a cerveja. É vinho. É iogurte. Quantas vezes você já andou pela floresta e encontrou o queijo todo-natural? Ou iogurte natural? Então, nós temos aplicado engenharia nestas coisas. Agora, o interessante é que começamos a conhecer melhor as coisas. Encontramos um dos únicos instrumentos de edição de gene mais poderosos, CRISPR, dentro do iogurte. E quando começamos engenhar células, estamos produzindo oito dos 10 principais produtos farmacêuticos, incluindo o material que você usa para tratar a artrite, que é o medicamento mais vendido, Humira.

Cinco princípios

Esta questão do código de vida é mesmo um superpoder. É realmente uma forma de programarmos as coisas e nada nos vai mudar mais do que este código de vida. Com o código de vida em mente, pensemos em cinco princípios acerca de como devemos orientar-nos, e eu adoraria que me dissessem mais.

O princípio número um: temos de assumir a responsabilidade por este material. A razão pela qual nós temos que assumir a responsabilidade é porque estamos no comando. Estas não são mutações aleatórias. Isto é o que estamos fazendo, o que estamos escolhendo. Não “aconteceu” de forma aleatória. Não veio de um veredicto de outra pessoa. Nós projetamos este material, e é a regra Pottery Barn: quebrou, pagou, agora é seu.

Princípio número dois: temos de reconhecer e celebrar a diversidade neste material. Houve pelo menos 33 versões de hominídeos que andaram na Terra. Quase todos eles foram extintos, exceto nós. Mas o estado normal e natural da Terra é que temos várias versões de seres humanos que andam ao redor dela, ao mesmo tempo, razão pela qual a maioria de nós têm algum Neandertal em nós. Alguns de nós têm algum Denisova em nós. E alguns em Washington tem muito mais disso.

O princípio número três: nós temos que respeitar as escolhas das outras pessoas. Algumas pessoas vão optar por não alterar. Algumas pessoas vão optar por alterar tudo. Algumas pessoas vão optar por alterar as plantas, mas não animais. Algumas pessoas vão optar por se alterar. Algumas pessoas vão escolher evoluir eles mesmos. A diversidade não é uma coisa ruim, porque mesmo que nós pensamos que seres humanos são muito diversos, já estivemos perto da extinção porque todos nós descendemos de uma mãe Africana e a consequência disso é que há mais diversidade genética em 55 chimpanzés africanos do que há em sete bilhões de seres humanos.

O princípio número quatro: devemos tomar cerca de um quarto da Terra e deixar Darwin fazer seu show lá. Não têm que ser contíguos, não tem de ser tudo ligado. Deve ser parte nos oceanos, parte em terra. Mas não devemos tomar todas as decisões evolutivas neste planeta. Queremos ter o nosso sistema evolutivo em execução. Queremos ter o sistema evolutivo de Darwin em execução. E é realmente muito importante ter essas duas coisas funcionando em paralelo sem sobrecarregar a evolução.

A última coisa que eu vou dizer é que esta aventura é a mais emocionante que os seres humanos já fizeram. Este é o melhor superpoder que os humanos já tiveram. Seria um crime não participarem porque estão com medo, porque estão se escondendo disso, este é o quinto princípio. Podem participar na ética, na política. Podem participar no negócio. Podem participar apenas pensando sobre para onde a medicina está indo, para onde a indústria está indo, para onde estamos indo e que rumos queremos dar ao mundo. Seria um crime para todos nós não termos essa consciência e, quando alguém aparece numa piscina e diz uma palavra, apenas uma palavra, não a ouvirmos, e essa palavra ser “código de vida.”

(*)Juan Enriquez pensa e escreve sobre as mudanças profundas da genômica para o mercado, tecnologia e sociedade. Foi diretor fundador do Projeto Life Sciences Harvard Business School, e publicou artigos na área da genética. Foi membro fundador da Celera Genomics Craig Venter – base marinha – coletando dados genéticos de oceanos do mundo. Anteriormente foi CEO da Cidade do México Urban Development Corporation e chefe de gabinete do secretário de Estado de México. É Diretor-Gerente da Excel Ventures Medical, uma empresa de capital de ciências da vida, e presidente e CEO da Biotechonomy, uma empresa de pesquisa e investimento que financia novas empresas genômicas. Em seu Livro TED Homo EVOLUTIS (escrito com Steve Gullens), Enriquez explora os confins da mudança humana, e pergunta: Será que estamos evoluindo? Vídeo Disponível Aqui

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