Nunca se investigou tanto os produtos naturais como acontece hoje, principalmente o potencial deles na terapia contra o câncer. Entretanto os estudos apontam para um cuidado: é necessário também analisar seus efeitos sobre as células saudáveis, pois se o foco se mantiver apenas nas células tumorais, terão o mesmo problema dos efeitos adversos dos tratamentos convencionais, alerta o chefe do Laboratório de Neuroendocrinologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Anderson Manoel Herculano, na Reunião Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Oriximiná (PA).
O especialista aponta que “substâncias com alto teor de vitamina C e antioxidantes estão mostrando alto potencial terapêutico, mas é importante fazer estudos para avaliar potencial risco desses produtos naturais também em células normais”.
A questão é que os tratamentos existentes atualmente afetam as células saudáveis, gerando muitos efeitos colaterais. Muitas pesquisas sobre produtos naturais repetem o problema: focam apenas a ação nas células tumorais quando o ideal, para o pesquisador, é que os produtos naturais em estudo sejam realmente uma alternativa para as drogas já existentes, superando os efeitos adversos observados nos tratamentos atuais.
Câncer: células “desprogramadas”
Herculano explica como se dá o processo de formação de neoplasia: O câncer é o crescimento desordenado e descontrolado de uma linhagem celular particular – em geral uma linhagem que não deveria estar se duplicando. As células são programadas geneticamente para morrer, processo chamado de senescência celular. Uma célula neoplásica é aquela que perdeu sua capacidade de controlar o processo de morte celular e o número de divisões. As células neoplásicas vivem mais tempo do que deveriam viver no tecido e, ao apresentar total descontrole da divisão celular, formam as massas de tecido. O grau de severidade do tumor está associado a esse descontrole e formação. “Dependendo da situação, essa massa celular começa a comprometer a homeostasia (conjunto de processos de autorregularão de um organismo cujo objetivo é manter uma condição de equilíbrio) de um órgão”, explicou.
Metástase – A metástase ocorre quando células do tecido afetado caem na corrente sanguínea e migram para diferentes partes do organismo. Elas começam a duplicar, crescem mais rapidamente do que as células normais do tecido onde se instalaram, passam a integrar partes desse tecido e afetam o estado de homeostasia do órgão para onde migraram.
O processo de formação – No entendimento do câncer, os pesquisadores precisaram investigar quais fatores regulam a perda da senescência pela célula, ou seja, sua capacidade de controlar o ciclo celular.
Morte celular – Um fenômeno celular importante na senescência é a apoptose, a morte celular programada ou morte silenciosa da célula.
Outro processo de morte celular é a necrose. A célula, nesse caso, morre por causa de uma agressão, que provoca vazamento do conteúdo do citoplasma: “No caso das terapias para tratar o câncer, o tipo de morte que o agente terapêutico vai gerar é muito importante. Se administrar algo que gera necrose na região, a pessoa pode morrer. A droga, para ser eficiente, não pode gerar necrose, mas apoptose”, explicou Herculano.
As terapias de controle e tratamento – quimio e radioterapia – se baseiam em fármacos com capacidade de se intercalar no DNA, se aproveitando do fato de uma célula neoplásica ter grande capacidade de multiplicação. “Quando a célula duplica, ela incorpora o fármaco no DNA. Na incorporação, o metabolismo faz a célula começar a se degradar”, descreveu.
Inconveniente nessa terapia – a divisão a taxas elevadas não é um privilégio da célula neoplásica. Várias outras células saudáveis fazem o mesmo: “Por isso os pacientes em tratamento sofrem com queda de cabelo, por exemplo. As células apropriadas à produção de cabelo se multiplicam rapidamente e incorporam o fármaco”, acrescentou. Ao incorporar o fármaco, as células ligadas à produção de cabelo se degradam, e os cabelos caem.
Daí a importância da investigação dos produtos naturais, conforme defende Herculano: “São fortes candidatos para quimio ou outra terapia”. Os pesquisadores buscam novas drogas com alguns pré-requisitos para que sejam mais vantajosos do que os tratamentos existentes: não podem exercer toxicidade em células normais, do contrário, promove dano generalizado; precisam promover a morte celular por apoptose; não podem gerar necrose nem induzir a eventos genotóxicos, ou seja, não pode provocar alterações no DNA, do contrário pode estar gerando mais chances de neoplasia.
Pesquisa com Algas – Há algum tempo já se investiga o potencial anticancerígeno das algas. Agora os pesquisadores da Universidade de Kiel, na Alemanha “descobrem” as plantas nativas do Mar Báltico. A biotecnóloga, Marion Zenthoefer explica o Projeto: “As algas contêm principalmente polifenóis, carotenoides, polissacarídeos, sulfatos, ácidos graxos ômega-3 e antocianinas. Quando essas substâncias estão na solução, vamos para o laboratório”.
Os efeitos dos extratos das algas são analisados em condições esterilizadas. Sobre uma placa especial, a pesquisadora “semeia” uma cultura de células de câncer pancreático. Depois de um dia, borrifa-se sobre elas uma solução nutritiva, enriquecida com um extrato de algas. Setenta e duas horas mais tarde, Zenthoefer verifica se o crescimento celular se deteve.
Os primeiros resultados parciais acusam sucesso, no entanto, não se sabe exatamente que substâncias interrompem o crescimento das células: essa é a próxima meta de pesquisa da equipe.
Para o biólogo marinho Levent Piker, os progressos são resultado de uma pesquisa consequente. Mas é realmente extraordinário o fato de as experiências funcionarem com as algas castanhas do Mar Báltico: “Até agora, nos concentramos em lugares exóticos – próximos a fontes de água quente e em grande profundidade. E, no entanto, nossas plantas nativas do Mar Báltico têm exatamente a mesma potência!”
Referências
HAJASCH, F. (2012). Algas do Mar Báltico podem auxiliar no tratamento do câncer. Disponível Aqui. Acesso em 05/05/2012.
SIMÕES, J. (2012). Produtos naturais devem superar efeitos colaterais nos tratamentos de câncer. Disponível Aqui. Acesso em 05/05/2012.