Quando a questão da preservação da existência passa a ser o binômio saúde-doença, qualquer alternativa, possibilidade, arranjo concreto ou até mágico é considerado, principalmente quando os anos passam e não somos mais aqueles jovenzinhos de bochechas vermelhas com todo ímpeto para ultrapassar limites e virar, da noite para o dia, o super-homem das histórias em quadrinhos ou o destemido e charmoso 007 hollywoodiano.
A ficção pode nos transformar em heróis, aqueles sequer imaginados, mas a realidade da passagem do tempo nos escraviza neste viver mais e cada vez mais. Nada mais é suficiente. Se existe a possibilidade de minutos, horas, dias, por que não? Para isso pagamos um preço.
Sobre o conceito saúde-doença, René Leriche (1936), cirurgião, professor do Collège de France, e autor de diversos livros e artigos, dentre os quais um verbete sobre saúde e doença destinado à Encyclopédie Française é citado pelo médico francês George Canguilhem (1990: 67) em sua obra “O Normal e o Patológico” nas frases: “A saúde é a vida no silêncio dos órgãos” e “a doença é aquilo que perturba os homens no exercício normal de sua vida e em suas ocupações e, sobretudo, aquilo que os faz sofrer”.
Doenças silenciosas que nos fazem sofrer e, ao mesmo tempo, morrer em vida. Um paradoxo, até o momento, sem solução. Infelizmente algumas dessas doenças brigam com os ponteiros do relógio. Falamos das demências e especificamente da Doença de Alzheimer.
O Globo News Saúde de 04 de setembro de 2012 – matéria de Jorge Pontual – destrinchou os meandros da doença, comentou pesquisas recentes e consequentemente acenou, através da ciência e hábitos de vida, algumas possibilidades de se enfrentar um tipo de “mal” que nos leva a um “silêncio” estranho, irônico e irreversível.
- Jorge Pontual: Novas pesquisas trazem alento a milhões de pessoas que sofrem com Alzheimer no mundo todo. Aqui no centro médico da Universidade de Columbia em Nova York os pesquisadores descobriram o mecanismo de progressão da doença e já começam a testar novos remédios.
O Alzheimer é a forma mais comum de demência. É uma doença progressiva que afeta ou destrói neurônios comprometendo a memória e outras funções cerebrais. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, atualmente cerca de 24 milhões de pessoas convivem com a doença em todo mundo. A expectativa é que este número chegue a 80 milhões em 2040, um crescimento que os especialistas atribuem ao envelhecimento da população.
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- Dr. Sergio Schmidt – neurologista e professor da UERG: Antigamente as pessoas morriam mais cedo e não tinham tempo de manifestar a doença. (…) Com o aumento da expectativa de vida, as pessoas estão vivendo mais, consequentemente aparece mais a doença.
- Dra. Karen Duff – pesquisadora da Universidade de Columbia (USA): O maior risco é apenas a idade. Então, eu suspeito que a população esteja mais velha. Outra coisa é que estamos fazendo mais diagnósticos. Antes, apenas considerávamos que a avó estava ficando senil e não separávamos a perda de cognição normal da idade versus um processo real da doença. Parece que aumentou por causa desses dois fatores.
- Jorge Pontual: Nesse laboratório estão sendo estudados os cérebros de camundongos modificados geneticamente para reproduzir exatamente o que acontece no cérebro de uma pessoa que sofre do Mal de Alzheimer e os cientistas descobriram aqui que uma das proteínas responsáveis pela doença, a proteína Tau, vai passando de um neurônio para o outro, ela mata os neurônios, as células do cérebro. E essa proteína vai passando de um neurônio para o neurônio seguinte num processo de contágio. Daí surgiu a grande esperança de criar tratamentos que interrompam esse contágio e impeçam a progressão do Alzheimer. Esses tratamentos já estão sendo testados nos camundongos e de cinco a dez anos serão testados em pessoas, como explica a responsável pela pesquisa, a Dra. Karen Duff.
A médica explica que faz parte da equipe do centro de medicina da Universidade de Columbia que estuda a doença há 20 anos. Ela diz que houve muitos progressos nesse período, mas que ainda existem obstáculos a serem superados:
- Dra. Karen Duff: O maior deles é que os tratamentos ainda não estão curando os pacientes, como deveriam, o efeito deles é muito sutil. Temos que analisar porque os tratamentos curam a doença no camundongo e não em pessoas. Ainda temos uma lacuna no nosso conhecimento.
- Jorge Pontual: Mas ela acredita que a ciência esteja mais perto de descobrir o que leva uma pessoa a desenvolver o Mal de Alzheimer e de, a partir daí, encontrar uma forma eficaz de combater a doença. Uma pesquisa liderada por ela e publicada recentemente mostrou que a chave desse mistério pode estar na proteína Tau.
- Dra. Karen Duff: O papel original da proteína Tau é estabilizar a estrutura da célula e a primeira coisa que acontece no mal de Alzheimer é que essa proteína para de cumprir sua função e sai da célula. Ela livre, pode se agrupar e matar os neurônios. Ela perde as propriedades originais e, sim, ela mata as células.
- Dra. Karen Duff: Nós usamos a engenharia genética para criar um camundongo com os mesmos agrupamentos da proteína como se vê no córtex entorrinal dos humanos. Deixamos o camundongo envelhecer. Quando ele estava com dois anos, o que é muita idade para um camundongo e, na medida em que, o camundongo envelhecia, percebemos que esses agrupamentos se moveram para outras áreas do cérebro. Então, somos capazes de dizer que tudo isso é uma novidade, isso era inteiramente desconhecido. Essa proteína que normalmente está presa dentro da célula foi para fora da célula e daí se moveu para outra célula. Então, isso é o princípio que chamamos infecção.
- Jorge Pontual: O cérebro de quem sofre do Mal de Alzheimer tem placas de proteína betamilóide e agrupamentos de proteína Tau, mas de acordo com a pesquisa é o movimento dos emaranhados de proteína Tau que está ligado ao começo da demência.
- Dra. Karen Duff: Eu diria que em cinco a dez anos, vão existir testes de imunoterapia com Tau. Então, desconfio que as empresas farmacêuticas estão muito interessadas em experimentos que utilizam a imunoterapia. Às vezes, existem alguns problemas com ele, como um efeito colateral. Alguns testes tiveram dificuldade. Então, a primeira vez não será necessariamente um sucesso. Mas tenho certeza que os testes vão, pelo menos, começar a ser feitos em pacientes com Alzheimer em breve.
- Jorge Pontual: No Rio de Janeiro, o neurologista Sergio Schmidt acompanha os estudos da Universidade de Columbia e lembra que recentemente foram publicados outros importantes artigos para a compreensão da Doença de Alzheimer.
- Dr. Sergio Schmidt: (…) Mas eu acho que impacto mesmo para o tratamento são os hábitos de vida. A genética não é determinante. Tem um estudo recente no Canadá, um modelo matemático para prever o que poderia ser, o que pode levar, o que é preditivo de Alzheimer. Então, o estilo de vida parece ser uma coisa importante. É tão importante ou mais que a genética. Em alguns casos a genética é determinante como nos casos de Alzheimer muito precoce, por exemplo, as pessoas que tem Alzheimer com 50 anos de idade. Então, nessas pessoas, existe um determinismo genético um pouquinho maior. Mas aquelas pessoas em que a doença se desenvolve mais no final da vida, o determinismo genético não é fundamental.
Enfrentar a doença com hábitos de vida: atividade física, uma ação intelectual e evitar a privação sensorial ou a depressão. Se você imaginar que existe além da Doença de Alzheimer, uma outra condição, a Doença Vascular que causa a demência, tratar o coração significa prevenir a doença, as condições cardiovasculares, isso é mandatório. Hipertensão arterial, gordura abdominal, tem gente mostrando a relação da Doença de Alzheimer com a adiponectina que é um hormônio liberado pelas células gordurosas (…).
- Dr. Sergio Schmidt: A privação sensorial é um grande problema da terceira idade que causa demência. Enxergar mal, ouvir mal, ficar socialmente isolado. Se o idoso estiver ouvindo mal tem que tratar, se ele estiver enxergando mal tem que tratar, se ele não tiver vida social a gente tem que tentar promover a vida social (…).A própria depressão contribui para a demência porque a pessoa deprimida diminui o tamanho do hipocampo, essa região que é usada para consolidar a memória. Não existe até agora nenhum evidência que exista uma droga protetora, nem vitamina E, nem ginco biloba (…). Na verdade, os exercícios físicos podem também ser exercícios intelectuais, mudando a sequência de exercícios, procurando fazer a pessoa se lembrar da sequência de exercício que ela fez antes. O exercício físico prazeroso combinado com uma atividade intelectual é a única coisa terapeuticamente adequada, além do tratamento farmacológico quando a doença está estabelecida.
Assim conclui-se que manter uma vida saudável que compreenda a prática de atividade física e intelectual regulares, estar de bem com a vida que se leva, tanto socialmente quanto espiritualmente, podem ser fatores determinantes para a prevenção das demências. Pode parecer muito, mas tudo na vida é hábito, como diz o próprio Dr. Sergio “com prazer”.
Mas se você é adepto as famosas dicas, o Dr. Wilson Rondó – Medicina Ortomolecular e Nutrologia – poderá ajudá-lo nesse percurso com as “Sete dicas para fugir do Alzheimer”: disponível Aqui
Como as possibilidades quase nunca se esgotam, sugerimos 3 belos filmes que através de seus personagens e histórias, quem sabe, a arte, poderá clarificar e desmistificar a Doença de Alzheimer.
Longe Dela (2006, Canadá)
Trailer: Disponível Aqui
Poesia (2010, Coréia do Sul)
Trailer: Disponível Aqui
O Filho da Noiva (2001, Argentina)
Trailer: Disponível Aqui
Referências
CAMPANELLA, J.J. (2001). O Filho da Noiva [DVD]. Barueri: Europa Filmes.
CANGUILHEM, G. (1990). O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária,1990.
CHANG-DONG, L. (2010). Poesia [DVD]. São Paulo: Imovision.
POLLEY, S. (Diretor). (2006). Longe Dela [DVD]. Rio de Janeiro: MovieMobz.
VÍDEO (2012). Novas pesquisas trazem novidades do Mal de Alzheimer. Disponível Aqui. Acesso em 25/12/2012.